A casa, sim, era um belo contraste. Ela tinha belos tons de roxo escuro, e o telhado do deck era torto, não para a esquerda ou direita, mas sem uma direção definida, lembrando uma casa de bruxa, daquelas das histórias de fantasia. Mas o que causava a maioria da estranheza era obviamente ela estar ali. "É estranho, mas divertido eu acho." Pensava ele ao olhar para aquela tão estranha atração, mas só pensaria assim por pouco tempo, pois logo se mostraria que é impossível ter duas visões sobre tal casa, logo se mostraria que só se pode ter, quando se entende do assunto, uma visão simples e prática de tal coisa triste, e bela, de tal coisa tão incrivelmente... Tragicômica.
Ao olhar mais de perto, um novo detalhe se revela, a porta estava levemente aberta. Ao olhar ainda mais de perto, outro grande detalhe se revelou, a porta não estava simplesmente aberta, mas sim, se abrindo aos poucos, tão aos poucos que chegava a ser irritante, lenta ao ponto de que quase não se percebe. Com o tempo, a porta se abriu o suficiente e revelou-se um olho sem vida e nem brilho, e com ainda mais tempo se revelou um rosto inteiro também sem vida alguma, mas quando esta imagem se revelou por completo, a porta se apressou em abrir, agora em grande velocidade, revelando assim o corpo em que aquele rosto mórbido, porém jovem e jovial, residia. E para a surpresa de nosso protagonista, a figura se vestia como a casa: estranha e divertida! Usava um terno com belíssimos detalhes em roxo, mas na maioria preto com listras brancas que se estendiam por todo o traje, também havia uma calda dupla no paletó que se estendia e se enrolava em si de forma quase sobrenatural, formando um redemoinho. Mas o principal era obviamente a cartola, ela era levemente alta, mas não ao ponto de ser estranha como o resto, era totalmente na cor preta, e tinha uma flor azul em sua aba, que deveria estar na lapela. Quanto a figura, era um homem relativamente alto, com cabelos longos e castanhos, assim como também eram lisos, e seu rosto comum e característico ao mesmo tempo, causando certa estranheza. Ao ver o Garoto, o rosto antes mórbido se iluminou de alegria, logo se apressou em fazer uma reverência da forma mais pomposa possível e, tão logo quanto a reverência, se pós a falar:
-Hoje meu rosto se ilumina com a doce e clara alegria, a alegria de receber tão ilustre hóspede! Ilustre ao ponto de que, hoje, haverá o maior dos tours pela maior e mais orgulhosa casa deste futuro subcontinente. Há sim! O ilustre entre os ilustres está aqui em minha frente, e eu ei de honrar isto.
-O senhor me confunde. Não sou quem o senhor pensa, além disso, eu não vou entrar -Foi interrompido.
-Sabe me dizer que horas são? Sequer prestou atenção nisso? -Desfez a reverência.
Olhou para cima, e cerrou os olhos para os proteger do sol. Então disse:
-Talvez... hum... -Pensou- Talvez meio-dia.
-E por acaso -Disse o Anfitrião- Prestou atenção em... -Desta vez, o garoto o interrompeu.
-Estamos em dezenove de outubro de dois mil de dezesseis. A ideia é dizer que viajou no tempo ou que é vidente? Ou talvez você só seja bizarro? -Brincou.
-Sim, quero dizer, sim para o segundo. Embora... todos se apliquem em certo nível.
-Metaforicamente?
-Talvez. -Olhou ao redor, e testemunhou uma melancolia que a muito tempo não via. Piscou lentamente os olhos como quem acaba de acordar, e continuou.- Eu não venho para cá há tanto tempo... Alguma vez sua família lhe pediu para fazer algo, e depois de tanto trabalho duro, viu o resultado, ou reação que seja, e se sentiu num trabalho ingrato?
O garoto olhou para o Anfitrião como quem olha um assaltante, e desviou a pergunta.
-O senhor é daqui? -Perguntou meio reprimido.
O Anfitrião se viu sem uma resposta correta, e então, ao pensar um pouco, agarrou uma resposta ali no ar. E se sentindo muito profundo, respondeu:
-Sim, daqui de onde todos vem, o que me difere é o meu destino. O meu e o seu, claro.
-Mais uma vez, me confunde. Sou provavelmente jovem demais para que me conhecer. E mais uma vez, nada vindo de você me passa segurança pra entrar aí. Não me entenda mal, eu não quero ofender, mas é muito suspeito.
-Tem razão, sou velho demais para que qualquer um me conheça. De certa forma, assim como todos, nem mesmo eu me conheço.
-E a terceira opção fica cada vez mais clara. -Riu-se o garoto. Então se pós a pensar com seus botões sobre aquilo, e quis colocar um pouco de lógica naquela questão.- A ideia, é então, que eu entre e veja a mercadoria, ou o que quer que seja, não é?
-Sim... Onde quer chegar? -Apoiou-se no batente da porta.
-Espere aqui. -Curioso, o Anfitrião acenou concordando.
Correu até o senhor que ali dormia, aquele amigo de sua família, e o acordou a tapinhas. Com o sol o atingindo os olhos, acordou irritado, mas ao ver o garoto, se sentiu mal pela reação que teve. O pedido do garoto, foi simplesmente que avisasse sua família de onde tinha ido. O rosto do senhor se esbranquiçou, e sem perceber isso o garoto correu para a porta, novamente junto ao Anfitrião.
-Agora que o velho Arnaldo sabe onde me encontrar. Agora sim, entro. Mas tenho que voltar para a janta... -Se interrompeu.
O Anfitrião o olha como que se divertindo, e se mostra admirado ao Garoto.
-Venha, -Disse- vou mostrar-lhe a casa. Sinto que seu espirito jovem pode finalmente nos fazer olhar para frente, senhor. -Falou com profunda reverencia.
-Eu já disse... -Outra vez, foi interrompido.
-Que tipo de anfitrião eu seria se não reconhecesse o senhor? Venha! Vou lhe mostrar a casa, sei que vai adorar. No fundo, no fundo você sabe que tipo de anfitrião eu sou, não é? -Falou divertido.
E assim, sem resposta para esta pergunta, o Garoto e o anfitrião adentram a casa. Foi, meio tímido, meio incerto, dando passos pequenos e desajeitados, e dessa forma, pouco a pouco passou sem jeito pela porta. Sem pensar, já estava lá, mas não sentiu nenhum tipo de medo, por mais estranha que a situação fosse. Algo lhe fazia sentir em casa. Era como a sensação de voltar para o lar depois de uma longa visita a um lugar inconfortável. Não fazia parte de nada dali, mas certamente iria encontrar entre suas paredes, conforto, de um modo ou outro.
Por fim, lá estava. Pensando naquela péssima ideia, pensando em sair, talvez correr, para fora daquele imenso e triste monumento da trágica humanidade, do trágico universo. Claro, que ainda não o via assim, ou ao menos não totalmente, mas sentiu que não devia ir. Olhou para a porta escancarada como se a usar fosse um ato de covardia, por mais que não houvesse sentido ne tal pensamento. E então, se ouviu de algum lugar, em alguma altura, um trancar de alguma coisa. Por mais estranho e variável que isto fosse, sempre acontecia, contanto que um alguém entrasse lá.
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Realidade pragmática
Gizem / GerilimNos confins da lógica física havia uma casa de horrores que a todos protegia. Ninguém sabe de onde veio, ou o porque, mas todos que a conhecem tem uma complexa visão sobre a mesma. O mundo molda o mundo... (Capa provisória...)