Capítulo 3

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Indicação de música: Clair de Lune - Claude Debussy

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   Na manhã seguinte, Aziraphale acordou decidido que aquilo foi só um engano de sua cabeça. A voz de sua irmã ecoou tanto em sua mente enquanto se arrumava para a escola que ele havia pegado uma gravata borboleta em homenagem ao laço que ela havia dito na noite anterior. Ele sabia que ela estava mentindo mas ele agora achava aquilo simbólico.

   Mesmo com um pensamento mais positivo sobre o acontecido do dia passado, Aziraphale decidiu que uma mudança em sua rotina não faria mal. Mesmo que ela significasse ter que sair mais cedo que o normal e encarar uma possível fila. Mas ele estava preparado pra isso, dessa vez.

   Assim que escutou o sino bater acima da porta, sentiu também o corpo se arrepiar com a ansiedade. Ele não saberia explicar a ansiedade do que mas ela estava ali e ele sabia reconhecer os sinais dela. Talvez fosse só seu corpo reagindo a um novo mecanismo de defesa.

   Um xingamento foi a primeira coisa que Aziraphale notou quando entrou na fila. Tinha cinco pessoas na fila e ninguém parecia estar tomando conta do caixa. Ou quem estava, tinha acabado de sair. Talvez era disso que o xingamento se tratava. Aziraphale não conseguia prestar muita atenção nisso porque seus olhos estavam correndo pelo lugar, procurando por um ponto preto em meio a multidão. Não que preto fosse uma cor exclusiva daquele rapaz mas ainda assim, era o que Aziraphale tinha de referência.

   O problema era que, o ponto que estava procurando, estava escondido atrás do balcão e era o motivo do xingamento que havia escutado. Crowley estava tentando ajudar Nina, naquela manhã já que algo estava dando errado com a máquina de café. Ela estava ocupada resolvendo isso e Crowley era a única pessoa por perto pra ajudá-la, visto que ele havia dado carona pra ela.

   Em uma discussão silenciosa, envolvendo alguns gestos um para o outro, Nina apontava para que Crowley voltasse e com as mãos, Crowley tentava sinalizar que ele não podia. Que tinha alguém ali em cima que ele não poderia encarar agora. Ele não estava preparado pra lidar com as consequências de seus atos ainda mais quando não sabia qual parte dos seus atos estava errada. Só que Crowley estava perdendo a batalha e com um suspiro, subiu novamente em direção a bancada e colocou o melhor sorriso falso que tinha, anotando os pedidos.

   Quando a fila começou a andar, duas reações aconteciam. Aziraphale se sentia aliviado de que finalmente estar andando com a fila e Crowley se sentia ansioso por logo ter que lidar com o garoto que acidentalmente magoou. Magoou? Ele não fazia a menor ideia e sinceramente, ele não conseguia saber em que ponto fez isso. Era um elogio! Dependendo do contexto, Crowley poderia dizer que era até um flerte, mas o garoto havia tomado como algo ruim. Completamente injusto.

   Na vez de Aziraphale na fila, ele percebeu que sua estratégia tinha dado errado. Terrivelmente errado. Porque além de ter que lidar com aquele garoto, teria que falar com ele novamente sem nem saber como o fazer ao certo.

— Uh... Nina está bem? - foi a primeira coisa que veio em sua mente que não envolvia algo ruim sobre o rapaz.

— Ela está. Quem não está é a máquina que ela está arrumando. O que vai querer? - as mãos de Crowley estava sob o teclado mas em momento algum ele havia descido os olhos até a tela do computador. Ele parecia ocupado demais prestando atenção em Aziraphale.

— Eu ia querer um latte de baunilha mas a máquina está ruim... - disse baixo, não encarando Crowley e sim o cartaz acima da cabeça dele.

— Qual é seu nome? Desculpa... Atrapalhar sua linha de raciocínio. - disse balançando a cabeça como se afastando um pensamento que tinha. — Eu sou Crowley, por sinal.

— Muito prazer. Eu sou... Aziraphale. - disse o loiro com receio do que iria vir a seguir. Conhecia bem o potencial que as pessoas tinham para falar de coisas sobre ele.

   Crowley não sabia como escrevia aquele nome mas sabia de onde havia saído. Porque da mesma forma que ele tinha um nome bíblico, Crowley também tinha um histórico com nomes bíblicos. Seu nome era pra ter sido Raphael, se dependesse de sua família.

— Ok, anjo. Se você me esperar na cantina da Trinity, eu levo pra você o seu latte. E você não vai precisar pagar. Eu pago pra você por ter feito algo ontem que te fez... Sair correndo.

   O ar morreu na garganta de Aziraphale. De todos os tipos de coisas que ele havia sido chamado por conta do seu nome, o mais óbvio deles nem mesmo havia passado perto das coisas que ele havia sido chamado. O som dos seus batimentos parecia estar alto em seus ouvidos e com isso, concordou com a cabeça e se afastou do balcão, acenando de leve com a mão, ainda sem dizer uma palavra.

— Que porra de nome é Aziraphale? - Crowley disse a Nina assim que ela se levantou, aproveitando que o loiro estava longe demais pra ouvir e as pessoas que queriam café haviam desistido ou se sentado pra esperar.

— Que porra de nome é Crowley?! - ela disse de volta, com um olhar de indignação.

— Em minha defesa, meu nome é Anthony. Crowley é meu sobrenome. As pessoas que passaram a me chamar por ele e ficou. - disse enquanto se desfazia do avental que relutantemente aceitou usar mais cedo e ficou olhando para Nina. — Latte de baunilha.

   Enquanto caminhava em direção a cantina, Aziraphale percebeu como todos pareciam tão rápidos e agitados na escola. Ou ele estava devagar? Ele já não sabia mais dizer. Ainda se sentia afetado por ter sido chamado de anjo. Para alguém tão falante, até ele estava estranhando tamanho silêncio. Talvez Maggie estivesse certa, no final.

   Quando se sentou na cantina, ficou em um lugar que pudesse ser visto facilmente. O problema desse lugar é que, com poucos minutos depois, o sol estava batendo diretamente em Aziraphale, o fazendo se arrepender um pouco de estar de casaco, mas conhecendo Cambridge, aquele sol não duraria muito então estava tudo bem. Ele poderia suportar.

   Usar óculos escuros em locais fechados sempre pareceu falta de educação mas ver Crowley usando fazia Aziraphale pensar que combinava com ele. E Crowley não poderia agradecer mais por usar os óculos naquele momento porque por alguns segundos, ele parecia um pouco surpreso demais em como o rapaz com nome de anjo parecia ao ficar no sol. Talvez Aziraphale fosse realmente o nome certo para ele. 

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A partir desse capítulo, teremos visões de Crowley narradas também. A história não seguirá somente do ponto de vista de Aziraphale. Com isso, teremos algumas músicas bebop nas indicações também.

• Crowley realmente é um sobrenome. Ele é de origem irlandesa e escocesa. Ele tem significado de "duro" ou "corajoso" e a intenção é que isso reflita um pouco na personalidade de Crowley.

• Arte da capa: @den_0618 no twitter

Young Omens - AU AziracrowOnde histórias criam vida. Descubra agora