Jantar

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“Já faz um tempo, pessoal! O que você quer, Dylan?"

A lanchonete estava bem iluminada, mas ao mesmo tempo escura. Os limites da visão de Anessa estavam embaçados, os olhos lutando para focar no cardápio à sua frente.  

“Vou querer um sanduíche de mortadela frita como sempre!”

“Tudo bem então, Ranger, e você, Ranger Milch?”

Anessa mal notou a mulher conversando com ela. Olhos cansados ​​reviraram-se, olhando fixamente. Era Grace – uma senhora de 65 anos com cabelos brancos e uma roupa passada para combinar. Sua pele estava flácida e envelhecida, mas sob o pescoço havia uma cor mais viva. Carne rosada e uma veia pulsante sob a pele drapeada e coriácea. 

“babycake?”

Ela sempre chamava Anessa assim. Como num estalar de dedos, Anessa acordou. “Eu quero o mesmo, Grace,” ela sorriu, mas era menor do que o normal. Menor e sem muita vida. 

“Tudo bem então,” a senhora mais velha sorriu, mas relutantemente se afasta. 

Anessa ficou com Dylan, que a olhou com grande preocupação. 

“Você está bem, Ness?”

Ela só conseguia pensar em Jack.  Seu toque queimava buracos nela. A frieza à qual ela se agarrava — a frieza que a mantinha calma e serena — estava vazando através daquelas crateras abertas em sua psique. Anessa parecia sem vida. Vazio de emoção. Seus olhos estavam encobertos como os de uma boneca, e quando ela revirou as íris para olhar para a amiga, encontrou uma expressão preocupada. 

"Jesus Cristo. Você parece uma merda".

"…sim?" ela bebe um gole de água, um sorriso pequeno, mas genuíno, brincando em seus lábios secos. "Isso é ruim, hein?"

"Sim. Você não dormiu? Parece que você não fecha os olhos há dias. Você não parecia assim ontem. O que aconteceu?" Dylan estava mastigando alguma coisa. Provavelmente o pão que Grace trouxe. Anessa só pôde dar de ombros: “Eu fiz. Provavelmente é por isso que me sinto uma merda. Eu odeio acordar tarde."

Essa desculpa parecia boa o suficiente, porque Dylan assentiu em resposta. Ele era um cara fácil de convencer e, visto que não gostava de bisbilhotar uma garota, deve ter presumido que era algo feminino. Como se talvez ela estivesse menstruada ou talvez seus hormônios estivessem em frangalhos.

Provavelmente eram.

A sensação de tremor entre suas coxas nunca cessou desde que ela saiu de casa. Um desejo apertado estava dentro dela – um desejo de ser preenchida e de ser libertada. Anessa estava com tesão, mas a aura melancólica que pairava sobre ela fazia parecer que ela estava longe de querer gozar. Dylan estava balbuciando agora, falando sobre trabalho. Como Mitch teve que perseguir um sem-teto por todo o parque e como isso foi hilário. Tudo caiu em ouvidos surdos, mas Anessa não fez contato visual. Ela queria parecer atenta, controlada, mesmo que não estivesse. 

Se ele tocar em você, eu o matarei. E farei você comer o cadáver dele.

“Não acredito que Mitch ainda possa fugir...” Anessa conseguiu fazer um comentário aqui ou ali. Incapaz de ignorar a sensação persistente dentro dela, ela esconde seu desconforto com a exaustão. Dylan ri alto como um urso antes de continuar com suas histórias.

Carne crua (Eyeless Jack)Onde histórias criam vida. Descubra agora