𝘊𝘰𝘮𝘰 𝘦𝘶 𝘦𝘳𝘢 𝘢𝘯𝘵𝘦𝘴 𝘥𝘦 𝘷𝘰𝘤𝘦̂ a última carta de amor

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Minha voz cortou o silêncio. As palavras ficaram ali, no ar, esmorecendo na pequena cozinha por muito tempo após o som ter sumido.
- Você o quê?
- Frank vai fechar o café. Amanhã. - Estendi a mão com o envelope meio molhado que, em estado de choque, eu havia apertado ao longo de todo o trajeto para casa. Todos os cento e oitenta passos desde o ponto de ônibus. — Ele pagou os três meses do seguro.
***
O dia tinha começado como outro qualquer. Todo mundo que eu conhecia detestava manhãs de segunda-feira, mas eu nunca me incomodei. Gostava de chegar cedo ao The Buttered Bun, ligar a enorme máquina de chá, trazer os caixotes de leite e pão do depósito e conversar com Frank enquanto nos preparávamos para abrir.
Gostava do calor abafado com aroma de bacon que havia no café, das pequenas rajadas de ar frio quando a porta se abria e se fechava, do murmúrio das conversas e, quando estava tudo calmo, do rádio de Frank tocando baixinho no canto. Não era um lugar moderninho, as paredes eram cobertas de fotos do castelo da colina, as mesas ainda ostentavam tampos de fórmica e o cardápio era o mesmo desde que comecei lá, exceto por algumas mudanças nos tipos de chocolate servidos no balcão e pela inclusão de brownies e bolinhos de chocolate na bandeja de bolos gelados.
Mas, acima de tudo, eu gostava dos clientes. Gostava de Kev e de Angelo, os encanadores que vinham quase todas as manhãs e brincavam com Frank perguntando de onde vinha a carne que ele servia. Gostava da Sra. Dente-de-leão, apelidada assim por causa da cabeleira branca, que comia ovo com fritas de segunda a quinta-feira e se sentava para ler os jornais de distribuição gratuita, bebendo duas xícaras inteiras de chá de um jeito único. Sempre me esforçava para

conversar com ela. Desconfiava de que fosse a única conversa que a velhinha tinha durante todo o dia.
Gostava dos turistas, que paravam em seu caminho, indo e vindo do castelo; das crianças agitadas do colégio que davam uma passada lá depois das aulas; dos habitués dos escritórios que ficavam do outro lado da rua; e de Nina e Cherie, as cabeleireiras que sabiam quantas calorias tinha cada produto que oferecíamos em The Buttered Bun. Nem os clientes chatos, como a mulher ruiva, que gerenciava a loja de brinquedos e reclamava do troco pelo menos uma vez por semana, me incomodavam.
Testemunhei o início e o fim de relacionamentos naquelas mesas; pais divorciados entregando e recebendo os filhos de seus ex-cônjuges; o alívio culpado dos que não suportavam cozinhar e o prazer secreto dos aposentados diante de um café da manhã com frituras. Todo tipo de pessoa frequentava aquele lugar e a maioria partilhava algumas palavras comigo, fazendo piadas e comentários por cima das canecas de chá fumegantes. Papai sempre dizia que jamais sabia o que sairia da minha boca, mas lá no café isso não importava.
Frank gostava de mim. Era calado por natureza e dizia que eu animava o lugar. Para mim, era como ser garçonete de bar, mas sem a chatice dos bêbados.
Até que, naquela tarde, depois que o movimento do almoço terminou e o café ficou vazio por um breve período, Frank, limpando as mãos no avental, saiu de trás da chapa do fogão e virou a pequena placa de Fechado para a rua.
- Ai, ai, Frank, eu já disse a você. O salário-mínimo não inclui horas-extra. - Frank era, como dizia papai, esquisito como um gnu azul. Olhei para ele.
Ele não estava sorrindo.
- Oh-oh. Não coloquei de novo sal no pote de açúcar, coloquei?
Ele estava torcendo um pano de prato com as duas mãos e eu nunca o vira mais desconfortável. Supus, num lampejo, que alguém tivesse reclamado de mim. Então ele fez sinal para eu me sentar.

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