COMO TUDO COMEÇOU.

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FEVEREIRO DE 2010

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Querido diário,

As aulas começaram têm pouquíssimos dias e eu estou pensando: o que vamos aprender no sétimo ano? Parece assustador começar um ano novo, com gente nova na sala e, o pior, com professores que te odeiam desde o ano passado. No meu caso, a professora Roberta está agarrada em mim como um coala. E não do jeito fofinho, mas de um jeito extremamente sufocante e, acho que, perigoso.

O Fernando e o Thomas ainda estudam comigo e acho que vão continuar até o fim da escola. Eu odeio minha vida. 

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Suspiro.

— Vamos, Verônica! Estou atrasado para a aula!

Ignorei o chamado do meu pai vindo da cozinha, coçando os olhos mais uma vez e suspirando ao guardar o diário na gaveta junto com o estilete e uma caixa de band-aid. Peguei minha mochila sem pressa e desci as escadas bocejando, sem me preocupar em tomar café da manhã.

Apressei-me para pedir a bênção ao meu pai, e então percorremos o trajeto até a escola em silêncio, com exceção dos resmungos ocasionais dele sobre o horário e minha falta de responsabilidade. Sou filha única, e nossa relação não tem sido das melhores desde o ano passado. Sinto uma certa raiva por ele me cobrar tanto na escola.

Há um ano, descobri que tenho TDAH e, desde então, tenho lidado com uma série de problemas, algo que para alguém da minha idade tem sido difícil. Entre esses "problemas", a automutilação se tornou presente. Comecei a me cortar desde o dia em que descobri essa merda, o que resultou em uma baixa autoestima que, por algum motivo, foi compensada nas minhas notas escolares. Mas ninguém sabe disso.

Na escola, costumo sentar na quarta cadeira da primeira fileira, ao lado da porta, como sempre. A primeira aula passa despercebida, já que frequentemente me distraio e fico perdida em pensamentos. Focar no que o professor está falando se torna um desafio. Afinal, é segunda-feira e quase oito da manhã.

Quem está realmente disposto a essa hora?

A psicóloga da escola entra na sala após o sinal, anunciando que a professora não pôde comparecer e que teremos um exercício para fazer. A turma parece interessada, mas eu troco um olhar com minha amiga, Lara, e reviro os olhos disfarçadamente.

O exercício é simples: ligar os números que estão embaralhados e têm diferentes tamanhos e formas. Quem terminar primeiro será liberado para o recreio mais cedo. São sessenta números no total.

Lara e eu começamos o trabalho com rapidez, afinal, quem não quer um recreio mais longo? Terminamos juntas e entregamos nossos materiais. Fui a terceira a entregar, seguida pela Lara.

Entediadas e talvez porque ainda era cedo demais para o recreio, decidimos ajudar os colegas que estavam sentados atrás de nós.

Com onze anos, no dia oito de fevereiro de 2010, pouco depois das oito da manhã em uma segunda-feira, me virei para trás e dei de cara com alguém que mudaria minha vida.

Ele é loiro, mas está com a cabeça baixa, olhando para o papel e repetindo "cinquenta e oito". Inicialmente, achei que ele fosse cego ou algo do tipo, já que o número estava bem no topo da folha.

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