Capítulo 2

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A mão bate na mesa, a centímetros do meu rosto. De algum jeito, meus óculos foram parar em cima da minha cabeça. Os ajeito e limpo minha baba rapidamente antes que o agente veja.

── O-o quê? ── Pergunto desorientada.

── Doutora, a senhora dormiu outra vez no laboratório.

Jacques Beaumont tem olhos verdes penetrantes, cabelos escuros e bem cuidados que caem levemente sobre sua testa. Ele possui uma aparência atlética e uma expressão séria, que se suaviza quando ele sorri. Ao olhá-lo, reconheço imediatamente seu rosto e nome. Ele veste o icônico traje tático da S.H.I.E.L.D. A característica camisa escura, complementada pelo emblema proeminente da agência, destaca-se contra a silhueta atlética do agente. Calças táticas e botas resistentes conferem a ele a imagem de um profissional preparado para qualquer situação.

Jacques Beaumont, o agente francês de olhos verdes, pacientemente testemunha minha breve e inesperada demonstração de sono profundo, enquanto eu, inusitadamente, transformo meu laboratório em palco para uma apresentação involuntária de roncos e pequenas piscinas de baba. A situação, no mínimo, proporciona um toque cômico a esse momento peculiar. Aparentemente, o charme francês inclui a capacidade de manter a calma diante de situações pouco convencionais.

── Eu imagino que a senhora vá querer se recolher para seu quartel. Se quiser, posso acompanhá-la. ── Meu quartel na S.H.I.E.L.D é um espaço compacto, mas eficiente. Com tons neutros e uma cama organizada, o ambiente reflete minha abordagem prática. Um pequeno espaço de trabalho é delimitado por prateleiras repletas de livros e documentos, enquanto um armário guarda minhas roupas e outros pertences. Por não ser oficialmente um agente, não sou obrigada a usar o uniforme. Isso me permite manter meu estilo, um jeans confortável e uma camiseta solta. Afinal, quem disse que o conforto não pode andar lado a lado com a dedicação à ciência? A iluminação ajustável permite que eu adapte o ambiente conforme minhas necessidades. Embora não seja luxuoso, é um refúgio funcional, onde posso descansar entre as intensas sessões de pesquisa e ação.

── Agradeço, agente Jacques - expresso minha gratidão enquanto mantenho a porta do quartel levemente aberta.

Ele acena com um sorriso discreto, e eu fecho a porta do meu quartel. Aconchego-me na cadeira, rodeada por papéis e amostras. É aqui, entre experimentos e anotações, que meu mundo toma forma. O quartel pode não ser glamoroso, mas é o epicentro das minhas descobertas. Onde meu trabalho persiste, além do laboratório.

Mas hoje, minha única tarefa será dormir.

........

Nos dias que se sucedem, minha rotina se equilibra entre o laboratório diurno e as árduas sessões de treinamento noturnas. No reino do laboratório, entre microscópios, a substância Xenophyte e incontáveis horas de pesquisa, dou vida ao Projeto 101.

Quando a noite se instala, adentro o centro de treinamento, submetendo-me a exercícios físicos extenuantes que ameaçam me arrastar para a exaustão. Apesar dos gritos do meu corpo por descanso, persisto, nutrindo a determinação de estar pronta para enfrentar qualquer ameaça, mesmo que isso signifique encarar novamente a sombra da morte.

Com certeza, enfrentar a morte repetidas vezes em uma única noite serve como um alerta vívido sobre a importância de um treinamento abrangente, que não apenas afie a mente, mas também fortaleça o corpo para os desafios físicos que podem se apresentar. Cada situação extrema torna evidente a necessidade de preparação completa, uma dança sutil entre astúcia mental e resistência física para enfrentar o imprevisível.

Nessas sessões exaustivas, aprimoro meu domínio nas artes marciais, me aperfeiçoando em técnicas de defesa pessoal e familiarizando-me com o uso eficaz de armas pouco convencionais. Além do físico, desenvolvo uma mentalidade estratégica, antecipando os movimentos potenciais de adversários. Na convivência com outros agentes da S.H.I.E.L.D., cada um com suas habilidades únicas, encontro um especialista em tecnologia e um estrategista de equipe. Os desafios vão além do mero combate físico, testando não apenas minha resistência física, mas também minha resiliência e determinação.

A jornada de treinamento tem sido uma verdadeira maratona, desafiando tanto minha resistência física quanto mental nos últimos dois anos. No entanto, a boa notícia é que esse período intensivo me proporcionou habilidades aprimoradas, desde potentes chutes até precisão em acertos a 200 metros de distância. Talvez, aos poucos, eu esteja me adaptando a essa nova rotina, mas ainda é uma dança delicada entre aprimorar minhas aptidões e preservar minha sanidade.

Cada soco no saco de areia reverbera através de cada osso da minha mão, e eu continuo chutando e socando, praticando meticulosamente os movimentos que me foram ensinados. O suor escorre incessantemente pelo meu rosto, enquanto meus olhos semicerrados denunciam a exaustão e a privação de sono. Às vezes, me pergunto se a busca incessante por múltiplas tarefas vale a pena, especialmente quando a dádiva do sono se torna uma concessão séria. No entanto, é a consequência inevitável da tentativa de equilibrar diversas responsabilidades simultaneamente.

Numa busca incessante pela dualidade entre ser cientista e guerreira, questiono-me se serei capaz de desempenhar ambos os papéis. Independentemente da incerteza, decidirei tentar, pois compreendo que meu futuro está intrinsecamente ligado ao meu esforço, especialmente nesse período de incertezas.

Durante uma pausa merecida, acomodo-me no chão junto à minha bolsa de ginástica, com uma toalha de rosto pendurada nos ombros. Saboreio a água fresca de uma garrafa e inspiro profundamente, buscando recuperar o fôlego.

── Oi ── a voz me cumprimenta com entusiasmo. Olho em sua direção, capturando o olhar do agente Jacques.

── Boa noite ── respondo com cordialidade, virando-me na direção da entusiasmada saudação, encontrando o olhar do agente Jacques. ── Água?

Jacques se acomoda ao meu lado, aceitando a oferta de minha garrafa d'água. Ele dá um pequeno gole antes de me devolvê-la. ── Passei em frente ao seu laboratório, Doutora, e não a ouvi. Presumi que estivesse aqui.

"Sim," respondo entre goles. "Decidi trocar a baba nas mesas por um suor aqui, em vez disso. Me parece mais produtivo, eu penso."

Ele ri, e sua risada sonora ecoa por todo o cômodo.

── Você conhece o agente Bucky? ── A pergunta escapa por meus lábios, e mordo a bochecha para reprimir meu desejo de estapear meu próprio rosto.

O sorriso de Jacques desaparece imediatamente. Ele abaixa a cabeça por um momento antes de erguê-la novamente.

── Por que quer saber? ── pergunta ele.

── Tive o prazer de conhecê-lo há algum tempo ── menciono com delicadeza. ── Ele foi bastante prestativo, mas perdi o contato. Apenas gostaria de saber como ele está agora.

── Ohh ── ele murmura com seu sotaque francês e diz uma frase em sua língua. ── Pensei que tivesse um concorrente. ── Desvio a cabeça para o lado, esquivando-me de seu rosto e ocultando meu rosto ruborizado. Esfrego minhas bochechas até ter certeza de que meu rubor se esvaiu. ── Me desculpe ── ele murmura, pondo uma mão na frente do corpo em sinal de defesa. ── Não quis ofendê-la, Doutora Devereaux.

── Me chame de Abby, por favor ── digo rápido, o que motiva seu rosto a esboçar seu sorriso bonito outra vez. Meu rosto desvia instantaneamente para seus lábios carnudos.

Não tenho explorado muito as relações desde que estive aqui. Para ser sincera, não compartilhei beijos com ninguém. Entretanto, seus lábios me parecem intrigantes no momento. Uma experiência perfeitamente deliciosa para se aventurar. Avanço na direção dele, ansiosa pelo beijo, e surpreendentemente, ele não se afasta. Nossos olhos se encontram, e naquele instante, desejo que os dele fossem azuis, perdendo-me por um momento em pensamentos. Subitamente, o rosto de Bucky invade meus pensamentos, e anseio que fosse ele diante de mim. Num piscar de olhos, tudo se apaga.

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