CAPÍTULO 4

344 6 0
                                    

Segredos Embaixo Do Chapéu

DANIEL


ELE TEM OLHOS claros, e fios de cabelo louro-escuro, um papo amigável que qualquer um cairia fácil e o abraço de um pai que a gente nunca teve. Esse é o demônio. Ele eleva você até o mais alto topo da montanha, faz você se sentir o máximo e depois atira você para baixo impiedosamente.

Voltando a algumas semanas atrás eu havia chegado ao pequeno riacho para descansar um pouco e refletir sobre a vida. Eu sentei embaixo de uma árvore na sombra e observei o farfalhar da água cristalina.

- Muito confortável, boy?

Eu então virei-me e vi que Antonio tinha chegado de fininho e estava me vigiando. Os primeiros botões de sua camisa quadriculada estavam abertos e ele tinha um chapéu de boiadeiro na cabeça.

- Acho que eu mereço um pouco de descanso.

- Hum, eu também.

Ele então sentou-se ao meu lado tão próximo que nossos ombros encostaram um no outro.

- Está pensando em quê?

Dei de ombros.

- Em tudo um pouco. Você não entenderia.

Ele me olhou de uma forma que não consegui decifrar. Talvez tenha se ofendido, mas eu não me importei com isso.

- E por que eu não entenderia?

- Sei lá, cara! Só acho que não.

- Olha, eu não sou só um peão cabeça dura e insensível, as vezes eu tenho a capacidade ter uma conversa descente nas horas vagas.

- Você está sendo sarcástico - pontuei, sorrindo.

- E você está me julgando. - Ele deu um tapinha na minha coxa. - Vamos lá, conte o que está havendo.

- Bom, é complicado. - Relutei, cansado. - Tive uma conversa por telefone com Patrícia quando estive na cidade.

- Mesmo? E como estão as coisas por lá?

- Nada boas, ela disse que Patrick está mal, que ele vive dando trabalho, e que as garotas também sentem minha falta. Que ela está cansada de cuidar de tudo sozinha, e que tudo é muito difícil.

- Mas você está se esforçando. - Ele disse. - Você manda tudo para eles, não fica com absolutamente nada. Ela deveria entender que está fazendo tudo por um bem maior.

- Hum, mas dou razão a ela por dizer essas coisas. Deve ser exaustivo cuidar da casa e das crianças sozinha, e o quanto deve ser estranho para eles não terem a presença paterna em casa.

- Castro, às vezes a vida tem dessas coisas. Infelizmente essa é a sua única opção, ou é isso ou voltar para casa e não ter expectativas de um trabalho melhor. Eu sei que tudo aqui é exaustivo e ficar longe da família pode ser duro, mas não existe outro jeito. Ou existe?

Engoli em seco. Na verdade, tinha sim um outro jeito, algo de que não me orgulho, mas que foi minha salvação por muito tempo em que estive na capital. Uma coisa pela qual Patrícia jamais me perdoaria se descobrisse; uma coisa pela qual nem mesmo eu consigo me perdoar.

- Está tudo bem, boy? - Antonio me encarava com um olhar indulgente enquanto me perdia em pensamentos, parecia ter pena de mim e isso me deixava constrangido. Mas como não poderia me olhar assim, já que eu estava derramado lágrimas e parecia uma bagunça emocional?

Que droga! Estava chorando como uma garotinha na frente daquele peão grosseiro, ele provavelmente estava me julgando por trás do seu ar de gentileza.

O Segredo DelesOnde histórias criam vida. Descubra agora