A concha azul

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O pai de Satoru bateu na porta até que se cansasse de gritar e finalmente descesse as escadas, mas o problema é que ele ainda estava em casa e Satoru precisava levar Suguru de volta ao mar. Portanto, quando o silêncio retornou, Satoru ajudou o moreno a se limpar e vestir as roupas. De forma receosa, ele abriu a porta vagarosamente.

— Não se preocupe, eu acho que ele está dormindo — Satoru comentou, olhando para o rosto do outro. — Ele sempre faz isso.

Suguru engoliu em seco e concordou ao fazer um sinal positivo com a cabeça, sua mão tocando a de Satoru, o mantendo por perto.

— Então, é melhor nos apressarmos.

Assim, eles desceram a escada para o andar inferior, seus pés deslizando em movimentos suaves para que não causasse nenhum barulho. Até que, ao finalizar a escadaria e passar pela cozinha, ambos se encontraram com aquele homem, por isso, ficaram petrificados no mesmo local.

Satoshi estava com o corpo debruçado na mesa, porém, ao percebê-los, ergueu o rosto. Seus olhos castanhos se virando em direção aos dois rapazes. Ele tinha uma barba rala no rosto e cabelos brancos como os de seu filho, era também um homem igualmente alto e muito mais forte. Em sua mão, uma lata de cerveja.

— Quem diabos é esse menino? — perguntou, sua voz demonstrando a embriaguez. — Você tem amigos? Uma pessoa detestável como você conseguiu companhia? Isso é engraçado, pois ninguém nunca se interessou em ficar perto de você.

Satoru havia prendido a respiração por um instante, sua mão continuava conectada com a de Suguru, tentando mantê-lo atrás de seu corpo, como se pudesse protegê-lo. Por sua vez, o moreno olhou diretamente para aquele homem, por mais que tivesse medo dos humanos, acabou sentindo raiva do pai de Satoru por falar com o filho de forma tão rude.

— Você está bêbado, como sempre. E isso não é da sua conta — respondeu, se sentindo tenso.

— Não é da minha conta, mas aparentemente você está usando a minha casa para ser promíscuo. Sua mãe teria vergonha de você se estivesse viva.

A verdade é que a mãe de Satoru sabia sobre a sexualidade do filho e o apoiava, ela sempre foi muito gentil. Se uma doença terrível não tivesse a levado para longe, tudo seria infinitamente melhor.

— Ou talvez ela iria te apoiar — Satoshi voltou a dizer. — Ela me causava enjoo também. E olhar para o seu rosto me faz lembrar dela, os seus olhos são iguais. Tão feios e repugnantes...

Suguru não sabia nada sobre essa família ou a mãe de Satoru, mas ele percebeu de imediato que esse assunto fazia com que Satoru ficasse ainda mais triste e enraivecido. Ele segurava em sua mão com força e rangia os dentes. Mas de uma coisa Suguru tinha certeza, que esse homem que se dizia ser um pai, era apenas um ser humano muito ruim. Suguru não queria que Satoru vivesse em uma realidade tão cruel, ele não merecia ter que passar por uma situação ruim como essa.

— Os olhos do seu filho são os mais bonitos que eu já vi — ele disse, de repente, atraindo todos os olhares. — Você tem um filho maravilhoso, mas não enxerga isso. É uma pena, humanos como você são miseráveis.

Embasbacado diante daquela atitude, Satoru deixou que Suguru andasse em passos rápidos até a porta, o arrastando consigo. Satoshi sentiu o sangue borbulhar de ódio e se levantou da cadeira com fúria em suas ações, atirando na direção deles aquela lata de cerveja que já estava pela metade, porém, o material bateu na parede e caiu no chão, derramando o líquido. Em seguida, a porta se fechou.

Do lado de fora, Suguru continuou andando em passos fervorosos até a praia. Satoru estava em completo silêncio e com os olhos bem abertos em direção ao moreno. Foi a primeira vez que viu Suguru erguer a cabeça e dizer algo do tipo para alguém, e o melhor de tudo é que ele agiu com coragem apenas para defendê-lo de seu pai, alguém que nem mesmo o albino tinha forças para lutar contra. Satoru acabou desenvolvendo medo daquele homem, ele o repudiava e às vezes o respondia a altura, mas, na maior parte das vezes, preferia se trancar no quarto até que o pai acabasse adormecendo em algum canto da casa e o deixasse em paz.

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