one shots • saikomene x leitor

Pt.2 Saudade

O Uber demorou um pouco para chegar. Tarde da noite, era fora do comum que alguém ainda aceitasse a corrida, e por isso, Saiko não reclamou. Os minutos que antecederam sua chegada até a porta de S/N passaram como um flash, mas no momento em que seu punho atingiu a madeira e a batida ecoou, sua consciência voltou por inteiro.

A rua escura; o ruído do vento soprando gelado pela sua pele; a visão aterrorizante da porta imóvel.

Infelizmente, os pensamentos também voltaram.

E se fosse tudo brincadeira dela? E se ela tivesse mudado de ideia? Já eram quase quatro da manhã, e se ele tivesse que pedir outro Uber para voltar para casa agora, acabaria passando a noite na rua. Ele mordia os lábios e respirava pesado enquanto esperava, até que finalmente a placa de madeira à sua frente se moveu.

S/N apareceu, desarrumada, com a cara amassada e sonolenta. Apareceu e sorriu para ele. Depois de três meses sem qualquer troca de palavras entre eles, ela ainda escolheu sorrir. Ela segurava, na mão esquerda, uma caneca quente. O vapor subia como nuvens mornas.

"Achei que tu não viesse," disse, se inclinando na batente da porta, sem tirar os olhos dos dele.

"Eu falei que vinha, não falei?"

"Na verdade, você me pediu para esperar, mas não especificou que viria."

"Pensei que fosse óbvio."

Ela deu de ombros, depois deixou a cabeça tombar para o lado. Com certeza estava morrendo de sono, mas mesmo assim havia se mantido acordada, esperando ele chegar.

"Vem, entra. Eu fiz café."

A porta foi aberta por inteiro, deixando à mostra a sala de estar. Quando ele colocou os pés para dentro, S/N girou de volta a tranca e seguiu logo atrás. Um único lustre iluminava, com um tom alaranjado, o sofá. Ela foi até ele e se sentou sobre a montanha de cobertas desorganizadas. Seus olhos pesados lutavam para permanecer abertos.

Saiko foi junto, tentando esconder o nervosismo que sentia. Se sentou a um palmo inteiro de distância dela e se arrependeu na mesma hora de não ter chegado mais perto. Se virando para ela, ele soltou um suspiro.

"Por que você está acordada tão tarde?"

"Tu já me perguntou isso. Estou acordada porque fiquei pensando em você."

Talvez seja devido ao sono, mas S/N respondeu aquilo com a maior naturalidade do mundo; como se ficar acordada às três da manhã, pensando nele, não fosse nada fora do ordinário. Ela fechou os olhos, e Saiko ficou com receio de que ela fosse cair no sono bem ali, no sofá da sala, mas então eles se abriram novamente e se encontraram com os dele.

"É culpa sua."

As sobrancelhas dele voaram para cima, surpresas.

"Oi?"

"Meu sono está todo esquisito por culpa sua," repetiu, com um longo bocejo que a fez lacrimejar. "Quando eu fui embora da sua casa, fiquei a noite toda acordada, esperando você me ligar, mandar mensagem, qualquer coisa. Depois disso, foi ladeira abaixo. Tentei consertar meu sono, mas é, tipo, impossível."

Saiko soltou um arzinho pelo nariz enquanto sorria.

"E como está sendo acordar depois de meio-dia todo dia?"

Ela levanta a cabeça para fitá-lo, com a testa franzida e uma frustração clara cobrindo seu tom de voz.

"Está sendo horrível!"

Saiko dá uma risada fácil, os cantos dos olhos se fechando em vincos. S/N toma um gole de sua caneca enquanto o observa.

"Quer café?"

"O seu? Quero."

Com um suspiro alegre, ela se levanta do sofá e vai até a cozinha. Saiko também vai junto, para assisti-la de perto.

O líquido derrama da garrafa até a caneca e ocupa o ar com o cheiro característico de café fresquinho. Ela preenche até a metade antes de entregar a cerâmica morna para ele, fazendo com que as palmas de suas mãos agradecessem pelo calor-aquela era uma noite bem fria.

Os dois, então, voltam ao sofá. Dessa vez, Saiko se sentou a meio palmo de distância. A dez centímetros de encostar seu ombro com o dela.

Dez centímetros ainda parecia muita coisa.

"Tecnicamente, a gente nunca terminou," S/N disse, quebrando o silêncio e tirando uma risada de Saiko.

"Pior que é verdade, né? Tu só foi embora e a gente não se falou mais."

"Aham. Tu é um péssimo namorado. Quem que fica tanto tempo assim sem falar com a namorada?"

Ele negou com a cabeça enquanto o sorriso crescia cada vez mais em seu rosto.

"Pelo menos ainda sou seu namorado, né? "

"Sortudo." Ela respira fundo e, por uma segunda vez, fecha os olhos. "Sabe," começou, "o ser humano é muito curioso."

Sem entender aonde ela queria chegar com aquilo, Saiko apenas fez que sim com a cabeça e esperou alguns segundos para que ela continuasse.

"A gente gosta sempre de usar o argumento de que somos seres racionais, sabe? Mas ninguém é. Não por inteiro. O ser humano tem a quantidade exata de racionalidade para cumprir com tudo que o seu emocional pede, e essa junção geralmente dá errado."

Somente então ela volta a abrir os olhos.

"Mas talvez não seja tão ruim assim... Se eu não tivesse uma parte emocional, não me sentiria assim-" Colocou a mão sobre o peito, "-por você. Mas também, se eu não tivesse uma parte racional, nunca teria aceitado sua ligação, e você não estaria aqui agora... Eu estou feliz por você estar."

Diante daquela declaração, as palavras lhe falharam. Dez centímetros havia se tornado uma distância abismal.

"S/N," sussurrou, com os olhos presos aos dela. "Eu também estou feliz por estar aqui. E muito."

Ela dá um sorriso cansado para ele e os olhos se fecham novamente. A mão com que segurava a caneca ia caindo sozinha, perdendo a força. Ela quase derramou seu café por inteiro, mas Saiko conseguiu segurá-la a tempo. Surpresa pelo contato, seus olhos se abriram.

"Eu estou morrendo de sono."

"Percebi."

O sorriso cresce no rosto de S/N e ela chega mais perto. A distância na qual Saiko se mantinha hiperconsciente foi quebrada por inteiro. Os braços envolvem-no pelo pescoço e o peso de seu corpo é pressionado contra o dela. No abraço entre os dois, S/N deitou a cabeça no ombro dele e soltou um suspiro.

"Que bom que você veio," disse.

"Que bom que vim," ele repetiu.

Com uma última troca de olhares, ela caiu no sono, e foi como se os últimos três meses nunca houvessem existido.

☆•°▪︎ Esta fanfic tem o selo oficial tirei-960-na-redação-do-enem de garantia, o que significa que eu tirei 960 na redação do Enem e também que eu escrevi esta fanfic. É isso.