𝘊𝘰𝘮𝘰 𝘦𝘶 𝘦𝘳𝘢 𝘢𝘯𝘵𝘦𝘴 𝘥𝘦 𝘷𝘰𝘤𝘦̂ a última carta de amor

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- Venha correr comigo - disse ele, ofegante, ao se aproximar. Sua respiração formava nuvens claras. - Faltam quatro voltas.
Relutei por um instante e então comecei a correr ao seu lado. Era o único jeito de conseguir ter qualquer tipo de conversa com ele. Eu estava com meus tênis rosa com cadarços turquesa, o único sapato com o qual eu conseguia correr.
Tinha passado o dia em casa, tentando ser útil. Acho que isso aconteceu uma hora antes de eu começar a perturbar minha mãe. Ela e vovô tinham sua rotina e minha presença atrapalhava os dois. Papai estava dormindo, já que havia passado para o turno da noite naquele mês, e não podia ser incomodado. Arrumei meu quarto, depois me sentei e assisti à TV em volume baixo e, algumas vezes, quando me lembrava por que eu estava em casa no meio do dia, sentia uma leve dor no peito.
— Não estava esperando por você.
— Eu me cansei de ficar em casa. Pensei que talvez pudéssemos fazer alguma coisa.
Ele me olhou de soslaio. Seu rosto tinha uma leve camada de suor.
— Quanto antes você arrumar outro emprego, querida, melhor.
— Eu perdi meu emprego há apenas vinte e quatro horas. Será que eu posso me sentir um pouco infeliz e desanimada? Sabe, só por hoje?
— Você precisa ver o lado bom. Você sabia que não poderia ficar naquele emprego para sempre. Precisa seguir em frente.
Dois anos antes, Patrick tinha sido eleito o Jovem Empreendedor do Ano de Stortfold e ainda não tinha se recuperado bem da fama. Ele até havia conseguido um sócio, Ginger Pete, com quem montou uma empresa que oferecia formação pessoal para clientes num raio de duzentos metros e contava com dois furgões financiados. Também tinha um quadro branco no escritório onde ele gostava de rabiscar, com grossos marcadores pretos, a projeção que fazia para o volume de seus negócios, escrevendo e reescrevendo os números até corresponderem a suas expectativas. Nunca tive muita certeza de que os números tivessem alguma ligação com a realidade.
- Lou, perder o emprego pode mudar a vida de uma pessoa. - Ele deu uma olhada no relógio, conferindo o tempo que fizera naquela volta. - O que você quer fazer? Podia estudar. Tenho certeza de que o mercado valoriza gente como você.
— Gente como eu?
- Sim, que busca uma nova oportunidade. O que você quer ser?
Poderia ser esteticista. É bonita o bastante.
Fez um sinal para mim enquanto corria, como se eu devesse agradecer o elogio.
- Você conhece minha rotina de beleza. Água, sabão e um saco de papel enfiado na cabeça.
Patrick começava a parecer exasperado.
E eu, a ficar para trás. Detesto correr. E detestei-o por não ir mais
devagar.
- Pense... lojista. Secretária. Corretora de imóveis. Sei lá... deve ter alguma coisa que você queira fazer.
Mas não tinha. Eu gostava de trabalhar no café. Gostava de saber tudo o que era possível saber a respeito do The Buttered Bun e de escutar sobre a vida das pessoas que frequentavam o lugar. Eu me sentia bem lá.
- Não pode ficar infeliz, querida. Você precisa superar isso. Todos os melhores empreendedores lutaram para se reerguer dos piores infortúnios. Jeffrey Archer fez isso. Richard Branson também. - Ele deu uma batidinha no meu braço, tentando me animar.
- Duvido que Jeffrey Archer algum dia tenha perdido seu emprego de esquentar bolinhos para o chá. — Perdi o fôlego. E estava com o sutiã errado. Desacelerei, baixei as mãos e as apoiei nos joelhos.
Ele se virou e voltou, a voz agitando o ar parado e frio.
- Mas se ele tivesse... estou só falando. Pense melhor, ponha uma roupa bonita e vá ao Centro de Trabalho. Ou posso treinar você para
Maletal trabalhar comigo, se quiser. Você sabe que isso dá dinheiro. E não se preocupe com a viagem. Eu pago.
Sorri para ele.
Ele me jogou um beijo e sua voz. ecoou pelo ginásio vazio.
— Você pode me pagar quando voltar a trabalhar.

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