I - Tome cuidado com os ratos.

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Quando o sinal escolar tocou pela última vez na quarta-feira, era como se os meus ombros exaustos e tensos finalmente pudessem se libertar depois de tantas horas imóveis na cadeira. A maioria dos alunos de minha turma já haviam guardado seus materiais cerca de quinze minutos antes da hora de irem para casa, saindo alvoroçados pelos corredores.

Por mais que a minha casa não fosse tão diferente da escola, me senti aliviada ao saber que poderia descansar um pouco em minha cama depois de um dia tão cansativo. Caminhei pelos corredores silenciosamente, porém sorridente como se estivesse a caminho do paraíso.

Assim que ultrapassei o portão da escola com aquela multidão de pessoas e atravessei a rua, pude sentir a brisa suave arrepiar minha nuca enquanto partia para casa.

~💎🐁~

Ouviu-se a porta de madeira clara da entrada batendo suavemente e trancando. Ao entrar pela sala de estar, joguei minha mochila num dos sofás, e fui até o banheiro para que pudesse higienizar minhas mãos. Quando terminei de enxugá-las, observei o espelho logo acima, e quase automaticamente levei minhas mãos para tocar suavemente meu rosto, ainda que sentisse um pouco de remorso ao fazer isso. Já havia virado rotina ver essa imagem pelo menos cinco vezes ao dia, como diria minha mãe, "um rosto sujo, manchado e espinhento". Mordendo a bochecha para limpar meus pensamentos, amarrei meu cabelo num coque baixo, foi quando ouvi minha mãe me chamar.

Apaguei a luz do cômodo e sai em disparada até a cozinha, dando de cara com a figura da sra.Bowen cortando um tomate em rodelas numa tábua de madeira mediana. Puxei uma das cadeiras que cercavam a mesa de jantar, sentando-me logo em seguida.

- Então? - A senhora perguntou.

- Então o quê? - Retruco confusa.

- Não se faça de tonta, a prova de biologia, como foi?

Senti meu sangue gelar ao ouvir sobre a prova. Não que eu tivesse ido mal, mas sabia que seria julgada da mesma forma.

- Eu tirei nota oito...e meio. Foi a maior nota da sala, mãe. - Limpo a garganta.

Naquele momento, foi como se a faca afiada perfurasse o fundo daquela tábua com um simples gesto de sua mãe. A senhora Bowen parou por um momento, virando-se para trás.

- Oito e meio? Só isso? - Seu tom era quase como ameaçador, disfarçado pelo sorriso cínico estampado em seu rosto. Logo, fez três estalos com a boca indicando três grandes "nãos".

O silêncio permaceu por um momento, enquanto encarava o chão com frieza.

- Bowen, eu não quero ter que brigar com você de novo.

Amanda, minha mãe, terminou de cortar os tomates, e empurrou-os com a faca para que eles deslizassem diretamente até uma bacia redonda. Colocou os utensílios de cozinha dentro da pia, e caminhou lentamente até a mesa de jantar, ficando de frente para mim.

- Olhe para mim, agora. - Ordenou.

Sem dizer absolutamente nada, eu levantei a cabeça.

- A escola me mandou uma mensagem hoje mais cedo, dizendo que você terá uma nova professora de biologia. Antes que fale alguma coisa, eu já entrei em contato com ela.

- O quê? Como assim?

- Suas notas em biologia estão péssimas. Oito e meio é uma enorme vergonha. Perguntei se ela poderia te dar aulas particulares.

Mesmo que fosse contra aquilo, preferi não contestar.

- E o que ela respondeu?

- Ela disse que irá arrumar um horário. Eu quero que você saiba que vamos investir um dinheiro enorme nisso. Se você não se esforçar, já sabe que nessa casa não vai mais entrar.

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