Verdades não ditas - Mitake

8. Escolhas

— Não quero voltar, aqui é um paraíso, Take! — A exclamação partiu de Shinichiro que sorria de orelha a orelha enquanto andava pelas ruas movimentadas de Lyrae. Os belos olhos escuros do mais velho brilhavam devido a felicidade que explodia em seu peito por estar num lugar tão diferente de Kholis.

Um lugar onde eles podiam ser outras pessoas, ter outras oportunidades, talvez até mesmo desfrutar de uma nova vida bem longe da cruel realidade de Oteim, seria perfeito se eles pudessem se mudar daquela cidade. A ideia de morar num planeta novo, agora não parecia tão terrível e assustadora, na verdade, parecia uma salvação.

A hospitalidade de Lyrae para com eles foi extremamente cordial e calorosa, assim que chegaram ali há 5 dias — depois de 3 dias viajando na espaçonave — foram tratados da melhor forma possível.

O guia que os acompanhou na aventura interplanetária os levou para conhecer diversos lugares em seus momentos livres, eles comeram novas comidas — Takemichi e Shinichiro se apaixonaram pelos diversos tipos de frutas — viram coisas que existiam em seu planeta natal — Neve! Eles nunca tinham visto neve já que nunca neva em Kholis, bom, pelo menos em Oteim nunca aconteceu — e escutaram pela primeira vez novos idiomas — Inui disse que aprenderia para ensinar ao Koko, apesar de ser impossível em tão pouco tempo — e a melhor parte, transitaram entre as cidades livremente.

Aquilo jamais aconteceria em Kholis.

Eles — como inferiores — não poderiam nem sonhar em sair de Oteim legalmente, tudo que eles faziam em outros locais era clandestino e colocava a vida deles em risco durante cada segundo que passavam fora de sua área. Era horrível ter que ficar naquele mesmo lugar pelo resto de suas vidas e eles jamais aceitariam isso.

Para subir na vida era preciso ser corajoso determinado e eles eram exatamente assim. Davam o seu máximo todo dia e aproveitavam cada oportunidade não importa o quão arriscada fosse. Aquela era a única forma de terem uma ínfima chance de sair daquele lugar infernal.

E para eles, a chance estava ali.

Eles poderiam simplesmente não voltar! Ficar ali para sempre, qual seria o problema? Na verdade, o que seria melhor do que aquele planeta tão receptivo? O grupo não conhecia outros locais, mas tinham plena convicção que Kholis nunca poderia ser melhor que aquilo e, para eles, essa certeza já bastava.

Em Lyrae, podiam andar sem medo por todos os lugares, era quase como se fossem verdadeiros cidadãos. O quão surreal aquilo podia ser? Pertencer e habitar em um mundo onde são respeitados e protegidos? Para inferiores como eles, isso não passava de um sonho.

Direitos? Deveres? Proteção? Respeito? Dignidade? Isso não se aplicava a eles, pelo menos não enquanto ainda tivessem seus nomes inexistentes no banco de dados do governo; Aquele brinco falso que carregavam em suas orelhas era a prova de que a palavra cidadão nunca se aplicou a eles... e provavelmente jamais se aplicaria.

A amargura do cenário em que viviam os deixavam mais vulneráveis a sonhos impossíveis e era obviamente muito ingênuo da parte deles pensar que uma curta viagem mostraria a realidade de morar em Lyrae. Entretanto, eles estavam tão encantados com as novas experiências que puderam ter que nem passava por suas cabeças que aquilo podia ser só uma ilusão, uma mentira contada bem demais que chegava a parecer ser a mais absoluta verdade.

A única pessoa que tinha um pouco mais de noção sobre as coisas era exatamente Takemichi. Seria uma grande mentira se ele dissesse que não tinha pensado em ficar naquele planeta, mas isso traria problemas para os Haitani e ele não os prejudicaria daquela maneira. Além disso, por mais nojento que Oteim fosse, ele conhecia aquele lugar e sabia dos perigos que corria ali e tinha como se proteger, ao contrário de Lyrae que era um local totalmente novo e desconhecido, ele não tinha como se defender de coisas que não conhecia. Por isso, diferentemente de seus amigos, ele não via a hora de ir embora, era mais seguro voltar para casa.