Prólogo

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O carvão em meus dedos estava sujando todo meu vestido, mas meu desenho compensava toda a irritação pela sujeira. Eu já podia ver a evolução dos meus desenhos a cada dia, ficando cada vez mais realistas e contornados. Meu desenho do momento representava uma floresta a noite vista de baixo, não sei ao certo o que ele significava, era tudo fruto da minha imaginação de como seria a vida fora dos muros do reino, na qual erámos proibidos até de chegar perto.

—Ei, Clarke! 

Ouvi uma voz me chamar de algum lugar. Isso me apavorou, levando em conta que eu estava sozinha em meu quarto.

—Aqui na janela.

Virei a tempo de ver Wells pendurado no parapeito todo torto a ponto de escorregar.

—Wells, tá maluco? — Falei rindo e indo até ele o ajudar — O quê você está fazendo aqui?

—É sério que você esqueceu? Hoje é lua cheia, dia em que vamos até a clareira perto do lago sempre pra ver a lua.

Meu Deus, eu tinha esquecido! Wells e eu somos amigos desde sempre, e fazíamos isso desde criança: Sair a noite as escondidas dos nossos pais apenas para admirar a lua, já que era proibido sair de casa depois que escurecesse. Por quê? Também não sei. Temos 17 anos e nunca fomos pegos, caso isso acontecesse, seríamos presos em celas sujas e sombrias até os 18 anos.

—Desculpa ter esquecido, Wells, acabei perdendo a noção enquanto desenhava. Mas vamos ainda? 

—Claro que sim — Ele pulou de volta para o chão. Aquilo era muito alto e ele saltava com facilidade e sem barulho — E adivinha só: Vamos de cavalo.

—Cavalo? Mas e se...

—Relaxa, Raven quebrou meu galho.

—Wells, e se ela for presa por isso? 

—Tá tudo bem, Clarke, nada vai acontecer. Mas caso você fique aí parada esperando pode ser que aconteça. 

Imediatamente passei pela janela e Wells me ajudou. Montamos em nossos cavalos e cavalgamos rumo ao lago. Quando ficamos longe o bastante das casas do reino, disparamos a toda velocidade competindo quem chegava primeiro. Ele, gentil como sempre, me deixou ganhar, o seu café da manhã era meu. Descemos dos nossos animais e sentamos sobre as pedras do lago para admirar a lua. Sem dúvidas aquele momento e lugar era o que eu mais amava em toda Arkadia. Ficávamos lá até o amanhecer conversando sobre tudo, Wells era meu melhor amigo e eu o amava demais. 

—Ouvi dizer que seu pai quer que você case com o filho do ditador Kane... É verdade? — Ele perguntou após um breve silêncio.

Como sempre, as histórias corriam rápido. 

—Meu pai tá viajando demais. Ele sabe muito bem que não irei me casar nunca enquanto estiver presa nesse reino. — Falei olhando para Wells — Eu quero poder sair daqui, conhecer lugares novos, pessoas novas... A chance aqui de arrumar alguém que não seja seu parente é mínima, Kane é meu tio de 3º, logo... 

—Mas nem todos são familiares, olha eu, não sou nem de longe seu primo. — Ele disse virando-se para mim.

—Para né, Wells, você é meu melhor amigo, sem chances. — Falei rindo.

Nesse momento pude ver o semblante dele se desfazendo e a decepção tomar conta de seu rosto. Não era surpresa para ninguém que Wells era totalmente afim de mim e daria o que fosse preciso para casar comigo. Rolou vários boatos de que ele já havia me desonrado e que erámos namorados e não assumíamos, típico das fofocas que corriam no reino. Mas além de eu ver ele como irmão, meus planos de agora não incluía um casamento.

Nossa atenção foi roubada por movimentos vindo do lado sul do lago, acompanhado de vozes. Wells correu rapidamente para esconder nossos cavalos atrás das árvores no escuro. A passos lentos caminhei até próximo de onde vinha o barulho e me escondi atrás de um arbusto denso. Espiei por uma brecha e vi que se tratavam dos cavalheiros do reino, o ditador Kane, o rei Thelonius e... Meu pai. Mas o que eles faziam aqui essa hora e tão longe do reino? Claro que se vissem eu e Wells perguntariam a mesma coisa. Wells logo estava ao meu lado, então foquei no que eles estavam falando. 

—Alteza, nossas condições de vida estão cada vez mais precárias, nossas fazendas não estão mais tão produtivas, nossos solos há décadas não está mais fértil para um bom plantio, nosso rio está secando, os animais pararam de produzir nossos nutrientes... A maldição está tomando forma, está virando realidade.

Maldição? Do que meu pai estava falando?

—Jake, pelo amor de Deus, não vamos acreditar mais nessa história de maldição depois de um século. Aquela bruxa morreu logo após "amaldiçoar" nosso reino, impossível que essa maldição seja mesmo verdadeira.

—O que você acha que justifica todas essas dificuldades que estamos enfrentando? Nossa colônia era a mais bem sucedida, senhor. Hoje não temos mais nada. 

—E o que você acha que pode resolver nosso problema, chanceler Jake? 

—A retomada da nossa coalizão com as treze colônias... 

—Não, nem ouse terminar essa frase! — O rei Thelonius gritou tão alto que estremeci — Que nosso reino definhe e todos morram, mas nunca e jamais irei deixar que cometemos o erro dos nossos ancestrais. Meu bisavô fez a escolher certa em separar nossos skaikru do resto daqueles clãs dessas colônias ambiciosas e aproveitadoras. 

Meu pai nesse momento desceu do seu cavalo e pôs-se diante do rei. Adoro o lado afrontoso do meu pai. 

—Sinto muito alteza, mas não irei permitir que minha esposa e minha filha sofram as consequências da sua escolha egoísta. Eu sou o chanceler do reino e sei exatamente a situação que estamos passando, a única forma de sairmos dessa situação e dar uma vida melhor para nosso povo é retomando a coalizão com as outras 12 colônias, assim ocupando nosso 13º lugar de origem.

—E o que pretende fazer, Sr. Griffin se eu negar mais uma vez seu pedido? — Confrontou o rei.

—Ir a público. 

O rei encarou meu pai sério e respirou fundo tentando controlar a raiva. Nunca tinha visto meu pai enfrentar nem minha mãe, e ele está enfrentando o rei. Espero que ele consiga convencê-lo.

—Você é um ótimo chanceler, Jake, reconheço isso. Formou uma família linda, tem sua cadeira no conselho e é muito adorado. Mas lamento, não irei permitir que ninguém questione minhas decisões, pois o rei de Arkadia sou eu. — E nisso, Thelonius puxou sua espada e a atravessou no peito do meu pai.

Um grito rompeu minha garganta e chamou a atenção de todos. A dor consumia meu peito e eu só queria correr até lá e segurar meu pai nos braços enquanto ele caía ali sem amparo. 

—Clarke! Você não pode ir até lá, eles vão te matar também! — Wells me segurou quando tentei sair.

—Seu pai matou o meu! Eu não posso deixar ele ali! — Falei entre o choro e as lágrimas. 

—Clarke, vamos embora antes que eles nos veja, já estão vindo! — Ele me puxou mais uma vez e eu lutei — Vamos embora! Se continuar aqui você vai morrer, e no reino irá ser poupada pela população.

Deixei que Wells me arrastasse até nossos cavalos e partimos. Ele me levou no seu para irmos mais rápido, ao longe eu podia ouvir o som dos cavalheiros atrás de nós. Wells ia extremamente rápido. Chegamos ao reino ao amanhecer, muitos já estavam começando a fazer suas obrigações. Assim que desci do cavalo com Wells seu pai e os cavalheiros chegaram logo atrás. Eu só queria correr até o Thelonius, arrancar sua espada e cortar sua cabeça fora. Meu peito e meu coração doía demais.

—Senhorita Clarke Griffin, você está sendo presa por assassinato ao seu pai, chanceler Jake Griffin.

Universo The 100 - Clarke e Lexa (livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora