O inverno é uma estação melancólica aos olhos de Pelham. Sempre que uma brisa sutil levanta a saia da cortina de sua tenda, o frio adentra como uma lâmina afiada, penetrando-o até a alma. Selena, a sétima filha, ao contrário, encontra encanto no inverno. Ela percorre longas distâncias com seu cavalo Alvo, cuja cor branca quase se camufla com a neve quando galopa em alta velocidade, destacando seus cabelos negros como a noite. Esta é, sem dúvida, a melhor parte do inverno. O Jovem do Caneleiro frequentemente se questiona por que Selena cavalga tanto em busca do floco de neve perfeito. Talvez a vila tenha prosperado tanto que agora resta apenas aproveitar o estoque, como muitos fazem nas tavernas, ou se aventurar atrás de flocos de neve, uma atividade que aparentemente apenas a jovem de cabelos negros pratica.
No entanto, neste dia, o rapaz acompanha Selena até um morro alto onde ela vai encontrar sua missão frívola, até quando chega em um ponto onde se despedem, ao vê-la partir, o jovem retorna ao caminho que leva de volta à vila. A tristeza do céu nublado parece descer dos céus e envolver o coração de Pelham. Pode parecer fútil pensar que algo tão trivial o afete, mas, para ele, esses sentimentos são a raiz de muitos dos seus problemas.
No caminho de volta, ele deveria encontra um dos genros de Jordi, que havia resolvido alguns problemas nas proximidades. O genro havia prometido esperar por Pelham, que estava acompanhando Selena até um certo ponto. No entanto, o genro, impaciente, parte sem ele, deixando o jovem sozinho.
Agora, sem sua carona, Pelham caminha por um longo tempo, enquanto a neve torna sua jornada mais desafiadora. Sua inabilidade de aprender a montar um cavalo o faz sentir-se inútil, apesar de sua habilidade em curar as pessoas com sua magia. Com o progresso da vila, sua magia se torna cada vez menos necessária, o que o faz sentir-se ainda mais inútil.
O vento sopra com mais intensidade, e ele só queria estar em sua aconchegante morada. A visibilidade se torna precária, e a neve congelando nos cílios dificulta sua visão. O nariz fica vermelho e irritado, tornando a respiração incômoda.
Ele se apoia em um cajado, que o ajuda a verificar a firmeza do terreno sob tanta neve. Logo, ele chega a um encantador córrego que costumava visitar para banhar-se ou matar sua sede. Entretanto, agora o córrego flui sob uma camada relativamente grossa de gelo, e ele escorrega. Sua perna se estica, e seu joelho esquerdo bate no gelo. Por sorte, o gelo não se rompe, mas a dor em seu joelho apaga qualquer sensação de sorte que ele possa ter sentido.
Neste momento, ele se questiona se está amaldiçoado e se sua solidão seria o melhor para todos. Quase inconscientemente, ele muda sua rota e caminha entre as montanhas que já não são tão brancas quanto a superfície por onde passava. São tantas montanhas que ele as inveja. Elas estão sempre juntas, de mãos dadas, mas sempre abrindo espaço para os solitários passarem, que agora não parecem tão solitários, pois as montanhas os abraçam e estão sempre ao seu lado, não importa para onde ele vá.
Ele relembra os Fogos-Fátuos e os caneleiros com ternura. Talvez, afinal, ele não esteja tão só. Recorda-se de como sempre auxiliou o caneleiro, percebendo que suas ações, embora modestas, tinham valor. O caneleiro, em retribuição, lhe concedia magia, e os Fogos-Fátuos o protegiam não como pagamento por sua companhia, mas como um gesto de amor. Embora a palavra "amor" não tenha ecoado em seus ouvidos, exceto por seu apelido, Amatus, que era uma prova de que era amado por alguém, ele compreendia que há aqueles que dependem dele, da mesma forma que ele depende deles.
Ele dá a volta, despedindo-se dos imponentes montes que chamou de "Montes do Norte", e decide seguir em direção contrária aos Portais do Norte, ou Norporta. Até hoje, acredita-se que as montanhas tenham ouvido o Jovem que odiava o inverno gritar "NORPORTA" por horas a fio. Talvez por sua persistência, as montanhas tenham sussurrado aos seus habitantes, os pequenos seres que residem em seu interior, o nome proclamado pelo jovem.
Enquanto Pelham caminha em direção a Jorditonia, ele é surpreendido por uma visão mágica. Uma jovem cavalga em sua direção, em um alazão branco que parece flutuar no ar. Ela ergue a mão, na qual um lindo e curioso floco de neve permanece intacto, ocupando toda a sua palma.
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O Jovem e o Caneleiro
FantasíaNo início de terras gloriosas, onde reinos mágicos se erguerão em meio a batalhas épicas, desdobra-se uma narrativa que transcende as eras. Uma história entrelaçada com temas atemporais de aceitação, forjada na fornalha da amizade e permeada pela es...