cap: 2 Perdição.

2 0 0
                                    

Na casa, o garoto se sentiu completamente entusiasmado, pois este adorava mistérios de todos os tipos, e este, este era dos grandes. A porta dava entrada para uma grande e luxuosa sala, toda ela, assim como o lado de fora, era de madeira. E bem no meio dela haviam duas poltronas (que o Garoto reconheceu como couro falso) sobre um tapete felpudo tão luxuoso quanto a sala. Entre as poltronas havia uma mesinha de chá com uma vela metade branca metade preta, ninguém nunca soube, mas ela representa o Anfitrião. No teto havia um lustre bastante chamativo, do tipo elétrico, que dava a toda a sala uma iluminação mal distribuída. O Anfitrião andou para a mesinha entre as poltronas e, nostalgicamente, observou a vela. Já o Garoto, meio tímido, passeou até uma das paredes e observou, lá no alto, grandes quadros de diversas pessoas. Essas pessoas eram completamente diferentes uma da outra. Eram, um inglês bem-vestido, uma Dama de cabelos negros, uma garotinha com roupas vermelhas e um ursinho, e embaixo de cada quadro havia um nome, "os nomes delas, é claro" pensou, mas os quadros ficavam tão no alto que não conseguiu ler nada. Atrás das poltronas tinham duas grandes escadas, ambas levavam para a mesma porta, ou melhor dizendo, ambas davam numa plataforma que essa, sim, dava em uma única porta.

O Anfitrião sentou-se na poltrona da esquerda, olhou o garoto de pé a cabeça e perguntou:

-Ei, menino. O que você faz aqui?

-Me diga você. Não era você me chamando de ilustre? Tem que saber. -Respondeu o garoto.

O Anfitrião fez um sinal para a poltrona a sua frente, e o garoto veio, e sentou-se.

-Sim, mas todos os convidados a esta casa, assim como os residentes, são ilustres em sua sociedade. Claro que, não da forma convencional. Sendo assim, sei de sua importância, mas não para o que exatamente. Vamos, conte sobre você.

-Tem outros aqui? -Desconversou o Garoto- Isto é uma pensão?

O Anfitrião deu um sorriso de canto de boca, e disse:

-É uma maneira divertida de pensar! Antes que qualquer estranheza ou susto lhe aflija, vou ser direto: É uma "pensão", mas nada aqui é comum. Tudo aqui é como sempre foi, mas inegavelmente, nem tudo foi como é agora. De certo modo, a estrutura é igual ao início, mas com chegadas e partidas a coisa toda muda, mas de forma ao funcionar da coisa sabe? Em suma, é como deve ser. É como o mundo lá fora, só que estruturado de verdade, para o bem, ou para o mau. Não espero que entenda tudo agora, então quero que cumpra apenas um combinado aqui dentro, ok? -O Anfitrião curvou-se para a frente, ansiosamente esperando uma resposta.

-Você é louco... -Falava o Garoto.

-Sim. -Interrompeu o Anfitrião- Mas o combinado é o seguinte: você irá me seguir, quarto por quarto, e então conhecerá cada um dos "hóspedes". Você pode ir embora quando quiser, como sabe, eu não tranquei a porta. E, no fim do tour, me dirá o que vai fazer com sua vida.

-Qual seu objetivo com isso? -Perguntou desconfiado.

-Não sei, não ainda. -Respondeu.

O Anfitrião se levantou e se dirigiu as escadas. Hesitou, pois tinha lembrado do Menino, e disse:

-Bem, eu tenho de fazer uma tarefa que há muito tenho adiado. Já você, deve se sentir em casa, vá para onde quiser, só não faça bagunça.

Terminado a frase, o anfitrião se põe a subir a escada, e o Garoto curioso como um humano o segue. Ao subir a escada, atravessou a porta que dá de cara com um longo corredor com várias Portas uma do lado da outra, cada uma tinha uma peculiaridade, mas o Garoto só notou isso depois. O Anfitrião estava em frente a primeira Porta do corredor, e esta estava acabada, ela rangia constantemente, sua madeira parecia queimada e era cheia de rachaduras, talvez meio ensanguentada.

-Eu falei sério quando disse vá aonde quiser, mas não pode me seguir agora meu caro.

-Mas por quê?

-É que isso resultaria numa grande bagunça. -Respondeu o Anfitrião ao piscar.

E então de repente o Anfitrião abre a porta, o corredor fica super abafado, e ridiculamente mais quente, quase como se alguém abrisse as portas do inferno, mas não era o inferno, pois o inferno é dito como aterrorizante, mas aquilo sequer os assustava. E por mais sério que aquilo fosse, o Anfitrião não pode segurar um sorriso de canto de boca. Dentro da porta não havia nem sala, nem quarto e nem mesmo banheiro, ali havia fogo, fogo sobre uma terra devastada e sem vida com pedras e todo o chão em vermelho, e o chão todo em pedra lisa com pouca ou nenhuma sujeira, porem todo irregular. Logo a frente de tudo havia um abismo onde se tinha ainda mais fogo, e de dentro do mesmo abismo de repente sem aviso sai uma monstruosa mão, a mão parecia ser feita de um material parecido com obsidiana e, além disso, pegava fogo como o resto, porem seu fogo era tão intenso que dava a impressão de ser vermelha. Quase imediatamente depois da mão submergir das labaredas, uma estrutura muito fina feito raízes de uma árvore, feita do mesmo material da monstruosa mão, se alastrou, apagando o fogo ao seu redor, e por não pegar fogo era possível ver perfeitamente sua cor: era obscuro e sombrio, era morto e causava um certo vazio. E depois disso subiu ainda mais do abismo o dono de tão excêntrica mão, era um grande touro humanoide que, assim como sua mão, era escuro e iluminado por fogo. Seus chifres não subiam, mas eram caídos como uma cachoeira, e em sua ponta tinham o formato parecido com uma lança. E agora onde estava sua monstruosa mão está seu monstruoso pé fazendo as raízes se espalharem ainda mais, servindo como garantia para que ele não caia. Era de se esperar que fera bradasse em fúria, mas não, ela só esperou. O Anfitrião, vendo que seu convidado chegou bem, vai lhe dar as boas-vindas.

-Sabia que não se atrasaria, mas sinto muito a resposta ainda é não!

A fera grunhi, não de forma enfurecida, mas sim, dando continuidade a conversa.

-Sabe que não vou deixar, -diz o anfitrião enquanto retira a cartola- só de abrir aquela porta eles já tiveram o suficiente!

A fera ruge, desta vez de forma mais agressiva, e começa a andar em direção à porta e, consequentemente, ao Anfitrião logo após ela. Em resposta, o anfitrião puxa de dentro de sua cartola um chicote absurdamente longo, longo ao ponto de que, ao retirar, sua calda saltou ao ar por cinco segundos, até que, finalmente, saiu por completo. E depois golpeia a fera tanto em sua mão quanto em seu pé, com um único movimento. (algo já cotidiano para ele.)

-Não! VOCÊ NÃO PODE PASSAR! Caia fera, caia em si mais uma vez, caia, deixe este mundo em paz uma vez mais, e quando finalmente chegar a hora de sair, o momento de se libertar de si mesma e se espalhar pelo mundo correto, lhe darei passagem, e então poderá reinar no caos e morte. Mas até lá, caia fera e enfrente seus demônios, caia!

Disse enquanto golpeava o monstro. O mesmo, quase sem reagir aos ataques, foi sendo empurrado de volta para o abismo, golpe por golpe. E na beira, segurou uma das chicotadas e lançou a ponta do chicote de volta, não como um ataque, mas como um tipo de "basta". Era como se apenas quisesse falar, mas nada havia de ser falado, pois as palavras do Anfitrião são finais e poderosas. Guinchou ao último ataque, e foi derrubada nas chamas dos próprios medos outra vez. Ao desmoronar, olhou para o Anfitrião com pesar, mas, no fundo sabia que nada a podia salvar de si, e sabia também, que o Anfitrião não queria faze-lo, mas tinha, pelo bem de cada um.

-Mas -disse depois de uma pausa- não pense nem por um segundo, que não sei quão solitário é aí em baixo. O Anfitrião não vai demorar a te soltar, aguarde fera, mas nem tanto assim. 

Realidade pragmáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora