Primeiro jantar

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No dia seguinte, a diversão na piscina acabou bem mais cedo do que no sábado. Afinal, dois dias seguidos de sol e brincadeiras ininterruptas era cansativo até para três crianças de oito anos, e Pac insistiu em levar Empanada e Richarlyson para tomarem um banho antes de irem jantar na casa do vizinho.

O cientista estava nervoso, uma expectativa boa tomando conta de seus ossos. Ajudou os dois sobrinhos a finalizarem os cachos dos cabelos - os de Richas eram escuros, um tom castanho quase preto, enquanto os de Empanada estavam divididos na metade, um lado no tom natural de marrom claro, o outro pintado de rosa por sua mãe e pela "Tia Tina". Enquanto isso, conversava com Bagi por chamada de vídeo.

— Então, vocês vão jantar na casa do vizinho... — Bagi repetia pela quarta vez seguida, com um sorriso enorme no rosto, fazendo o irmão mais novo bufar.

— Sim, Bagi.

— O mesmo vizinho que troca comida contigo há meses...

— Aham.

— Que te manda bilhetinhos bonitos e fofos cheios de referências à Shakespeare...

— Uhum... — Pac resmungou, sabendo onde a irmã queria chegar com aquilo.

— Que faz você ficar tão nervoso com um jantar que estamos conversando há cinquenta minutos e você ainda não encontrou a roupa certa pra ir...

— Bagi!

— A única pessoa nesse mundo que te deixou com borboletas no estômago...

— Bagi, juro! Cala a boca! — Pac sentiu a quentura das bochechas até a ponta das orelhas, enquanto a irmã ria ao notar a leve vermelhidão cobrindo o rosto dele. O cientista olhou para os sobrinhos; Empanada sorria tranquilamente para ele, apenas feliz por vê-lo tão animado, mas Richas tinha uma expressão pensativa de quem criaria um caos na hora do jantar ao mencionar aquela conversa. — Não tem nada demais, somos só...

Pac se calou. Ele ia dizer "somos só amigos", mas não sabia se aquela palavra era certa. Claro, eles tinham uma estranha conexão, uma facilidade em confiar um no outro que não tinham com nenhuma outra pessoa. E sim, trocavam cartas, bilhetes e comida há um tempo, e Pac guardava todos os papeizinhos na gaveta próxima à cabeceira de cama. Mas não podiam ser amigos, não é? Só haviam conversado poucos dias...

Mesmo assim, Pac sentia-se à vontade com Fit, ao ponto de contar a ele sobre Mike e o acidente. Sentia-se à vontade, ao ponto de levar os sobrinhos para a casa dele para jantarem. Sentia que haviam criado uma intimidade muito próxima nos meses em que se conheceram por cartas, mas sem ver um ao outro, intimidade esta que só aumentou com as conversas que tiveram na beira da piscina nas duas manhãs.

— Amigos? — Bagi interrompeu o fluxo de pensamentos, erguendo uma sobrancelha e aproximando o rosto da tela do celular. Pac suspirou baixinho.

— É, somos apenas amigos. Pode, por favor, parar com isso? Tá me deixando mais nervoso ainda.

Bagi riu, colocando a mecha escura do cabelo para longe dos olhos, olhando com carinho para o irmãozinho e os filhos projetados na videochamada.

— Como tá o clima aí? — A mulher perguntou de repente, querendo mudar de assunto e ajudá-lo com o que pudesse. Ela bem entendia o nervosismo que certas pessoas causavam em outras - podia namorar com Tina há anos já, e, mesmo assim, sempre que saiam juntas sentia-se nervosa para escolher a roupa certa.

— Meio frio. Ontem fez um calor dos infernos, hoje foi mais ameno e agora tá batendo um vento gelado como se fosse chover. Por quê? Não se preocupa, as crianças tão com casaco na mochila.

De novo, a mais velha riu; simplesmente amava o cuidado que Pac tinha com os filhos, e sempre orgulhava-se ao lembrar dos meses difíceis que tiveram depois da morte de Mike e o quanto Pac vinha esforçando-se para ser mais e mais presente na vida dos gêmeos.

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