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Camila estava caída no chão quando a loba lhe encontrou, ambas estavam fracas demais para dizer uma palavra sequer e, com arrependimento a corroendo por inteiro após fugir como um animal amendrontado, a loba limpou suas lágrimas com a língua e choramingou até a garota a puxar para um abraço, sussurrando agradecimentos por estar viva.

A voz rouca de Camila a fazia arrepiar, sacudindo seus pelos todas as vezes que os dedos finos passavam perto do ferimento ou puxava seu pelo sem querer, ambas ficaram agarradas até a humana ter forças de levantar, de a fazer como guia até a cabana novamente. Ambas se arrastavam pela floresta, pelas árvores, pelas raízes, pela campina. Até chegar em seu lar. Nenhuma fez um som sequer, estavam destruídas demais para isso, cansadas demais, machucadas demais.

Camila a abraçou mais de uma fez, deixou beijos castos em sua cabeça e afagos atrás das enormes orelhas, mesmo quando a arrastou para o banheiro e não conseguiu conter as lágrimas, mesmo quando a loba resmungou e choramingou, tentou fugir e a arranhar quando tocou em seu ferimentos. Suas garras não a assustavam mais. Suas presas não a amedrontavam mais. Era um momento delicado demais para o medo vencer totalmente.

- Fique quietinha, saco de pulgas. Por favor. - sussurrou, a voz quebrada e chorosa. Os dedos ficavam presos nos nós causados pelo sangue duro e a água estava gelada demais para a loba parar quieta. Camila cogitou mais de uma vez cortar alguns nós ou ao menos envolta do ferimentos que, ao menos, a bala havia passado direito.

Não sabia como não havia percebido antes, o que a fez se sentir culpada, a bala havia pego próximo a perna e as costas, não sabia como o tiro tinha saído tão torto e como conseguia andar sem mancar tanto.

Demorou mais que o normal para limpar a loba, para tirar todo o barro e o sangue e, quando acabou, fez seu melhor para fazer um curativo decente, envolvendo uma faixa branca no tronco da loba, contornando a parte da frente e a de trás da perna com a faixa, como uma guia de passeio. Infelizmente, seu dinheiro havia acabado na feira e seus pais pagavam as contas para ela da cabana, seu pai insistia tanto para ajudá-la que acabou permitindo que este o fizesse e prometeu guardar o que ganhava dos quadros e o entregar, não era muito, nem o suficiente para cobrir os gastos da cabana em alguns meses como no inverno, mas era o que tinha.

A loba estava amuada demais e Camila conferiu mais de uma vez se os curativos não estavam apertando demais, se não estava sangrando como antes. Quando tentou a fazer comer, recebeu apenas um bufar e foi ignorada, quase a fazendo chorar e implorar para que comesse ao menos um pequeno pedaço de carne. A loba se arrastou até o ninho de cobertores e ficou lá, com Camila a encarando por horas a fio, a monitorando, ficando preocupada até quando sua respiração desregulava um pouco.

Quando as roupas voltaram a lhe incomodar com o cheiro desagradável e a sensação se sujeira quase a fez repunar novamente, Camila foi tomar um banho rápido, deixando a porta aberta para que caso a loba fizesse um som sequer, ela pudesse escutar. Seu banho foi apressado, mesmo esfregando seu estômago e mais mais de uma vez e, mal se secou, se enrolando na toalha e voltando para o quarto pingando água, olhando a loba.

Seus olhos voltaram a marejar enquanto vestia as roupas, sua cabeça parecia que iria explodir a qualquer momento. Ela não podia perdê-la. Não podia. De seus lábios começaram a escapar soluços baixos, aos quais não se importou de cobrir ou tentar abafar, deixou que a loba escutasse, que soubesse que Camila estava ali por ela, que se importava, que a queria bem.

- Vai ficar tudo bem, garota. - gaguejou, o tom amendrontado, trêmulo. A loba abriu os olhos, o pouco que conseguiu, e sacudiu o rabo de leve, curvando as orelhas quando Camila a deu um sorriso e afagou as mesmas.

Não se perdoaria se acontecesse algo, se a loba não conseguisse passar desta noite. O pouco tempo que passaram foi o suficiente, ao menos para Camila foi, ela havia ganhado uma companheira, uma besta sem senso de organização ou espaço, que deixava sua comida cheia de pêlos e a acordava de madrugada pulando sob seu corpo.

Camila passou a noite toda acordada, não pregou os olhos por nada, apenas monitorando a loba, torcendo para que melhorasse, rezando para que aguentasse. Não conseguia conter as lágrimas, as deixou cair a madrugada toda, assim como não conseguia tirar a mãos de seus pelos macios, a dando carinho e pedindo para que mantesse a calma quando soltava algum som.

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