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NOVE

Wuxian conseguiu trabalhar o dia todo na lanchonete sem nenhum problema. Bem, além da distração constante de se perguntar se ele finalmente iria ver Wangji por um tempo esta noite. Wangji tinha um negócio para administrar e uma vida que não poderia interromper só porque Wuxian estava fora.  Ele estava sendo egoísta e sabia disso.  Pelo menos Wangji ligou para ele durante o dia para avisar que chegaria hoje à noite.
Finalmente.

Ele sentou-se na sala, tentando ao máximo ignorar Frankie e seus latidos constantes.  Como diabos Ryan tinha aguentado aquela merda todas as noites durante os últimos dois meses era impossível de adivinhar. Depois de apenas algumas noites, ele já queria enfiar a bota na garganta do cara.

Ele olhou para o relógio de parede pela milionésima vez nos últimos trinta minutos.  A maldita coisa não parecia estar se movendo.  Ele fechou os olhos e respirou fundo, desejando que sua perna parasse de balançar. O voo de Wangji estava atrasado. O que significava que ele estava fechando muito perto do fim do horário de visitas. E o maldito Frankie não estava calando a boca, discutindo com a maldita televisão como se os participantes do reality show pudessem realmente ouvi-lo.

Wuxian levantou-se do sofá quando a campainha tocou.  Ele virou a cabeça para dar uma olhada rápida no relógio de parede.

— Eu cuido disso. — Disse Mingjue, estendendo a mão para detê-lo.
Wuxian soltou um suspiro lento através dos lábios franzidos, na esperança de desligar a britadeira que havia se instalado em seu peito. 

Ele teria quarenta e cinco minutos preciosos com Wangji. Supondo que fosse ele na porta e não algum entregador de pizza tarde da noite.  Ele fechou os olhos e respirou fundo novamente, contando até dez, precisando se acalmar.

Ele abriu os olhos e sua respiração ficou presa na garganta.
Wangji segurava uma pequena bolsa e ficou a centímetros de distância, aqueles impressionantes olhos dourados fixos nele.

Mingjue colocou a mão no ombro de Wangji, quebrando o transe entre eles. —Wangji, você pode deixar sua bolsa aqui. — Ele olhou para Wuxian.  — Vocês podem sentar lá atrás.  Duvido que você consiga combater o debate unilateral de Frankie.
Wuxian assentiu e se virou para sair pela porta dos fundos, ouvindo os passos de Wangji logo atrás.

Ele respirou fundo mais algumas vezes, precisando acalmar o eco latejante em seus ouvidos.  Ele sentia falta de Wangji, de seu sorriso, de sua risada.  Tudo. Não havia como ele estragar tudo.

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Wangji não conseguiu silenciar o zumbido em seus ouvidos.  Seu voo havia pousado e, no momento em que o avião pousou, o tremor de suas mãos começou e não parou.  Não havia nenhuma maneira de ele perder um único minuto esperando o motorista chegar ao aeroporto para buscá-lo, então ele pediu a Taylor para deixá-lo.

Ele só tinha quarenta e cinco malditos minutos.  Atrasos e protocolos climáticos estúpidos no aeroporto o forçaram a perder muito tempo.  Ele odiava essa porcaria e se sentia como um adolescente no baile de formatura com uma maldita acompanhante e toque de recolher.
Ele sentou-se ao lado de Wuxian no banco da varanda, sentando-se de lado para encará-lo, cruzando as mãos no colo, na esperança de acalmar o tremor.

Não toque nele.

— Como foi seu voo? — Wuxian perguntou.

— Complicado.  Atrasos de chuva nos atrasaram na saída, então demorou um pouco.  Tivemos alguma turbulência, mas pousamos.  Eu vim direto para cá.

Não toque nele.

— Eu vi a bolsa.  Notei que você veio pela frente.  Você não dirigiu sozinho?

Não toque nele.

Wangji cerrou os punhos e depois os abriu, precisando parar o tremor que vibrava em seus dedos.  — Oh não.

Não toque nele.

— Você está bem? — Wuxian esfregou as mãos nas coxas vestidas com jeans.
Essas coxas.
Não toque nele.

Eles eram mais grossos do que antes, obviamente musculosos.  Ele se perguntou se seria capaz de ver as reentrâncias de seus músculos e como seria a sensação de cada subida e descida em sua língua.  Tudo no novo Wuxian era mais denso.  Mais forte.
Não toque nele.

Foda-se.  Ele estendeu a mão e agarrou a mão de Wuxian, finalmente respirando fundo quando a tensão começou a diminuir de seu corpo e o tremor em suas mãos desapareceu quase instantaneamente.
— Quanto tempo durou isso?

Wangji não percebeu que seus olhos estavam fechados até abri-los.  — Eu perdi a pergunta.  Desculpe.

— Quanto tempo durou isso?  Um minuto?

Seu cérebro estava tão confuso que ele não conseguia acompanhar a conversa. Ele se concentrou no bálsamo de calma que parecia penetrar em seu corpo com o toque.  Wuxian fez uma pergunta... não foi? O que diabos ele perdeu?  Wangji desejou que sua mente se concentrasse. — Não estou acompanhando a conversa. Desculpe. — Ele passou o polegar pelos dedos de Wuxian, vendo as novas cicatrizes brancas, minúsculas e quase invisíveis, nos nós dos dedos. Suas mãos eram fortes, seus dedos grossos.
Ele sentiu falta disso.  Essa intimidade.  O calor do toque de Wuxian.  Ele não suportava estar tão perto dele sem algum tipo de contato.

— Você demorou um minuto para precisar me tocar. — Disse Wuxian.  — Você brigou um pouco consigo mesmo antes de agarrar minha mão?

— Eu...— Wangji olhou das mãos entrelaçadas para Wuxian e depois novamente.  — Eu não tinha certeza de como você se sentiria se eu atacasse você depois de ficarmos separados por tanto tempo.  Não tenho certeza de como você se sente por eu tocar em você.  Ele olhou para suas mãos unidas.  — Quando te busquei, tive que enfiar as mãos nos bolsos para não tocar em você.

Wuxian riu baixinho.  — Achei estranho quando você fez isso.  Você nunca foi tímido. — Ele passou o polegar pela pele de Wangji.  — Você sempre precisou ter esse contato.  Você nunca foi capaz de sentar perto de mim e não me tocar de alguma forma.

— Você quer que eu pare? — Ele tentou soltar a mão de Wuxian, mas Wuxian apertou ainda mais.

— Nunca deixe de me tocar. — Wuxian colocou a mão livre em cima das mãos unidas e soltou um suspiro trêmulo. — Estar longe de você foi difícil.  E teria sido impossível estar a poucos centímetros de você durante uma visita e não poder tocá-lo.

Wangji lutou para respirar em meio à tempestade de emoções que apertavam sua garganta.  Ele não conseguia imaginar estar tão perto de Wuxian e ter o contato negado.
— Eu... teria perdido por dentro. — Wuxian terminou em um sussurro.  — Eu não teria sido capaz de sobreviver tanto tempo.

Wangji soltou a mão de Wuxian e estendeu a mão, hesitando por um momento antes de lentamente envolver a nuca de Wuxian com os dedos e passar os polegares pelos músculos tensos.  Seu peito arfava a cada respiração que ele empurrava pelos pulmões enquanto seus olhos examinavam cada pequeno detalhe do rosto de Wuxian, catalogando cada milímetro, registrando em seu banco de memória cada nova cicatriz e ruga. 
— Senti sua falta.
Wuxian estendeu a mão e colocou a mão sobre a de Wangji.  —Também senti sua falta.

Maldito Wuxian e sua capacidade de lê-lo como um letreiro em néon piscando.  Wangji nunca conseguiu esconder nada do homem.  Inferno, a maioria das pessoas não conseguia.  Wuxian tinha um talento especial para ler as pessoas e descobrir o próximo passo.

Wangji estendeu a mão e passou a ponta do dedo ao longo da cicatriz que começava na têmpora de Wuxian e atravessava sua sobrancelha, uma marca permanente que seu pai havia deixado no rosto de Wuxian durante o ataque.  Ele tinha visto a foto e lido o relatório.  O grande e horrível anel de fraternidade de seu pai cortou a pele de Wuxian e deixou uma lembrança duradoura do tempo que passaram separados e da dor que cada um suportou com a separação.

Ele puxou Wuxian para perto e deu um beijo em sua têmpora sobre a cicatriz.  Ele respirou lenta e profundamente, saboreando o calor da pele de Wuxian.  Ele roçou o nariz na bochecha de Wuxian e depois roçou levemente suas bocas, gemendo quando Wuxian imediatamente capturou seus lábios e o convidou para explorar.  Seus olhos se fecharam enquanto ele apreciava o sabor do homem que ele desejou por tantos anos e que ainda precisava tanto quanto sua próxima respiração.  Dedos roçaram sua nuca e um aperto firme o manteve no lugar.
Wangji se afastou do beijo quando um grito ecoou de dentro da casa.

— Maldito Frankie. — Wuxian rosnou, pressionando suas testas uma contra a outra.

Wangji respirou fundo algumas vezes, na esperança de desacelerar seus batimentos cardíacos para algo seminormal.  Ele imaginou estar a trinta centímetros de Wuxian, vendo-o através de uma divisória que poderia estar suja ou arranhada.  Imaginou ouvir a voz de Wuxian distorcida por aquelas linhas telefônicas ruins que ele via nos filmes e na TV.  E se a conexão tivesse sido tão ruim que ele não conseguisse captar as pequenas mudanças em seu tom que muitas vezes falavam mais do que as palavras de Wuxian?  Ele sabia, sem dúvida, a verdade de suas próximas palavras.
— Eu não teria sobrevivido. — Ele desviou o olhar, odiando a fraqueza que ardia em seus olhos.  — Eu não teria sido capaz de ver você lá.  Assim. — Wangji se forçou a fazer contato visual e respirou fundo quando a dor que sentiu o encarou de volta.

— Preciso saber que você não me odeia por mantê-lo afastado. — Wuxian engoliu em seco.  — Por favor.

A falha em sua voz dizia muito.

Wangji sentiu a dor nas palavras escritas de Wuxian quando leu as anotações do caderno.  Mas ali, em seus olhos e na pequena e quase insignificante falha em sua voz, Wangji tinha a prova de que Wuxian também sofrera com a separação.

— Eu nunca poderia odiar você.

Wuxian fechou os olhos e exalou um suspiro profundo que deslizou pela bochecha de Wangji.  — Eu prometo… farei tudo que puder para compensar isso.  Vou rastejar o quanto for necessário e ganhar seu amor de volta.

Wangji roçou o nariz na lateral do rosto de Wuxian.  — Eu nunca parei de te amar.  Então você não precisa ganhar nada de volta.  Conversaremos amanhã.  Hoje eu…

Ele não sabia o que queria.  Ele precisava estar perto de Wuxian.  Saber que ele estava seguro e perto dele.

Wuxian deslizou o braço em volta da cintura de Wangji e apoiou a cabeça em seu ombro.  — Esta noite, você quer isso.

Wangji poderia erguer uma parede de ferro com todos os outros e fortalecer suas feições e emoções.  Mas com Wuxian, qualquer fachada que ele tentasse colocar sempre parecia transparente.
— Sim. — Ele finalmente disse.

— Eu também.

Ele enfiou o nariz no cabelo de Wuxian, apreciando o cheiro reconfortante e familiar misturado com um toque de algo novo que mal podia esperar para descobrir.  Ele se acomodou no abraço quando braços fortes o puxaram para mais perto e silenciosamente o seguraram com força durante os melhores trinta e sete minutos que ele teve nos últimos dez anos.


(...)

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