A invasora

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A mãe de Bárbara sempre sonhou em ser vizinha de sua melhor amiga. As duas planejavam tudo juntas desde que se conheceram no ensino médio e mesmo depois de um tempo separadas durante a faculdade a conexão não mudou nada.

Ambas se casaram com seus pares ideais, mas seus maridos estavam cientes que as melhores amigas eram almas gêmeas. Todos sabiam disso.

Elas compraram casas em um bairro de referência na cidade, uma de frente para a outra. Se encontravam no mínimo duas vezes na semana para tomar café depois de recém casadas, todos os dias depois que engravidaram com poucos meses de diferença e a cada quinze dias depois que o trabalho começou a ficar puxado e as meninas foram crescendo.

Ficou difícil manter a rotina depois da vida adulta, mas elas continuavam muito amigas e não planejavam se separar nunca. Era como se estivessem ligadas para sempre, e desejavam que suas filhas tivessem a mesma amizade bonita que as mães tinham. Seria perfeito.

Mas quanto mais as meninas cresciam mais fácil era para perceber que elas eram muito diferentes. As mães observavam as interações entre as duas e não forçavam a amizade por mais que estivessem decepcionadas.

Elas passaram de bebês "quase gêmeas", para amigas, para colegas de classe, para conhecidas e depois quase não se falavam.

Mas era difícil ignorar Mariana quando ela estudava na mesma sala de aula que Bárbara e a janela de seu quarto era de frente pra da outra garota.

Elas se viam sempre.

De longe era possível reconhecer somente a silhueta da outra menina, e Bárbara tinha se acostumado com aquilo. Nunca chegou a ficar incomodada de verdade até aquela noite.

Depois do mal entendido na floricultura, Bárbara trabalhou no automático. Ela só conseguia pensar em sua vizinha e em como tudo tinha dado errado pela segunda vez.

Podia jurar que Mariana estava correspondendo aos flertes, mas em questão de segundos tudo foi por água abaixo.

Ela não conseguia entender. Não querendo ser esnobe ou algo assim, mas Bárbara nunca foi rejeitada por ninguém. As meninas, mesmo as que se diziam hétero, queriam sua atenção e os meninos corriam atrás da garota que mal se importava.

Ela tinha sua auto estima alta, nunca se achou feia. Gostava dos cabelos cumpridos e escuros, da franja que tinha feito no ultimo ano, da sua altura, da cor dos seus olhos, do seu nariz furado dos dois lados, da sua boca...

Ela poderia ficar chateada e até duvidar da sua beleza depois do que aconteceu naquele dia, mas na verdade ela ficou irada. Queria uma explicação clara para ter certeza de que não estava alucinando quando Mariana chegou mais perto dela enquanto conversavam na floricultura ou quando viu a menina fissurada em seus lábios.

Bárbara pensou nisso enquanto tomava banho, enquanto escolhia uma roupa para sair, enquanto se maquiava e até mesmo na casa de seu amigo enquanto bebia cerveja.

Ela se distraiu, claro. Foi legal passar a noite com o pessoal e encher a cara como sempre fazia, mas uma voz no fundo se sua cabeça insistia para ela tirar satisfação com a menina.

"Você é maluca? Eu sei que você quis me beijar sim!"

Era isso que ela iria dizer.

E quando chegou em casa pensou que a melhor ideia não seria entrar e resolver isso no dia seguinte. E sim dar meia volta e bater na porta da menina.

Era por volta das quatro da manhã quando ela atravessou a rua silenciosa e bateu na porta de Mariana. Ela analisou sua roupa e chegou a conclusão que estava sim apresentável.

Os dois lados da rua (Conto lésbico) Onde histórias criam vida. Descubra agora