As Peripécias de Um Deus I: Temido

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| Ayato Sakamaki |

Três anciãos e um retrato adentraram à sala de aula de Ayato.

Era a terceira vez essa semana, porém a sua pequena turma de seres terrenos continuava a receber aquelas chegadas "atípicas" como se, dentro de seus corações, houvesse uma criança fardada a redescobrir o que era a morte. De repente a atmosfera daquele lugar ficou tão piegas que lhe bateu um soninho bom. Enquanto a professora não chegasse, seria mais uma dessas mesmas palestrinhas de prestamento de falsas condolências de sempre. Por que daria ouvidos? Lá então da ponta onde se encontrava uma enorme janela que exibia as cores frias do anoitecer, já sentado dentre as últimas carteiras, o Sakamaki bocejou descaradamente e aproveitou-se para tirar um cochilo em seus próprios braços.

Por mais que a sua mente se situasse no limiar entre os mundos da realidade e do sonho, via-se incapaz de cruzar por este tão desejado, impedindo-o de adormecer completamente. O silêncio nunca pareceu tão barulhento na audição sobre-humana do vampiro quanto naquele presente.

Ele não era o único desinteressado no monólogo funéreo que estava por vir.

O discurso de um dos velhos mais importantes do campus saía abafado por outros sons que o vampiro preferia dar de sua atenção, podendo ouvir desde os rabiscos apressados de um lápis contra uma folha de caderno vindos da mesa da parede oposta - devia estar desenhando, supôs - ao estalo frenético de botões de um joystick de console portátil sob a animada trilha sonora de pac-man a algumas fileiras a frente.

Humanos perdendo a humanidade... Que irônico, pensou.

Se não sentisse o cheiro de sangue corrente sob as veias daqueles mortais alheios, Ayato juraria que estava diante de criaturas da noite como ele. Insensíveis ao próximo. Um vampiro, no senso terreno, categorizava-se sendo um tipo de morto-vivo por simplesmente não ter uma alma, seja lá o que significasse... Gabavam-se tanto por ter uma, mas aparentava ser tão fácil de perdê-la. Afinal, o que seria de um homem sem ela? Um vivo-morto?

Um punhado desses fracotes desapareciam e morriam todos os dias, não ocorrendo necessariamente nessa ordem. A morte, desde sempre tão temida pelos os mesmos, tornou-se parte de suas rotinas. Devia ser desesperador... O que não aconteceu. Não para todos. Era um efeito revés que só tendia a se infestar entre os demais.

Aqueles tempos de carnificina epidêmica estavam tirando aos poucos a maior, e a única, graça daquelas bolsas de sangue ambulantes: sua natureza de se impressionar tão facilmente com o sobrenatural.

- ... É com muito pesar que diante dessa terrível tragédia, em respeito à memória que a senhorita Machiko construiu junto da instituição, trazendo anos de muita alegria e aprendizado aos nossos dias letivos, nós estamos agora suspendendo todas as aulas por uma semana. - dizia abatido o reitor da faculdade, rente a dois coordenadores que mantinham-se segurando a foto memorial sobre o birô.

Para um ser que odiava estudar, o seu cérebro já estava programado em captar qualquer coisa que fosse relacionado a hora do lanche, do lazer e da saída automaticamente. Entre tudo que o Sakamaki escutara por cima, apenas duas fraseszinhas serviram como um energético para que o despertasse em um sobressalto: "suspender aulas" e "uma semana".

Ayato olhou pelos arredores da sala, sentindo-se totalmente por fora, entretanto não tão menos intrigado, dos motivos que levaram àquela maravilhosa notícia. Muitos dos cintilantes olhares de seus colegas mortais, carregados de engraçada angústia e negação, iam somente para uma única direção que fora inevitável de seguir.

Pela primeira vez, o ruivo partilhou do mínimo de comoção ao se deparar com o rosto sorridente na fotografia da qual todos olhavam.

O Sakamaki via-se surpreso; confuso, para não ser tão humano.

Obliviate para Um Sonho - Diabolik LoversOnde histórias criam vida. Descubra agora