A Mansão de Espelhos (Parte IV)

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Certo dia, quando o Sr. e a Sra. Goldfarb precisaram ir até a cidade vizinha, resolveram deixá-los sozinhos. Tonico relutou. Aos prantos o menino agarrou na perna de sua mãe e implorou para ir com ela. A Sra. Carmen, por sua vez, tentou lhe explicar que seria uma reunião de negócios, e que crianças não podiam participar. Demorou uns dez minutos até ele se conformar em ficar.  

Alguns instantes haviam se passado quando os três decidiram, em meio a um debate, finalmente irem à ilha.

O céu estava muito negro e sem estrelas. A Lua encontrava-se mais cheia do que nunca, irradiando um brilho prateado que cobria o extenso rio Gabiru. Rio que ficava bem à frente da casa de n°6.

Ventava de doer à espinha.

– Está muito frio – reclamou Tonico, sua voz soou manhosa. Ele tremia o queixo e encolhia seus dedinhos.

Anita abraçou-o. Em seguida, seguiram até um barco que estava acanhado às margens do rio. Jamesson, por ser o mais forte, remava enquanto Tonico e Anita sinalizavam com as mãos para aonde deveria ir, além da montanha.

– Estou com medo. Está muito escuro aqui... – resmungou o pequenino, choramingando.

Naquele instante eles já avistavam a montanha Blue Moon, Jamesson parou de remar para que eles pudessem analisá-la, e o barco foi cessando. Os olhos, que mais pareciam bolinhas de gudes, percorreram-na de cima abaixo: era gigantesca. Seu topo realmente parecia alcançar a Lua. Para a surpresa deles, ela não era verde, mas sim acinzentada.

Agora rodeavam a montanha. As retinas de Tonico arregalaram-se. O menino tremulou por alguns segundos, com o dedinho indicador sinalizava para a Blue Moon. Seus irmãos viraram as cabeças lentamente. O pavor rodeou-os: desenhos de caveiras cobriam a montanha. Eles se espantaram, os corações aceleraram, e Jamesson retornou a remar, agora com mais velocidade.

A água escurecida do rio alvoroçava-se por conta do vento que não retardava e batia no barco com muito vigor, fazendo um barulhinho agonizante e espirrando nos meninos - eram gotículas gélidas que eriçaram seus pelos. O barco finalmente bateu em algo sólido. Eles se viraram e, inertes, surpreenderam-se com o que viram.

Era uma longa estrada barrenta envolvida por enormes árvores que chacoalhavam de um lado para o outro com brevidade. Desceram e puseram-se defronte à plaquinha: Bem-Vindos a Ilha de Akaku’s!, saudava-os. Jamesson e Anita olharam para frente e forçaram os olhos, mas não conseguiam enxergar o fim daquela estrada. Tonico ainda lia a placa, letras miudinhas lhe chamaram a atenção, ele semicerrou os olhos e por fim conseguiu ler: Os mais valentes duvidam, os mais incrédulos debocham e os mais inocentes são possuídos. Os espelhos escondem o que você não consegue enxergar. Entrem, e conosco vêm brincar. Ele engoliu a seco e rapidamente se juntou a seus irmãos.

– Mas isso não estava escrito na lenda – questionou Anita, quando começaram a caminhar pela estrada. Tonico agarrado a ela.

– Eu lhes disse. Aquela lenda não passa de uma historinha escrita por um velho autor para assustar criancinhas na hora de dormir – Jamesson rebateu. Revirava os olhos, estava inconformado com a insistência de seus irmãos quanto à lenda.   

Tonico e Anita soltavam leves gritinhos por conta dos barulhinhos que ouviam dos bichos da mata. O irmão mais velho não demonstrou estar assustado, mas seu olhar o denunciava. 

– Já estou cansada, vamos voltar – reclamou Anita, após estarem andando por quase uma hora. Quanto mais andavam mais extensa aquela estrada parecia ser.

Tonico pareceu em êxtase. Jamesson e Anita soltaram uma exclamação em uníssono. Era a Mansão de Espelhos, tão grandiosa quanto a lenda narrava. Os três caminharam pelo extenso jardim, que agora estava murcho e com flores acinzentadas. O vento soprava friamente sobre suas nucas, mas parecia não surtir efeito algum, pois estavam anestesiados com o tamanho da casa.  

Eles passaram pelo velho chafariz de dragão - sujo como toda a entrada da mansão abandonada. Lentamente abriram as enormes portas que fizeram um audível barulho. A luz da Lua cheia invadiu o casarão deixando-a iluminada.

– Mas ela é tão imunda e esquisita... – vociferou Tonico ao detectarem que a mansão era exatamente como narrava o livro. Porém, pessoalmente era muito sombria e abafadíssima.

– Óbvio, Tonino! – exclamou Anita. Os três estavam parados na entrada. – Ela está abandonada há anos. Pudera estar assim!

Minutos após olharem para todos os cantos da mansão, Jamesson, calado, foi até o primeiro degrau da escada e muito contente abriu os braços e disse:

– Viram! Não há nada de assombrado aqui seus bobões. Apenas uma mansão abandonada. – dito isto, ele caiu na gargalhada. Seus irmãos olhavam assustados para ele, mas logo caíram em gargalhadas também.

– Bom, já podemos ir embora então. A mamãe e o papai já devem estar a caminho de casa – disse Anita. E, ao fechar a boca, eles se viraram para partirem. A Lua cheia banhou-os com um clarão que fez enormes sombras deles.  

“PÁH”, fez a porta e os três deram passos abruptos para trás. Os corações aceleraram de imediato. Eles tremiam, descontrolados.

– Acalmem-se, foi só o vento – objetivou Jamesson, assustado. Ele foi até a porta e tentou abri-la, mas esforçou-se em vão. De uma forma inexplicável ela havia se trancado.  

– Estamo-o-os... – gaguejou Tonico.

– TRANCADOOOOS! – urrou Anita, medonhamente. O som de sua voz ecoou por toda a mansão.

Jamesson olhou-os alarmado. Ele não queria acreditar no pior. Respirou fundo.

A mansão ganhou uma luz repentina: duas fileiras de velas acenderam-se em ambos os lados da escada.

Tonico correu e agarrou-se, trêmulo, à Anita.

– Temos que sair daqui, Jame... – grunhiu a menina, aloprada. – AGORA! – vociferou.

Lágrimas escorreram dos olhos do primogênito.

Quando Jamesson abriu a boca para responder-lhe algo caiu no andar de cima...

A Mansão de Espelhos (Conto).Onde histórias criam vida. Descubra agora