Prólogo

50 7 0
                                    

— A senhora disse o quê? — pergunto incrédula. Rapidamente, aperto o botão de "pausa" no controle da televisão para parar minha novela. Apesar de ter assistido a mesma novela turca mais de três vezes, não quero perder a reconciliação do casal principal. Uma reconciliação que só acontece depois que os personagens percebem que estão sendo dois cabeças-duras, fugindo do assunto que tinham pendente.

Por que personagens nunca percebem que às vezes basta uma conversa para as coisas serem resolvidas? Que alguns medos são como aquela música da Maiara e Maraísa, apenas um "medo bobo", fruto da imaginação deles? Hum... porque se nada disso acontecesse, não teríamos enredo e a história acabaria na primeira adversidade, pois logo o conflito seria resolvido. A jornada do herói e tudo mais.

— A Carmen não parava de falar que a Larissa está de namorado novo, que já estão pensando em casamento, casa própria e não sei o quê — enquanto fala, minha mãe balança o celular —, isso tudo sendo mais nova que você. Palavras da sua tia, não minhas — acrescenta, referindo-se à última frase. — Ela teve coragem de dizer que você ainda está na barra da minha saia, acredita? Como não sou obrigada a escutar nada calada, eu disse que você também está de namorado novo, que tem grandes planos e que só não contou para a família ainda.

Fico em silêncio, boquiaberta, encarando minha mãe. Grandes planos? O único grande plano que tenho agora é assistir o meu casal preferido da televisão se reconciliar.

— Mãe! — é o que consigo dizer num tom indignado, quase rindo de nervoso. — A senhora simplesmente decidiu mentir? — pergunto.

— Bom... sim — mamãe responde inocente.

Arqueio as sobrancelhas, surpresa por sua sinceridade.

Dona Cida falar para a tia Carmen que estou namorando é o menor dos meus problemas. Eu mal vou à cidade, então é fácil fingir que não é comigo. O problema é ela dizer isso faltando duas semanas para o casamento da minha prima Jéssica, a filha mais velha da tia Carmen. Principalmente quando serei uma das damas de honra. É óbvio que terei que aparecer com alguém no casamento ou, no mínimo, inventar uma desculpa muito boa para o meu namorado inexistente não aparecer na festa.

— Tudo bem. — Respiro fundo. — Eu invento uma desculpa qualquer para a família. Posso dizer que o invisível não pôde comparecer ao casamento, ou que terminamos. Não se preocupe — falo, balançando a cabeça, decidida a esquecer a história e voltar para a minha novela.

— Só tem um probleminha. — Mamãe torce a barra da camiseta, sem coragem de me olhar nos olhos. — Eu... — ela exita por um segundo — eu disse que você e o Andrei estão namorando.

— A senhora disse o quê? — repito minha primeira pergunta, dando um pulo do sofá, esquecendo a novela por completo. — O Andrei? — Meu coração começa a bater acelerado, descompassado, ameaçando sair pela boca. — Eu e Andrei terminamos faz oito anos!

— Ah, me desculpa, filhinha. — Minha mãe me puxa pela mão, fazendo-me sentar novamente, só que junto dela. — Não queria te colocar em maus lençóis, mas sua tia não me deu alternativa. Ela ficava falando, falando e falando e eu não consegui me conter.

Encaro minha mãe, sem saber o que dizer. Meus pensamentos não são capazes de formular uma frase coerente. Como não digo nada, mamãe continua seu monólogo:

— É fácil fazer as coisas acontecerem. O Andrei é um bom rapaz, está solteiro, tenho certeza que vai entender o desespero de uma mãe. Além do mais, ele conhece a família inteira, vai estar no casamento, cresceu com você e com a Jéssica, vocês trabalham na mesma empresa... — Ela enumera tudo nos dedos, quase sem fôlego. — Sabe como tudo funciona. Eu vou ligar para ele e vamos resolver essa situação! — Ela finaliza empolgada, desbloqueando a tela do celular.

— Não! — digo desesperada, levantando do sofá. Por instinto, pego o aparelho de sua mão e coloco longe dela.

Massageio as têmporas, tentando pensar no que fazer. Se mamãe não tivesse dado nome aos bois, eu fingiria um término qualquer e seguiria a minha vida, mas não é assim que as coisas funcionam. Uma hora dessas a família inteira sabe do meu suposto namoro.

Contenho um grunhido.

— Não fique brava comigo! Quando você for mãe, vai entender o desespero de uma — ela diz séria, quase me dando uma bronca.

— Mas a senhora não precisava ter dito isso — apesar de tudo, falo com calma, respirando fundo. — Na verdade, a senhora não deveria ter dito nada, deixasse a tia Carmen falar sem parar.

— E deixar você por baixo? Nunca! Nunquinha! — Ela aponta o dedo indicador para cima. — Sua tia gosta de me atacar.

Tento não revirar os olhos. A competição entre as duas irmãs — as quais são gêmeas, a propósito — vem desde que me entendo por gente. Por sorte, essa disputa não afetou a minha relação com as minhas primas Jéssica e Larissa. Pelo contrário, achamos tudo uma grande besteira e palco para algumas risadas.

— Vou tentar resolver o problema. — Não é a primeira vez que caio de paraquedas em uma situação orquestrada por mamãe. No ensino médio, a maioria das coisas eu tinha que fazer escondida, pois conhecia a mãe que tinha. Ou melhor, conheço a mãe que tenho. E é mais fácil eu resolver o problema do que deixar nas mãos dela, porque ela pode piorar ainda mais a situação.

— Tem certeza? Não quer ajuda? — minha mãe questiona. — A culpa é minha e eu posso ajudar a resolver. — Seus olhos ostentam um pedido de desculpas.

— Não. — Balanço a cabeça. — Deixa que eu resolvo. Só fique longe do telefone ou de alguma pergunta dos nossos parentes, está bem? — instruo. — Não quero que a situação vire uma bola de neve, e a senhora sabe como é a nossa família.

— Ah, Donna, desculpa. — Mamãe me abraça. — Eu só quero o seu bem e não aceito ninguém falando mal de você para mim.

— Eu sei — digo. Apesar de tudo, ela sempre quer o meu bem. E, por isso, não consigo ficar brava com ela, nem mesmo quando outra pessoa é colocada na história e sou eu quem dará as devidas explicações.

— Confie em mim, querida. Dará tudo certo.

Duvido.

Minha mãe me solta do abraço, dá um beijo em minha testa e sai da sala.

Assim que fico sozinha, encaro a tela da televisão congelada nos meus personagens preferidos, pensando no que devo fazer.

Donna & DreiOnde histórias criam vida. Descubra agora