doprê recolocou os fones, lançou a bola no ar e voltou a jogar. Ele precisava muito de aulas de etiqueta. Eu me virei para ir embora, mas ele me deteve de novo.— Ei, quer conhecer minha mãe? Ela fica desesperada querendo a companhia de americanos.
— Não, obrigada. Preciso voltar logo e encontrar Howard. Ele vai me levar para jantar em Florença.
— A que horas?
— Não sei.
— A maioria dos restaurantes não abre antes das sete. Prometo que não vamos demorar muito. Eu me virei para o cemitério, mas a ideia de encarar Howard e o diário me fez estremecer. — É longe?
— Não, é bem ali. — Ele apontou vagamente para um amontoado de árvores. — Vai ser legal. E juro que não sou um serial killer.
Fiz uma careta.— Eu não estava achando nada disso. Até você falar.
— Sou magro demais para ser um serial killer. E odeio sangue.
— Eca.
Voltei a olhar para o cemitério, avaliando minhas opções. Ler um diário emocionalmente desafiador? Visitar a mãe de um potencial serial killer sem o menor traquejo social? As duas eram horríveis.
— Tudo bem, vamos.
— Legal.
doprê colocou a bola de futebol debaixo do braço e fomos para o outro lado da colina. Ele era mais alto que eu, e andávamos rápido.
— Quando foi mesmo que você chegou?
— Ontem à noite.
— Então deve estar quase morrendo com o jet lag, não é?
— Na verdade, eu dormi bem ontem, mas, sim. Parece que estou embaixo d'água. Sem falar na dor de cabeça, que deve ser a pior da minha vida.
— Espera só até hoje à noite. A segunda noite é sempre pior. Lá pelas três da manhã você vai estar totalmente acordada e vai ter que inventar alguma coisa estranha pra fazer. Uma vez, eu subi numa árvore.
— Por quê?
— Meu laptop estava quebrado e eu só conseguia pensar em jogar paciência, mas sou horrível nesse jogo.
— Eu jogo paciência muito bem.
— Eu subo em árvores muito bem, mas não acredito em você. Só é bom em paciência quem rouba.
— Não, eu sou boa sem roubar. As pessoas pararam de jogar cartas comigo quando eu estava no segundo ano, então aprendi a jogar paciência. Num dia bom, consigo terminar o jogo em uns seis minutos.
— Por que as pessoas pararam de jogar com você?
— Porque eu sempre ganhava.
Ele parou de andar, abrindo um grande sorriso.— Quer dizer que você é muito competitiva?
— Eu não falei isso. Só disse que sempre ganho.
— Aham. Então você não joga nada desde os sete anos?
— Só Paciência.
— Nada de buraco? Uno? Pôquer?
— Nada.
— Interessante. Olha, aquela lá é minha casa. Aposto corrida com você até o portão. E começou a correr.
— Ei! — Saí atrás dele, aumentando o passo até alcançá-lo e ultrapassá- lo, e não diminuí a velocidade até chegar ao portão. Eu me virei, triunfante.
— Ganhei!
Ele estava parado a alguns metros de mim, ainda com aquele sorriso idiota no rosto.