Prólogo

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Setembro 02 - 2018
Holmes Chapel - Domingo

3:15 PM

Eu não estava animado para a faculdade de medicina. Eu sei que esse é o sonho do papai, mas não é exatamente o que quero. Eu sei que é uma tradição da família que vem seguindo de geração a geração, mas eu simplesmente não suporto a ideia de falhar... Só de pensar em estragar tudo já me dá nos nervos. Só de pensar em abrir alguém já me dá ânsia de vômito... Eu simplesmente não quero ir para a Queen Mary.

— Querido... — minha mãe grita do primeiro andar.

Entro no banheiro e me encaro no espelho! Eu estou tão gordo... Me pergunto se as pessoas vão rir de mim quando eu chegar em Londres. Eu não sou bonito como gostaria de ser — como Gemma ou a mamãe...

— Harry, o teu pai está esperando no carro... — grita novamente e eu reviro os olhos antes de sair do quarto. Pego meu casaco e me visto. Dizem que Londres é um lugar chuvoso e talvez esteja fazendo frio.

Desço as escadas com relutância e vejo minha mãe parada. Ela está com seu iPhone em mãos, concentrada em algo que não é da minha conta. Quando ela enfim percebe minha presença, ela guarda o mesmo na bolsa da Gucci... Somos uma família muito importante. O meu pai ganhou o prêmio de melhor neurocirurgião do ano e minha mãe é uma advogada renomada e eu... Bom, eu sou o tipo de filho mimado, que tem tudo de mão beijada e eu adoro ser mimado.

— Pronto, meu amor? Não se esqueceu de nada?

— Não, mamãe. Eu não estou levando tudo porque vou poder vir nas férias, né? 

— Claro. Então vamos! Teu pai já está nos esperando no carro.

— Está bem — suspiro.

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— Você gostou do apartamento, filho? — Des, pergunta, e eu sorrio. Eu amei... meu lado mimadinho estaria surtando se eu não estivesse tão focado em pessoas abertas. Eu estou tão assustado, mas não quero transparecer o meu pânico! Nem posso.

— É... É muito bonito, papai — vou para o centro da sala e coloco as mãos no bolso da calça jeans skinny. É um dúplex muito grande. Já fizemos o tour e aqui tem tudo que preciso para satisfazer meus caprichos. A sala é grande, com uma bela vista da cidade, assim como o quarto principal. Cada móvel é sofisticado e na sala tem até uma adega — obviamente sem bebidas — e uma cafeteira moderna.

O chão brilha que dá para ver meu reflexo, há uma planta perto da parede de vidro e o sofá é fofinho daqueles que vira cama, a TV é sessenta e cinco polegadas e perto do sofá há uma mesinha redonta feita de mármore e vidro. Há também uma mesa grande na sala. A cozinha é grande e tem uma bela visão da cidade também pelas paredes de vidro, os quartos são grandes o bastante, mas não tão grande como meu quarto. O apartamento é fantástico, mas minha cabeça está longe...

Corpos abertos e órgãos expostos...

— Tudo bem, querido? Você parece nervoso — minha mãe vem até mim e toca meu ombro. Eu definitivamente estou nervoso.

— Não estou nervoso. Estou apenas cansado.

— Certo. Vamos embora. Amanhã você tem seu primeiro dia na universidade e não queremos que você se atrase — meu pai diz e eu me seguro fortemente para não revirar os olhos. — Você se lembra de tudo que conversamos?

— Lembro sim, papai — suspiro.

— Certo. Não quero que você se distraia, então faça amizades com gente da nossa classe, não se misture com os bolsistas, o seu motorista estará aqui para te levar para a faculdade amanhã bem cedinho, a empregada virá de quinze em quinze dias para limpar tudo, os cartões de crédito estão liberados para você gastar com o necessário e não se esqueça de ir a igreja aos domingos. O pastor irá te receber. Eu pedi um quarto pra você no campus porque eu quero que você passe a semana lá, você precisa se instalar e conhecer bem a faculdade onde eu e todos da família estudamos. Nós fins de semana você pode ficar aqui, mas quero que você passe o primeiro ano lá.

— Tudo bem — suspiro pela milésima vez ao dia. Eu sei que não posso discordar de absolutamente nada. O meu pai me ensinou que jamais devemos levantar a voz para os mais velhos e principalmente para os nossos pais. O pastor da igreja de Holmes Chapel sempre disse essas coisas também sobre respeitar pai e mãe e eu sigo tudo ao pé da letra.

Eu não sou o tipo de cara que se envolve com essas coisas, nunca bebi álcool, nunca falei palavrão, nunca tive relações, nunca desrespeitei meus pais e eu tenho que ler a bíblia todos os dias antes de dormir, apesar que eu nunca li a bíblia completa em todos os meus dezessete anos de vida.

Sendo sincero, nunca gostei muito da leitura e se eu disser isso em voz alta, Des corta minha língua para fora, mas em compensação, sei todos os testamentos da Bíblia, sei dos pecados carnais e sei perfeitamente que posso ir para o inferno se não cumprir essas coisas... As vezes me pergunto se isso tudo é verdade... Será que realmente vou para o inferno se cometer um pecado?

— Meu amor, se cuide — minha mãe me envolve nos braços antes que eu possa pensar. Sorrio e devolvo o abraço, encostando meu queixo em seu ombro direito. — Saiba que eu te amo muito e eu vou ligar todos os dias para saber como você está.

— Tudo bem, mãe. Não precisa exagerar também — rio.

— Certo. Vamos, meu amor — Dona Anne puxa Des após ele me abraçar também. Desço com eles até a entrada e temos mais uma despedida dramática, da parte da minha mãe, que começa a chorar ao entrar no Audi.

Sorrio ao ver o carro saindo pela rua e volto para dentro. Pego o elevador que cai direto dentro da minha casa e respiro fundo ao perceber que estou sozinho. Eu nunca morei sozinho e confesso que isso me assusta um pouco, mas sei que não vou estar sozinho, até porque Olivia está aqui e eu senti muita falta dela. Não posso negar! Ela é uma boa namorada...

Começamos a namorar logo no início do ano quando o papai nos apresentou. Ela é cirurgiã geral... Sim! Olivia já é formada em medicina porque digamos que ela é um pouco mais madura do que eu. Ela tem vinte e sente anos e talvez possa parecer estranho eu me envolver com uma mulher que já esteja quase chegando na casa dos trinta, enquanto eu ainda nem fiz dezoito anos, mas o meu pai me garantiu que seria bom ter uma mulher mais madura ao meu lado, que possa me guiar tanto na vida profissional quanto nos caminhos de Deus. Ele disse isso e me lembro até hoje de tudo que ele me disse. Antes não gostava do Olivia, mas aprendi na igreja que devo amar a todos.

Me jogo no sofá e suspiro. Eu realmente já suspirei bastante hoje, mas agora esse suspiro é de alívio. Estou sozinho e talvez a faculdade não seja tão aterrorizante como eu penso. Talvez me apaixone no primeiro instante em que as aulas começarem... Eu tenho que curtir medicina.

É o meu futuro!

Como Desmond disse, tá na veia, tá no sangue da família a medicina e eu não sou uma exceção... Eu vou conseguir. Eu vou me formar em medicina, vou me casar com Olivia e vamos ter uma menina e um menino, assim com foi com meus pais, o garotinho vai ser médico como eu e como todos os homens da família e a nossa menina vai ser advogada como a minha mãe ou engenheira como Gemma.

Tá tudo planejado já. O meu pai já planejou e eu não tenho do que me queixar.

Always You • [L.S.]Onde histórias criam vida. Descubra agora