A escuridão me envolve. Se embola ao meu redor.
O coração dispara e a respiração evapora. O grito se engasga na garganta.
Isso nunca aconteceu. Não estou mais dormindo e nem estou paralisada... ainda assim, estou. Não consigo mover um músculo.
Ainda estou sonhando? O que aconteceu no banheiro, os toques de Hector... tudo não passou de um sonho dentro de um pesadelo?
Minha mente está em branco. Ao longe, a torre ri, se comprazendo de meu pavor paralisante.
Mas então, como um cobertor, a escuridão é suspensa com um risinho.
— Já dormiu? Nem está se mexe-
Hector se interrompe de súbito quando ergo o rosto para ele. Ao perceber o grande cobertor ao meu redor, entendo o que aconteceu.
Meus olhos ardem e a respiração retorna fragmentada em soluços.
— Seu estúpido... por que fez isso?! — guincho, acertando um murro patético em seu quadril.
Hector se joga no sofá novamente e, num impulso, me puxa para si.
— Desculpa, desculpa... não era para assustar você... desculpa — sussurra em meus cabelos, me abraçando com força enquanto minhas lágrimas patéticas molham seu peito cheirando ao meu sabonete de lavanda.
— O que... o que pretendia então? — retruco, tentando engolir os soluços e me afastar, parecer menos a garotinha assustada que era em nossa infância.
Ainda é. Não passa de uma princesinha medrosa e chorona
Aperto os lábios, tentando com mais afinco engolir o sal das lágrimas e a verdade que me alfineta. Hector, alheio ao deboche da torre, permite que eu me afaste apenas o suficiente para varrer minhas lágrimas com meio sorriso apologético.
— "Pesadelos e sombras temem cobertores e abraços" — entoa, numa imitação do doce tom cantante de Axl ao recitar a "crendice" inventada por ele próprio. — O ritual estará incompleto, mas... não custa tentar, não é?
Por mais que tente engolir as lágrimas e Hector as varra de meu rosto, elas vazam mais ainda. Meu peito as espreme para fora. Porém, já não é pelo susto.
É por Hector estar diante de mim, com cobertor e braços ao meu redor.
É pelas lembranças revolvidas.
Lembranças das noites de infância em que nossos quartos eram meramente nominativos, porque só dormíamos com Alexander antes de ele ficar "velho demais"; lembranças do tempo em que meus pesadelos eram bem mais frequentes, a ponto de muitas vezes Axl e Hector me passarem para o meio deles num estado quase sonâmbulo — quando era um pesadelo infantil corriqueiro — ou ficarem longo tempo me acalmando após uma paralisia... ou Axl colocando compressas frias em minha testa quando vinha o sonho-do-fogo.
Consolo que nenhum travesseiro jamais pôde proporcionar.
Ainda assim...
— Não consigo voltar para a cama e você não consegue dormir assim. Não é justo — murmuro, tocando as marcas escuras sob seus olhos.
As últimas duas semanas desde a reunião com Guilhermo têm sido tão puxadas quanto prometido. Mesmo que tenhamos optado por compromissos sociais leves, como pequenos saraus, estar neles nunca é leve — a armadura é até mais pesada que de costume. Quase no mesmo período, ele começou seus exercícios para "relaxar e socializar", mas só o que vejo é o cansaço consumindo-o aos poucos.
Hector, porém, como de hábito, encolhe os ombros menosprezando sua necessidade de descanso.
— Também não vou conseguir dormir naquela cama enorme e deixar você aqui, exposta nesse frio...
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Tratado de Vidro - HIATUS
FantasyNa véspera de seus 18 anos, a princesa-herdeira de Thempesta, Alissa, descobre-se prometida em casamento por um tratado e recebe a inesperada proposta de fuga feita pelo herdeiro do reino vizinho. De repente, se vê presa no dilema de abandonar a fam...