3. Quando tudo vai bem, desconfie! (parte 2)

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— Pelo jeito já arrumou toda a bagunça do tufão. Só a janela que continua aberta. — abro os olhos lentamente e temerosa, nada do infeliz, e meu pai está fechando a janela — Prontinho pode deitar. — deito sem entender ao certo ou saber o que devo fazer. Abre a gavetinha do criado-mudo, retira um dos cadeados que usamos para trancar toda a casa quando viajamos — Dessa maneira nenhum vento idiota vai abrir mais essa janela e assustar você, meu bem. — senta na beirada da cama paternalmente — Durma com os anjos.

Age com tamanha gentileza, que me dá uma dorzinha no coração. Ao sair, apaga a luz e fecha a porta do meu quarto. Sento na cama culposa. Afinal, o ladrão tinha ido embora! Melhor assim. Não queria mesmo mais nada com ele. Para o resto de minha vida eu iria ser forte, decidida. Ele que se casasse e fosse muito feliz. Seguro firme o lençol sobre o peito. Fecho os olhos. Agora dormiria. E ao sentimento de culpa mescla-se o arrependimento. Caramba, eu queria que ele estivesse aqui? Sem essa, aquele cretino, não! Ai, preciso parar de pensar nisso. Relaxamento. Relaxamento. Relaxamento urgente! Ele está namorando a Betina credo-credo e na calada da noite vem me visitar?! Nem ferrando! Mais uma vez algo interrompe meus devaneios já insuportáveis. Um sussurro atrás de mim.

— Ele não volta, né?

Depois de gelar até a alma, olho embaixo da cama.

— Você não foi embora? — mantenho o sussurro.

Responde negativamente e sai debaixo da cama. Põe-se ao meu lado. De súbito me ponho em pé entre a parede e a cama, enérgica acendo o abajur.

— Vai embora! — sibilo.

— Você não quer que eu vá. — fala com voz macia e inocente.

— Seu imbecil!

— Idiota, foi o que você disse antes para o seu pai. — corrigi-me.

— Que seja!

Levanta-se e começa a dar a volta na cama, vindo na minha direção, com cautela. Olho para o meu pijama e desejo urgente a camisola.

— Você, sempre linda. — como se lesse meus pensamentos, usa aquele sorriso ingênuo na face que me derrete toda.

— Mentiroso, eu estou horrível. — reviro os olhos.

— Mais linda que nunca. Dá vontade de abraçar e não largar mais.

Dá mais um passo e sem querer dou outro para trás, bato no criado-mudo, o abajur balança e quase cai. Apressa-se para segurá-lo, tromba em mim, rimos um pouco e fazemos gesto de silêncio um para o outro.

— Então por que está com ela? — digo encabulada.

Retira a mão que fora parar na minha cintura e retrocede um passo. O momento de descontração acenou um adeus. Lipe fica com aquela expressão preocupada ao mesmo tempo em que resignada. A coisa era séria mesmo.

— Vim falar sobre isso. — engole seco — Sinto muito.

— Sente? — aperto os olhos, tento enxergar o que vem por trás daquelas palavras.

Suspira tão pesado que quase posso tocar seu pesar.

— No começo era só para te fazer sofrer, confesso. Nosso relacionamento parecia um ioiô. Você pedia um tempo, vivia suas aventuras enquanto eu esperava o seu regresso. Então...

— Decidiu me fazer provar do próprio veneno. — adianto-me.

— Isso. — adquirira um semblante sério, comovente.

— Agora está arrependido e quer...

— Ela está grávida. — adianta-se e eu esqueço como se respira.

Destino Íntimo - Uma Jornada ao Pulsar de Um Estranho - Livro 1 - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora