capítulo 3: Fog

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⚠️ Atenção, nesse capítulo contém leve menção de um ataque de pânico e descrição de um início de depressão, caso isso venha a ser um gatilho pesso para que fiquem atentos, as descrições sitadas estão nos parágrafos quatro e cinco. ⚠️

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Estava sentada na sala observando o fogo crepitar na lareira quando ouço passos nos fundos da casa,não me assusto e permaneço na mesma posição —dado o tempo que havia se passado eu sabia que era o Nicholas — ao me ver na sala ele hesita em continuar seu caminho,não queria conversa então apenas lhe lanço um olhar gélido, o que se mostra eficaz quando o vejo indo em direção ao quarto.

Ao ouvir o bater da porta deixo minha cabeça cair contra o encosto do sofá, a marca em meu ombro ainda queimava, sabia que não poderia fugir para sempre e que cedo ou tarde teria que enfrentar o que me aguardava, e que, quando esse momento chegar precisarei me manter firme.

Estava tão imersa em meus pensamentos que não noto o sono me dominando,apenas fecho os olhos e me permito descansar.

Acordo no meio da noite com o coração acelerado, batia tão rápido que era possível  escutar as batidas  dentro da minha cabeça, todo o meu corpo tremia, o ar parecia não chegar aos meus pulmões. Sinto lágrimas inundarem os meus olhos,e por mais que tentasse, não conseguia diminuir a pressão em meu peito,me sentia presa,não conseguia ao menos me mecher para descipar a sensação, era esmagador.

Leva um tempo demasiado longo até que conseguisse sentir o ar entrando novamente em minhas vias aéreas. Aos poucos vou me acalmando e tendo domínio sobre meu corpo,estava coberta de suor e lágrimas banhavam o meu rosto.

Sabia que a causa disso tudo havia sido um sonho,sonho esse que mesmo não me lembrando com clareza tinha uma vaga ideia sobre o que seria.

Não consegui voltar a dormir,então apenas permaneço sentada no sofá, usando o barulho do vento para me manter calma, episódios como esse não era incomum de ocorrer,porém,  desde a chegada dos meninos  que não passava por algo assim.

Quando o dia finalmente amanhece eu me sentia exausta,cansada emocionalmente, queria apenas permanecer deitada em algum lugar isolado onde nada pudesse me alcançar,queria simplesmente deixar de existir. Ansiava fechar meus olhos e não precisar mais abri-los novamente, queria alívio permanente para todo o meu tormento.

O som de pequenos passos contra o chão me trás de volta a realidade, quando ajeito minha postura no sofá vejo o Mael entrando na sala.

A visão é fofa,seu rosto tinha algumas marcas deixadas pelo travesseiro, os olhos ainda inchados de sono e seus cabelos apontavam em todas as direções, uma das pernas do pijama que ele usava estava dobrada até o joelho e ele havia perdido uma meia.

Ao entrar na sala ele parecia buscar algo com o olhar,quando me vejo na mira daqueles olhos cor de carvão sei que era eu que ele procurava.

— Bom dia! — já tinha percebido que ao me dirigir ao pequeno minha voz sempre saia um tom mais baixo,não conseguia entender o porquê, toda via, não era um fato realmente relevante para que eu tentasse desvendar.

Assim que ouve minha voz, Mael abre um enorme sorriso e corre para sentar no meu colo.

Ficamos um tempo nessa posição, era como se uma calma tomasse conta do meu corpo, o desejo de querer está só não passa, mas a presença calmamente dessa pequena criança parece me dá um pouco de conforto.

Do lado de fora a neve caía acompanhada de um vento frio, a lareira mantinha o interior aquecido, mas, ainda era possível sentir um pouco do frio que fazia.

Só percebo que o pequeno havia dormido novamente quando sinto o peso de sua cabeça em meu ombro. Aos poucos sua respiração se torna cada vez mais profunda e ritmada.

                                 ...       

Quando o terceiro mês do inverno chegou,sem que eu percebesse uma rotina havia se criado, pela manhã o Mael estudaria comigo enquanto o Nicholas faz os afazeres domésticos, durante a tarde o híbrido cuidava do pequeno enquanto eu treinava nos fundos da casa.

Não voltei a usar magia,e depois de lançar inúmeros olhares duros e indiferentes para o Nicholas ele parou de tentar questionar sobre o quão grande era o meu domínio mágico.

— Falta um mês. — o Nicholas fala se aproximando, estava sentada na frente da casa observando a neve enquanto tomo um pouco de chá. Ele não precisava especificar sobre o que se referia,eu sabia o que era,faltava um mês para que eles partissem.

— Vou notificar os anciãos sobre a partida de vocês. — me pronuncio sem olhar em sua direção.

Com o decorrer da estação o clima se tornou mais gélido, eu mesma só me arriscava a sair de casa se fosse realmente necessário ou quando os anciãos requisitavam a minha presença.

— Serei eternamente grato pelo que fez por nós. — em certos momentos, quando o Nicholas falava, tinha a sensação de está falando com o Asher. Ambos tinham uma aura calma mas ao mesmo tempo perigosa, como o antecipar de uma tempestade.

— Não preciso de gratidão. — digo me levantando — Vocês precisavam de ajuda,e eu ajudei, não há o porque agradecer.

— Ainda assim, não posso deixar de me sentir grato. — sua voz era suave e tranquila.

Deixo a xícara sobre o parapeito da janela e saio em meio à neve. Não ligo se minhas roupas não eram adequadas, ou se alguém desconfiaria sobre a possibilidade de eu fosse  uma herege, só precisava me afastar de tudo.

Não percebo em que momento começo a correr,apenas que em um momento estava na vila e no outro cercada por árvores.

Mesmo quando meus pulmões queimam em busca de oxigênio, não paro de correr, continuo sem cessar, queria apenas manter os pensamentos longe.

O que me incomodava não era os agradecimentos, era saber que tudo que fiz foi para amenizar o vermelho em meu passado. Queria  que quando morresse levasse comigo que ao menos uma única vez fiz algo bom, que não causei apenas mortes. Dois anos como mercenária foi o tempo o bastante para que eu criasse uma fama para mim, o nome Neve Escarlate ainda é fortemente mencionado, e cada vez que o ouço sinto ódio e repulsa. Usei o trabalho como mercenária para aliviar tudo que está preso em mim,para encobrir meus monstros, mas no fim, me tornei nos monstros que tanto temia.

Quando não consigo mais correr apenas me deixo cair contra a neve, fico ali deitada apenas olhando para o céu, hoje a neve não era tão forte,apenas delicados flocos de neve dançando no ar. Uma certa cessação de dormência dominava o meu corpo, e eu  não me sentia viva.

Volto para casa já a noite e estava coberta de neve, todo meu corpo estava gelado e sabia que o único motivo de não ter uma hipotermia era pela  magia glacial presente em mim.

Ao me aproximar da porta noto uma pilha de cobertores e antes que pudesse questionar o seu significado vejo o Mael sair e vir em minha direção, não penso e apenas o recebo em meus braços.

— Estou em casa. — falo o embalando, ouço um fungar e logo depois sinto uma umidade em meu ombro. Solto um suspiro e continuo indo em direção a casa.

Nas últimas horas fiquei tão focada nos meus pensamentos que esqueci completamente que um garotinho dependia de mim,esqueci que alguém me queria por perto depois de muito tempo.

Quando atravesso a porta vejo o Nicholas colocando a mesa de jantar,só então percebo o quão faminta estava.

O resto da noite é relativamente tranquilo, embora tenha tido que ficar com o Mael no colo até que ele dormisse. Embeve tudo isso acabaria, não demoraria muito para ser apenas eu e minha casa pequena de mais para três pessoas e grande de mais para apenas uma única pessoa.

Não estava ansiosa para descobrir o que eu seria no final da estação, sabia que jamais voltaria a ser quem era antes  desses dois entrarem em minha vida, só não saberia dizer se a versão que me tornaria era melhor ou pior que a antiga.

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