Capítulo 1

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Após receber a notícia de mamãe, fiquei estagnada no lugar por uns bons vinte minutos, encarando a tela da televisão sem saber o que fazer. Inventar que reatei com o namorado da minha adolescência, com quem trabalho na mesma empresa cinco dias na semana, oito horas por dia, é passar completamente de todos os limites existentes. Entretanto, é a minha mãe. Sempre que ela me coloca em uma furada, eu tento sair.

Assim que volto a raciocinar direito, ligo para Samantha, minha melhor amiga, e combinamos de nos encontrar no trailer do Marcão. Por ser seu dia de folga do hospital, ela aceita o convite na hora.

O Marcão, ou o trailer do Marcão, tem o melhor pastel do bairro e fica estacionado numa distância de quinze minutos de casa. Troco de roupa rapidamente, colocando um short jeans e uma camiseta branca, calço um par de Havaianas coloridas e vou a pé para o local. Como caminho em uma avenida até o lugar, não tenho a sensação de que se passaram quinze minutos. Assim que viro a esquina, Samantha está me esperando.

Passamos no balcão para fazer nossos pedidos, optando pelos mesmos pastéis de sempre, e vamos para a nossa mesa, a que fica num local mais escondido, onde as pessoas só nos reconhecerão se chegarem perto de nós.

— Você não faz ideia do que minha mãe fez — falo, puxando a cadeira para me sentar.

Então, conto para Samantha os últimos acontecimentos da minha vida, relatando a mentira que dona Maria Aparecida inventou para a irmã.

— Sua mãe fez o quê? — Minha melhor amiga começa a rir, como se eu não estivesse à sua frente.

— Você está rindo porque não é com você — resmungo.

— De todas as enrascadas que a dona Maria já te colocou, definitivamente, essa é a pior. — Sammy continua rindo. — Isso que dá estar solteira.

— Está falando de mim ou de você? — questiono, estreitando os olhos.

Touché. — Ela para de rir.

— Em nossa defesa, é perfeitamente aceitável estar solteira aos 27 anos. Por favor, não estamos no século 19. — Faço um gesto com a mão.

— Ah, mas acho que sua mãe passou um pouquinho dos limites. — Samantha volta a rir.

— Um pouquinho? Ela ultrapassou todos os limites possíveis. Mas você acha que tem como ficar brava com ela?

— É claro que não. Primeiro, ela é sua mãe e, segundo, você está acostumada com os problemas que ela arruma. — Sammy enumera nos dedos.

Minha amizade com Samantha nasceu no ensino fundamental, quando ela mudou de escola por ter sido expulsa da última em que estudou. Foi amizade instantânea, daquelas que você olha para a pessoa e pensa: "essa garota será a minha melhor amiga". Desde que nos conhecemos, não nos desgrudamos, e a maioria das encrencas em que ela não se meteu, foi graças a mim, que controlava a fera.

Antes que eu possa continuar a conversa, nosso pedido com a coca-cola gelada chega. Agradecemos ao atendente e Samantha volta ao assunto principal.

— E o que você vai fazer? — pergunta, pois ela sabe que sou eu quem resolve as situações.

E é no "fazer" que mora o problema. Enquanto caminhava para encontrar minha amiga, algumas ideias vieram a minha cabeça, e a que considero a melhor opção é a que não quero executar.

Fico em silêncio.

— Maria Donnatela, o que você pensou? — Sammy estreita os olhos, colocando uma mecha de seu cabelo atrás da orelha. Ao contrário dos meus cabelos pretos e lisos que estão soltos, os seus cachos estão presos no alto da cabeça. Seus olhos castanhos esverdeados exibem um delineado colorido, em tons de roxo que chamam atenção.

Donna & DreiOnde histórias criam vida. Descubra agora