XXI - Azul

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Corre e vá dizer pro meu benzinho, um dizer assim: que o amor é azulzinho.

— Azul, de Gal Costa.

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Fique de boa, véi. — disse meu marido, sussurrando para que os guardas que faziam nossa escolta até a gerência do hotel.


De boa. Ele acha que tudo na vida consiste na arte do deboísmo. Não é bem por aí, preto.


Ser pego invadindo um hotel de madrugada é de longe, uma das piores infrações que cometi em todos os meus anos de vida, de longe. Acho que o que pegava naquilo tudo, é que os próprios seguranças não faziam ideia do nível de falcatrua da união Bahia de Janeiro.


Jogados em duas cadeiras em frente a um birô do quartinho da segurança. Como dois criminosos, o que não deixamos de ser (mas não nesse contexto). Invasão de domicílio próprio configura crime? Creio que não.


— A gente pode fazer isso do jeito difícil, ou do jeito fácil. – o segurança do mal falava. — Isso tudo vai depender de vocês dois.


— É nada... – caçoou.


— É como, rapaz?


— Alê!


— O quê, tu tá afoita por conta de quê, Giovanna? — disse, gargalhando, com a voz mais fina. — Patrão, ocorreu uma situação levemente engraçada aqui.


— Vocês invadiram o perímetro da Casa Sollaris sem serem hóspedes do complexo. Sem quarto, sem chave, sem pulseira. A situação engraçada no caso vai ser na delegacia regional se vocês não se esclarecerem pra equipe de segurança.


— Brother, tu sabe que a Sollaris está em fase de substituição de donos, não sabe? – disse, boçal.


— Ninguém fora da produção sabe.


Os donos sabem. – entreolhamos, e nessa troca, o poder estava claro. O poder era orgásmico.


Pálidos, os seguranças se entreolharam também. Alexandre apenas tirou o telefone do bolso, sem muito papo, apenas mostrando a papelada que me fazia dona e proprietária da Sollaris, com todas as homenagens de estilo.


— Olhe, tu tá vendo essa galega aqui? Ela é a patroa direta de vocês todos. Eu teria mais respeito pela pessoa delas, e não faria uma amolação dessas uma hora dessas. Gravar o rosto dela, é o mínimo pra não passar por um prego desses. O meu não, porque eu só tomo título pelo casamento, mas ela sim. Nego, faça o seguinte pra não me estressar mais uma hora dessas, passe a chave do 503 e siga a noite. – Alexandre tomou partido, como sempre. – Bora, Preta. E bom trabalho pra vocês.


Assim, na lata, ele encarnou a persona de Narciso Nero Gouveia, e seguiu petulante até a saída do local com o cartão-chave, e até a fuga do olhar de medo dos guardas, do pavor à autoridade. Corremos pelo complexo até nosso recôncavo, rindo, achando nossa vida a coisa mais engraçada do mundo. Foi cômico, pra cacete.


— Tu é o cara mais LOUCO que eu conheço! – disse, abrindo a porteira da área externa, que conhecíamos muito bem. Alexandre se encaixava por trás de mim, mãos no ventre, risos no ar, beijos no pescoço. –Você quase fez o guarda se borrar, meu amor.


— Antes ele que tu, né, satanás. — disse, me acompanhando pelo espaço. Acho que nos anestesiamos de imediato.


Nada havia mudado, muito menos a luz da lua. Nós dois mudamos um bocado, mas o nosso cenário de amor... ele persiste sendo o lugar onde o nosso tempo é pausado, sobretudo pelas melhores memórias.


DrãoOnde histórias criam vida. Descubra agora