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POv Marília

"A política é quase tão excitante como a guerra e não menos perigosa. Na guerra a pessoa só pode ser morta uma vez, mas na política diversas vezes..."

Ver a maiara chorando daquele jeito no meu colo me quebrou mas eu sabia que aquilo iria acontecer, ninguém chega no Iraque e sai ileso nos primeiros dias ainda mais uma pessoa como a maiara, eu estava sabendo dos riscos e do que eu teria que fazer quando cheguei aqui, mesmo assim foi difícil entende e engolir minhas próprias ações, era uma guerra eu sabia mas mesmo assim era difícil de entender muitas vezes.

Já a maiara nunca quis estar aqui e ela sempre teve um pensamento muito firme do que era certo ou errado nessa guerra, ela tinha mudado um pouco com a morte do irmão querendo vingança, mesmo assim ela ainda era maiara, a maiara que eu conheci nos primeiros dias naquela base que desafiou a sala inteira falando sobre o que queria fazer no exercito, matar um adolescente de no máxima 16 anos não estava dentro desses pensamentos.

Depois que ela parou de chorar tomou banho, naquela noite eu reparei que ela não dormiu e na noite seguinte dormiu muito pouco, ela ainda estava digerindo o que tinha feito, eu sabia que ela ainda iria levar um tempo e talvez nunca consiga de fato superar, como eu também não consegui superar a mãe com a criança no colo que vez ou outra eu escuto chorando na minha cabeça.

Estávamos formando raízes em Kut, já estávamos ali a uma semana o batalhão se encontrou e no centro da cidade pegamos literalmente um dos prédios que ficou em melhor estado e fizemos como se fosse nossa base, passamos arrames farpados ao redor, colocamos nossa bandeira no alto do prédio de 5 andares, deixamos nossos carros blindados na frente, fazíamos rondas pela cidade, as pessoas já estavam começando a se acostumar com a nossa presença ali, a vida parecia que estava começando a fluir aos poucos, as pessoas estavam começando a reconstruir o que foi destruído, as lojas estavam voltando a abrir.

Eu estava fazendo uma patrulha com mais 10 soldados, o sol estava no alto e eu sentia o suor escorrer pela minha testa, paramos em uma vendinha pequena onde a dona estava varrendo a sujeira de concreto e poeira da calçada, estávamos precisando de água, paramos na frente do pequeno mercadinho fazendo ela parar de fazer o que fazia, ela nos olhou, já era uma senhora devia ter uns 60 anos.

- Nahn nurid ma - falei pra ela que me encarrou ( nós queremos água)

Eu tinha aprendido a falar algumas coisas em Árabe, ela me olhava com um olhar acusador e eu entendia ela. Coloquei a mão no meu bolso tirando algumas notas de dólares, sabia que era mais do que o iriamos beber mas não importava.

- La 'urid 'ajanib huna - ela disse entrando dentro da loja.

- O que ela disse? - perguntou Ally curiosa ao meu lado.

- Ela não quer a gente aqui - falei frustrada.

- Podemos entrar e pegar - disse um dos soldados, estreitei os olhos pra ele que abaixou a cabeça na hora.

- Eles são civis e merecem respeito, se não querem não vamos invadir nem nada do tipo - falei pra ele que assentiu.

Vi a maiara no fundo vendo tudo em silêncio, nos últimos dias ela estava muito assim quase não falava nada, eu ainda não tive nenhum tempo com ela sozinha para conversar direito e eu estava morrendo de saudades dela.

- Acho que ela mudou de ideia - disse Ally, virei para olhar um rapaz que trouxe 10 garrafas de água em uma cestinha.

Ele olhou pra gente colocando no chão, seu olhar era meio assustado, ele devia ter uns 17 anos, se vestia com as roupas típicas do país que era um vestido que se chama jelaba todo branco e um pequeno bigode, sua pele era dourada do sol.

BATALHÃO 27 Onde histórias criam vida. Descubra agora