Capítulo 3 - Passos.

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Hoje é o início da minha segunda semana convivendo em sociedade aqui na universidade. Uraraka parece realmente fazer questão de que eu me sinta mais confortável, ainda mais pelo modo como revelei a todos sobre o HIV. De certo modo, parece que agora sou popular por aqui, acho que as fofocas se espalham rapidamente, eram tantos olhares que eu já estava ao ponto de surtar.

Apenas gostaria de encontrar um pote, grande o suficiente, para me enfiar dentro dele. Na intenção de fugir de todo o rebuliço que eu acidentalmente causei, acabei entrando no ambiente exterior da instituição educacional. Estava vazio e silencioso, como tudo o que eu queria, paz.

Estava quase suspirando relaxado quando repentinamente ouvi o som de algo sendo surrado, para ser específico uma madeira. Engoli seco e me escondi atrás de uma enorme lixeira, observando atentamente um jovem loiro que de maneira bruta acertava aquela pobre árvore.  O mesmo parecia preso em uma espécie de transe, como se estivesse preso a uma ideia ou preocupação na mente, o garoto parecia hiperventilar com brutalidade, seu rosto se encontrava vermelho.

Seus punhos sangravam quando parou de repetir a ação, apenas se jogando contra a grama. Ainda respirava rápido, mas pareceu estar um pouco mais calmo. Seus olhos, que antes estavam cerrados, agora se encontravam parados em um ponto fixo. Eu me pergunto se deveria me aproximar do tal, já que se estivesse em seu lugar esperaria por ajuda. Por outro lado há aqueles que não confiam em estranhos, tem uma mínima possibilidade dele me agredir. Ah, foda-se!

Ligeiramente me prontifiquei a me aproximar em passos leves e silenciosos, sem qualquer pressa ou malícia. O homem não percebeu minha presença, isso foi perceptível quando se assustou com minha voz soando repentinamente.

- Olá, está tudo bem por aqui? - O garoto quase saltou, antes de me lançar um olhar incrédulo.

- O que quer? - Sua voz soou rude.

- Eu vi você, fazendo o que fazia. Gostaria de saber se está tudo bem! - Me sentei ao seu lado.

- Bom… - Pareceu ceder por uns instantes, mas logo se fechou. - …estou bem, se é o que quer saber.

- Não parecia, o que está acontecendo?

- Por que eu deveria te contar?

É, realmente, por que deveria?

- Porque sou um cara super legal disposto a te ouvir?

- Ah… - Ele sorriu. - É apenas estresse, isso tudo vai me matar um dia!

- Como assim?

- A universidade, está me sugando. Não aguento mais lidar com as pessoas, elas são um saco. Tem um… foda-se vou falar mesmo! Tem um desgraça, filho da puta, na minha turma, e ele acha que o mundo inteiro gira em torno dele. O que é verdade já que ele é um pau no cu de inteligente, aí geral é baba-ovo dele. Nisso, a professora nos colocou para fazer um trabalho e aquele filho tá puta…!!! - O garoto levantou e voltou a surrar a pobre planta. 

- Ei, ei. - Segurei seu ombro.

O mesmo me olhou, parecendo se acalmar. Eu não sei ao certo associar o que aconteceu aqui dentro de mim, ouvi uma bolha explodindo. Meu coração tremeu, ele era lindo.

Seus olhos tinham uma cor clara e única, com o reflexo do sol parecia até mesmo vermelho, seu cabelo era loiro e bagunçado, como se o mesmo tivesse tentado dar um jeito mas no fim ficou da maneira em que está. Seu queixo era fino, e possuía uma sombra de barba feita recentemente. Seus dentes eram tortos, e seu nariz era maior que o habitual. Sua pele não era lisa, parecia sofrer com uma acne leve, seus lábios eram finos e não pude deixar de notar o alargador que possuía em ambas as orelhas.

- Ah, não deveria descontar a sua raiva em seu próprio corpo.

- Desculpe, eu não sei lidar com meus sentimentos.

- Não é para mim quem deve se desculpar, seu corpo é quem mais está sofrendo por tudo isso. - O outro abaixou sua cabeça. - E a árvore também, peça desculpas!

- Desculpa, árvore! - Falou irônico, me fazendo rir.

- Certo, continua dizendo, mas dessa vez sem palavrões para não se sentir tão irritado. Palavrões irão piorar tudo!

- Tá certo. Enfim, esse cara decidiu que era ele quem seria o 'líder', sendo que o trabalho era em grupo. E tava querendo fazer as coisas de uma maneira muito idiota, aí fui falar sobre isso, e ele deu chilique para todos, e geral ficou contra mim!

- Ah, é uma situação realmente complicada para se lidar, eu entendo totalmente a sua frustração. Mas entenda algo, você não é definido por aquilo que eles pensam. Você vai além, e se eles estão achando que você é um pau no cu agora, deve mostrar que não é e que tem razão do que fala.

- Ei, você disse sem palavrões!

- Oh, me desculpe loirinho.

- Hahaha, idiota, mas você tem razão. Vou procurar me impor mais.

- Certo… - Brinquei com as mãos por alguns instantes. - Eu sou Izuki Midoriya, estudante de artes visuais.

- Eu sou Katsuki Bakugou, estudante de psicologia.

- O que!!?? - Me assustei. - Você é estudante de psicologia e não sabe lidar com sua própria mente?

- Esquisito né?

Qual o verdadeiro sentido disso? 

Você não se entende e procura uma profissão para entender o outro. Primeiro o Tamaki, e agora esse loiro. Há algo de muito errado em todos os estudantes de psicologia! Encarei novamente o loiro, dessa vez com minha feição de dúvida eminente, fazendo o outro sorrir disfarçado.

- Não ache que todos os estudantes de psicologia têm problemas. Pois ser profissional é diferente de ser humano. Eu tenho fraquezas, eu tenho momentos de descontrole, mas quando se está em um consultório a minha postura é outra.

- Entendo…

Ficamos sentados na grama por um longo período de tempo, era perceptível que ambos precisavam de um instante de paz e sossego. Eu vez ou outra o olhava disfarçadamente pela minha visão periférica, era impossível não estar na fissura.

[...]

- Ei Izuku!! - Uraraka saltou ao meu lado.

- Sim? - Deixei as minhas atividades de lado, dando atenção a garota.

- Você ficou sabendo da festa neste sábado?

- Festa? Não fiquei sabendo de nada não. - Apoiei a face em minha palma.

- Bom, no sábado o pessoal de química decidiu criar uma festa para todos da faculdade. Quer ser minha companhia?

- Ah, não sei. Bem, eu não sou muito chegado em festas assim!

- Vamos, vai… Tenho certeza que irá se divertir!

- Irei pensar…

- Te adoro! - Saiu saltitando, me fazendo rir.

Ela era realmente alguém muito animada, e segura de si. É isso que me chama atenção nela! Se todas as garotas do mundo tivessem tanta autoestima conseguiria fazer tudo aquilo que tivesse vontade. Isso seria um peso a menos para todas elas.

Enquanto Houver Nós - BakudekuOnde histórias criam vida. Descubra agora