Encostei a cabeça contra a janela do carro, sentindo o vidro frio na minha pele enquanto respirava fundo e fechava os olhos por alguns segundos. O ronco do motor ecoava suavemente na cabine, uma trilha sonora monótona para a minha despedida involuntária. Já faziam umas duas horas que eu estava aqui dentro, deixando para trás todos os meus amigos, o terceiro ano do ensino médio, o teatro e praticamente toda minha vida.
– Desfaz esse bico, Pedro. – Minha mãe disse ao acariciar levemente meu braço enquanto dirigia, e eu resolvi apenas ignorar por enquanto.
Não tinha mais motivos para discutir, nem para brigar. Essa é a minha vida agora, uma cidade do interior, com pessoas do interior, mentes fechadas e destinos traçados pela vida inteira.
A brisa suave que entrava pela janela bagunçava meus cabelos, trazendo consigo o aroma característico das terras que agora me acolheriam. Olhei para fora, observando o caminho pela janela do banco da frente do carro da minha mãe. Era fim de tarde e o sol estava se pondo, tingindo o céu de tons de laranja e rosa, contrastando com o azul escuro que anunciava a chegada da noite. Os passarinhos sobrevoaram o carro em bandos, suas asas cortando o ar em um vôo harmonioso, preparando-se para mais uma noite de descanso. Conforme a noite avançava e o carro deslizava sobre os asfaltos da rodovia, cada quilômetro percorrido parecia levar não apenas ao meu novo destino, mas também ao distanciamento de tudo que eu conhecia.
O motivo dessa mudança radical não era algo que eu gostaria de discutir agora. A morte do meu pai deixou um vazio imenso em nossa família e a vida na cidade grande já não tinha mais o mesmo brilho. Tudo parecia ter perdido o sentido, e a decisão de recomeçar em um lugar completamente diferente foi tomada em meio ao turbilhão de emoções que nos consumia.
Depois de algumas horas de viagem, chegamos ao nosso novo lar. Era uma casa de dois andares pintada de um azul profundo, destacando-se na rua com suas fachadas brancas nas janelas e portas bem cuidadas. Um jardim arranjado na frente, com um gramado verde e uma árvore enorme que se erguia no centro do terreno. No topo da árvore, uma estrutura de madeira formava uma pequena casinha, acessível por uma escada torcida que se enrolava delicadamente em seu tronco robusto
— Vai ser bom, Pepê. – Ela disse ao me olhar com um sorriso triste no rosto.
— Torcendo para que seja. — Respondi breve enquanto ela abria a porta de entrada da casa.
Assim que entrei, deixei minha mochila cair no chão e corri para ajudar minha mãe a descarregar as caixas e malas do carro. Era hora de começar a organizar tudo nos seus devidos lugares.
Enquanto arrumava minhas roupas no armário, me vi pensando no meu pai e em como ele era o maior exemplo da minha vida. O universo o tirou de mim cedo demais, e essa era uma ferida que eu sabia que jamais iria cicatrizar.
Antes de doarmos as roupas dele, agarrei o moletom verde escuro que ele costumava vestir, buscando conforto nas memórias que ele representava, mesmo que a saudade apertasse. Enquanto eu me envolvia naquele casaco tão familiar, os passos suaves da minha mãe ecoaram pela escada até pararem na porta do meu quarto.
— Com fome? Tem uma pizzaria aqui perto. Pensei em irmos até lá, o que acha? — Ela perguntou com um sorriso tentando dissimular a tristeza, mas seus olhos entregavam a dor que compartilhávamos.
O brilho momentâneo em seu rosto se desfez ao notar o moletom que eu vestia, um lembrete tangível da ausência que ainda doía.
— Ele faz muita falta, né? — Ela murmurou, a voz embargada pela emoção, enquanto desviava o olhar para evitar que as lágrimas escapassem.
— Sim, muita. — Respondi, sabendo que essa resposta ressoava não apenas para as perguntas dela, mas também para os sentimentos profundos que compartilhávamos naquele momento de luto e lembrança.
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AZUL - PEJÃO
Fanfictionazul no amor: contemplação, paz, paciência, emoções mais amenas e leves. era tudo que pedro precisava.