Capítulo 4

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Melissa acordou extremamente eufórica, enfim o grande dia havia chegado e ela tinha a plena certeza que sua mãe hoje iria vir para sua festa de aniversario. Sete anos que ela desejava conhecer a sua outra mãe, ver seu rosto, sentir seu cheiro, se abrigar em seu abraço e dizer o quanto ela a amava. Ela nunca tinha visto fotos de sua outra mãe, sequer sabia seu nome, aquilo a deixava muitas vezes triste e chateada com sua mãe Rachel, mas tudo isso ficaria no passado, pois hoje enfim ela saberia tudo sobre a outra mulher que a carregou na barriga.

Sem tempo a perder ela queria acordar a casa toda e comemorar cada minuto daquele dia, ela não fazia ideia de que horas sua outra mãe chegaria, se chegaria para o café, almoço ou só na hora da festa. Ela logo após acordar nem se preocupou em ir ao banheiro, correu para o quarto da sua mãe, afim de acordar logo Rachel e aproveitar o dia. Como sempre fazia ela entrou no quarto e foi direto para a janela, puxando a cortina para o quarto clarear, já que sua mãe dormia em um total breu.

O coração de Melissa parou de bater quando ela olhou na cama e viu que sua mãe Rachel não estava sozinha, ao lado dela havia outra mulher, ela era loira, isso já fez seu coração voltar a bater acelerado. Porém o melhor de tudo foi quando ela viu que o braço da mulher não estava coberto pelo edredom, o braço estava para fora, repousando e abraçando Rachel, a mulher vestia o pijama preto que ela havia escolhido com tanto amor. Ela mal podia acreditar, enfim sua outra mãe havia mesmo chegado.

- Mamães. Mamães. Mamães – A menina gritou e pulou na cama acordando imediatamente ambas as mulheres. Rachel era acostumada ao mini furacão lhe acordando assim, eram sete anos lidando com rompantes de euforia pela manhã, mas Kally havia levantado tão rápido quanto se precisasse fugir de um incêndio, na sua cabeça ela nem lembrava onde estava, mas estivesse a onde estivesse, o local com toda certeza estava pegando fogo.

- Mamãe, você veio mesmo. Você realmente veio. Você voltou para mim – Melissa tinha lagrimas de felicidade nos olhos. Rachel  estava petrificada com tudo aquilo que estava acontecendo. Ela estava sentada na cama atônita, desejando que tudo aquilo fosse um grande pesadelo.

Melissa pulou da cama direto para o colo de Kally. Kally a segurou no ar agradecendo a Deus pelo reflexo que tinha surgido naquele momento. Ela estava em pé, segurando a menina no colo, sem ter nenhuma certeza sobre o que deveria fazer. Melissa chorava enquanto encarava Kally o mais de perto que conseguia, os olhos verdes idênticos de ambas estavam grudados um no outro. Melissa tinha seus olhos banhados em lagrimas e Kally tinha os dela repleto de pânico.

- Mamãe, eu senti tanto sua falta. Você demorou tanto para voltar. Você é a mulher mais bonita de todo o mundo – Melissa falava tudo correndo e de forma extremamente emocionada. 

Rachel sentia que tudo aquilo estava indo longe demais, embora ela quisesse abrir a janela e se tacar de cabeça para morrer ou fugir dali e nunca mais voltar, ela sabia que aquelas opções eram impossíveis, sobrou para ela resolver toda aquela confusão. 

Rachel se levantou da cama e caminhando o mais lentamente possível a fim de tardar aquela conversa, ela se aproximou de Kally e parou ao lado das duas. Kally ainda tinha Melissa em seu colo e não esboçava nenhuma reação. A criança agora atacava o rosto de Kally em beijos.

- Eu te amo tanto, mamãe – A menina dizia ainda sem conseguir parar de chorar e ri ao mesmo tempo.

- Filha – Rachel tinha a voz extremamente inconstante, sentia sua garganta seca – Venha para meu colo e deixe Kally – Ela tentou pegar a menina do colo de Kally, mas Melissa agarrou mais ainda a outra, escondendo seu rosto agora no pescoço da mulher adulta que a segurava – Meu, amor. Venha comigo – Rachel tentou puxar a menina, mas não teve sorte, só iria conseguir a tirar  dali se a puxasse tão forte a ponto de machucar a filha.

Kally olhava para Rachel em pânico, ela ainda estava totalmente perdida naquela situação, alguma coisas pareciam só acontecer com ela e essa era uma dessas coisas. Ela lembrava de como Rachel ontem estava destruída quando ela chegou, ela lembrava de cada detalhe da história que Rachel tinha contado, de como a mulher estava miserável e de como a criança sofria sem a mãe.

A menina em seus braços tremia e chorava sem parar, confiava em Kally para ser seu abrigo, confiava que ela era sua outra mãe, como fugir disso? Kally sabia a importância de uma mãe na vida do filho, ela sabia que Melissa tinha Rachel e tinha certeza que a outra era uma mãe maravilhosa, mas ainda assim ela entendia a menina sofrendo por faltar a outra parte. Ela mesma foi vitima desse sofrimento a vida toda, pois por mais que seu pai sempre foi presente e amoroso ele nunca substituiu a falta que sua mãe deixou quando morreu assim que ela nasceu. Elas cresceu sentindo falta da mãe, sonhando com a mãe, idealizando como seria se tivesse sua mãe e seu pai juntos. Kally entendia Melissa e entender a menina aumentava ainda mais seu pânico, pois ela sabia que quando falasse que não era sua outra mãe, que a mãe não chegaria, a menina entraria em um sofrimento desmedido.

- Mel, vem comigo, por favor – Rachel implorava e já começava a chorar, tudo ali estava emocional demais, pesado demais. Kally era consciente que ela era a única que poderia quebrar tudo e fazer todo mundo parar de chorar.

- Chega – Ela gritou extremamente alto para Rachel fazendo a outra se afastar em um impulso – Se você continuar puxando ela vai machucar a menina – Kally falou o obvio, tentando amenizar seu tom de voz. Rachel sabia disso tanto quanto Kally, mas não tinha outra solução, ninguém mais que ela odiava machucar a menina, mas ela precisava desgrudar a criança da outra.

Kally deu pouco mais de três passos e voltou em direção a cama, colocou os pés da menina em contado com o colchão, de pé na cama a menina ficava praticamente da altura dela.

- Mel, meu amor, você pode me olhar? – Kally pediu docemente e a menina demorou alguns segundos para tirar o rosto do pescoço da outra e a encarar – Eu também senti sua falta todo esse tempo – Kally falou sem nem mesmo acreditar no que estava fazendo, sabia que aquele caminho era sem volta, sabia que Rachel iria a matar por isso, mas ela não seria a responsável por quebrar o mundo daquele criança de sete anos de idade em seu aniversario. Kally beijou docemente a bochecha da menina e tentou limpar suas lagrimas, Rachel se mantinha no mesmo lugar, seu corpo não a obedecia, ela se sentia incapaz de andar e falar, observava a cena como uma telespectadora apenas.

- Mamãe, você não me ama? – A menina deu voz ao seu maior medo e fechou os olhos esperando a resposta. Kally sorriu, Melissa era adorável, como alguém podia abandonar ela?

- Meu, amor. Abra seus olhos – Ela pediu em sua voz mais doce, ela sempre foi conhecida por ter uma voz alta e muitas vezes chata, nunca se imaginou com um timbre tão calmo e sereno. Melissa abriu os olhos verdes e encarou os olhos verdes da outra – Eu amo você – Kally falou e em troca recebeu o abraço mais gostoso de sua vida.

Melissa procurou Rachel com os olhos e a viu alheia em pé.

- Vem, mãe. Quero um abraço de aniversario triplo – Melissa pediu animada e Rachel se viu incapaz de andar, tudo aquilo era muito para digerir, a situação que já era ruim tinha piorado de forma exponencial.

Kally não sabia se Rachel iria matar ela de forma cruel ou rápida, sua única certeza é que ela seria morta pela outra, mas como não entrar naquele teatro? Como dizer para menina que tudo aquilo era um enorme mal entendido? Que sua mãe de fato havia lhe abandonado e nunca mais voltaria.

Kally estendeu sua mão, ela não estava muito longe de Rachel então conseguiu se esticar o suficiente para puxar a outra e a fazer andar ate elas. O sonho de Melissa finalmente tinha sido realizado, ela tinha as duas mães lhe abraçando ao mesmo tempo.

- Eu estou tão feliz – A menina declarou saindo do abraço e beijando docemente a bochecha de cada uma delas.

Seu corpo lhe mandou correr para o banheiro, afinal ela tinha se levantado da cama e ido direto ao quarto da mãe – Eu preciso ir ao banheiro – Foi tudo que a criança disse antes de pular da cama direto para o chão e correr porta a fora do quarto indo embora e deixando as duas mulheres adultas sozinhas no cômodo.

Mãe de mentirinhaOnde histórias criam vida. Descubra agora