II - Drão

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Drão, os meninos são todos sãos, os pecados são todos meus.


Deus sabe a minha confissão; não há o que perdoar, por isso mesmo é que há de haver mais compaixão; quem poderá fazer aquele amor morrer, se o amor é como um grão? Morre e nasce trigo — vive e morre pão.


— Drão, composição de Gilberto Gil.


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Era óbvio que isso não daria certo. Óbvio. Com os olhos de maturidade, as rugas da idade, um intensivo movimento de compreensão e a cabeça e o corpo dotados de experiência... Eu posso concluir sem remorsos, dores, ou lamentações.

Não daria certo.


Não tinha como dar certo. Não tinha. E não deu, realmente — ou melhor, até que deu, até certo ponto. Fomos muito felizes, só durante o prelúdio.


Mas a gente não pode, nem deve achar que da noite pro dia, o amor vai sanar tudo. Vai sanar as diferenças, as intrigas, as distâncias.


Não se quebra o muro de Berlim: a barreira é ideológica, não física.


Você consegue desconstruir casas, muros, quartos, suítes, cômodas – mas nunca vai conseguir desconstruir o conceito de lar. Você pode mudar o porte do homem, aparar as arestas da ruindade, romper com a indiferença inorgânica, mas nunca vai conseguir mudar o seu cérebro. Suas vivências. Seu estilo, sua forma de agir, seu jeito de lidar com a vida. Então... acho que era melhor sair disso, antes do litígio.


Antes da falta do amor. Antes que o amor acabasse de vez.





Porque a partir do momento que se acaba o amor, se acaba o respeito, a paz, o zelo, — e as boas memórias se dissipam, como poeira no universo.




Não queria alcançar isso. Jamais gostaria de alcançar isso.


A única coisa que eu busco alcançar, no dado momento, era uma taça de cabernet sauvignon superfaturada nas minhas mãos, e bem, eu caminhava para isso.


Era a quinta do vinho, compromisso religioso de 15 em 15 que eu tinha inventado junto à Cissa: já que semanalmente, pareceria alcoolismo, e de 2 em duas semanas... pareceria que éramos apenas mães. Ah, a maternidade.


Ela é realmente esclarecedora.


Ela te trás a maior manifestação do amor humano e inumano que alguém pode experimentar ter na vida. Por sorte, destino, desejo, e exploração desse amor... Tive 2. E eles foram, além da dádiva maior da minha vida, o maior encontro de almas que eu tive. Um pedaço de meu sentimento, materializado, pronto pro mundo. E não contente de materializar o meu sentimentalismo, nesse estado de poesia almática... decidi ter dois. Bem, o destino decidiu por mim que eu teria dois.


O destino renova, transforma, desfruta — e dá os frutos. E o primeiro fruto dessas conquistas, brincava com os lápis de cor dispostos de qualquer forma sob a minha cama, desenhando os monstros que somente ele poderia ser capaz de me defender.


— Mainha, posso visitar  Romeu quando você for sair? - João questionou, distraído em meio a bagunça que havia criado no meio do ambiente


— Ô, meu leão, esqueceu que seu pai vem ficar com você e com a Babi? Cê vai mesmo deixar aquele par de terroristas acabarem com a minha casa? – disse, passando a mão pelos cabelos lisos, enquanto eu me juntava com o garoto, me jogando na cama, vendo as cores e nomes que ele havia escolhido.


DrãoOnde histórias criam vida. Descubra agora