same wall | Enzo Vogrincic e Matías Recalt

Capítulo II

Boa leitura!

Acordo nesta manhã com um ótimo humor, apesar da tragédia de ontem, sinto que hoje será ótimo se isso levar em conta que é o dia da apresentação das crianças na escola. Me sinto empolgado para isso desde sempre, é a segunda vez que participo das apresentações do dia da família e dessa vez as crianças irão apresentar uma coreografia ensinada por mim.

Corro para me arrumar e logo pego a minha fantasia, vou me vestir de abelha enquanto todas as crianças serão o jardim. Pode parecer meio vergonhoso, mas para quem ama essa profissão, é muito gratificante ver os sorrisos nos rostos das crianças.

Caminho rápido para fora do apartamento, não quero ver ninguém indesejado no dia de hoje e por incrível que pareça eu não encontro o que não deve ser nomeado.

- Matias, você pegou tudo o que devia? - falo para mim mesmo quando entro no elevador, eu não poderia esquecer nada, a ideia de pegar dois ônibus para voltar ao apartamento pra pegar algo é inimaginável.

《...》

A escola estava toda decorada com o tema Jardim e já era possível ver algumas famílias sentadas no local onde aconteceria a apresentação. Me aprontei para ajudar os professores com a arrumação dos alunos, fazia maquiagem em alguns, vestia outros à medida que iam chegando e quando estavam todos prontos, os colocamos em suas posições para entrar no palco, as apresentações já tinham começado.

Quando a turma dos alunos mais velhos terminou, eu e o outro professor subimos ao palco com os alunos. De começo escutamos as risadinhas dos pais pelos professores estarem fantasiados, mas logo começou o coro de sons fofos quando as crianças começaram a dançar.

Enquanto dançava e me divertia junto com as crianças, eu cometi o erro de olhar para a plateia e senti o meu corpo parar no mesmo instante, pisquei algumas vezes não querendo acreditar no que via, não pode ser quem eu acho que é, ele estava ali olhando para mim? Não, eu estou ficando louco, meu coração bate desgovernado e eu consigo enxergar perfeitamente o sorriso ladino, Enzo Vogrincic está me filmando vestido de abelha enquanto sorri da forma mais bonita e cínica que já vi.

《...》

- Abelinha, então quer dizer que você é o “Titio Matí”?

O homem de quem eu estava fugindo durante toda a festa estava ali, parado atrás de mim e eu nunca quis tanto fingir um desmaio quanto agora. Me virei olhando para aquele homem que não parecia ter um pingo de vergonha na cara.

- Não sabia que tinha filhos, Enzo. E por favor não me chame assim novamente.

- Não tenho filhos, vim ver a minha sobrinha, é o dia da família, afinal. E como não te chamar assim quando você está com uma fantasia dessas?

- Estamos no meu ambiente de trabalho, você pode só por hoje ser menos insuportável?

- Não consigo, ainda mais depois de saber que a minha sobrinha gosta tanto de você, te acha um fofo e prefere você do que eu. 

Isso automaticamente aumenta o meu ego e sorrio de uma forma que claramente não agrada o moreno, agora eu tenho mais um motivo para implicar com ele.

- Não é muito difícil gostar mais de mim do que de você. Quem é a sua sobrinha?

- É aquela ali, a Luna.

- Impossível ser ela, é fofa e educada demais para ter o seu sangue.

- Ela te acha tão incrível, se ela soubesse como você é de verdade. Como você é fofo se está falando comigo assim?

Ele claramente estava tentando entender como a sobrinha gosta tanto de mim e eu não conseguia parar de achar engraçado, parecia uma criança pedindo atenção do professor.

- Ciúmes, querido?

- Ciúmes de você?

- Claro que não, Enzito. Dá sua sobrinha, é óbvio. E como eu sou? Eu realmente sou fofo e gentil e só não nos damos bem por causa causa.

Agora ele parecia querer achar um ponto para olhar, um que não fosse o meu rosto. Ele achou que eu estava falando sobre mim?

- Abelinha, sabemos que você consegue ser bem desagradável quando quer, ou seja, todos os dias. E não é por minha causa, é por você ser um insuportável nato.

- Já falei para não me chamar assim, Enzo.

- Chamo como eu quiser, acredito que você não possa gritar comigo agora. E antes de ir embora, obrigado pelas cenas perfeitas para o meu vídeo, quando eu tiver filhos vou mostrá-los para que aprendam a coreografia.

- Se você tiver filhos, não é? Primeiro, quem vai ser a louca? Segundo, você já tá bem velho? Ainda faz filhos? Terceiro, apaga agora o vídeo.

- Primeiro, eu sou um ótimo partido. Segundo, eu posso te mostrar se você está com dúvidas. Terceiro, nunca!

Deus, esse homem! Eu não consegui responder, meu corpo está queimando, quem ele pensa que é para falar assim? Não é a primeira vez que ele joga esse tipo de coisa na conversa, não faz sentido, ele com toda certeza é o ser mais hétero que eu conheço. Esse idiota está brincando com a minha cara mais uma vez.

Vejo o moreno andar em direção a sobrinha, enquanto ainda estou parado assimilando suas palavras, ele tem levado a melhor nas últimas brigas.

Olhando ao redor, não posso deixar de notar, ele chama a atenção, todas as mães solteiras (e até mesmo as casadas) olham para ele de cima a baixo, eu já não acho que seja isso tudo! 

《...》

- Vizinho, você pode me atender? Eu sei que você está em casa, dividimos a mesma parede se não se lembra.

Aquele paspalho está me ignorando tem uns dez minutos ou mais, estou batendo em sua porta para conversar sobre ele apagar o vídeo, mas ele simplesmente não me atende.

- Enzo Vogrincic, eu não estou brincando com você, se não abrir essa porta agora, eu vou em uma delegacia e te denuncio por direito de imagem

Eu consigo escutar a sua risada por trás da porta e ele abre como se estivesse surpreso por me ver ali.

- Esperando a muito tempo?

- Você pode parar de ser tão cínico? Eu quero que você apague o vídeo, por favor.

- Já falei que não e não adianta me denunciar, só abri a porta porque colocaram uma correspondência sua nas minhas coisas.

Pego aquele papel sentindo o meu corpo gelar quando li o que estava escrito, não podia estar acontecendo, eu sei que estou com o aluguel atrasado, mas não tem tanto tempo assim!

- Parece que alguém vai ser despejado, não é Abelinha?