Tirando a venda dos olhos

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Meu corpo estava doendo muito quando acordei, meu coração ainda estava disparado com o que ouvi antes de desmaiar. Abri os olhos aos poucos me acostumando com a claridade já ouvindo uma discussão ao meu redor.

Quando consegui enxergar claramente a primeira coisa que vi foi Alexander dar um tapa na cara de Adeline e então Nicolas e Erick foram para cima dele o dando socos até que os guardas entraram ali e os separaram.

— Me solta! Vou ensinar a esse filho da puta que não se bater em mulheres! Covarde desgraçado!

Nicolas estava descontrolado xingando ele sem parar e os guardas quase não podiam conter Erick. Alexander tinha seu nariz sangrando mas ainda encarava Adeline com ódio.

— Meninos...- Os chamei fazendo notar que eu havia acordado e então os guardas o soltaram e eles vieram até mim.— Porque essa confusão?

Eu ainda estava zonza e minha voz mal saía, me sentia fraca demais para qualquer movimento mas ainda sim vi Adeline chorar no canto com medo de Alexander.

— Adeline...- a chamei mas ela apenas olhou para ele sem se aproximar.— Pode vir... venha aqui...

Ainda com receio e o encarando ela se aproximou da cama se sentando ao meu lado, segurei sua mão e ela estava tremendo o que aconteceu?

— Porque você bateu nela?!

— Porque ele é um covarde Flora eu juro por Deus que....

— Nicolas porfavor... sei que está com raiva mas não se resolve nada assim.. Alexander por que bateu nela?

— O médico disse que sua pressão subiu por causa da discussão que vocês tiveram, essa vadia quase matou o bebê.

— eu não... eu não queria... não era minha intenção eu sinto muito...

— Sente muito?! Ela teve um sangramento por causa de alguma coisa que você fez!

— Chega! Saía daqui, não quero que volte a tocar nela você entendeu?!

— Flora eu..

— Saía!

Ainda com raiva ele saiu do quarto com os guardas batendo a porta com força, Adeline estava tremendo e chorando mas eu sei que isso não foi intencional. Eu não sabia o que dizer agora que ela me confessou isso, não fazia ideia de que tinha outra irmã até meu pai dizer em seu leito de morte e nunca poderia imaginar que ela era essa irmã perdida.

— Porque não me contou antes? Porque não disse nada Adeline?

— Você sabia... meu.... meu pai me disse que sabia...

— Eu não fazia ideia Adeline, eu nunca concordaria com o absurdo de tratar você como uma criada sabendo tudo que você merece.

Ela se levantou da cama parecendo confusa, ela não acreditava nisso ela pensou que eu sabia esse tempo todo mas eu não fazia ideia disso.

— Do que vocês estão falando?

Erick perguntou confuso e isso me fez perceber que ela não tinha contado a eles o que aconteceu, acho que ela tem guardado isso por tanto tempo sozinha que simplesmente não consegue admitir a ninguém.

— Adeline é minha irmã.

— O que? Como assim?

— Meu pai me garantiu que você sabia Flora. Ele disse que foi um pedido seu que não contasse a ninguém e que não me colocasse ao seu lado como parte da realeza de Crosteana.

— Adeline percebe o absurdo? Me conhecendo você acha que eu seria capaz de dizer algo assim?

— E porque não? Eu sou... fruto de algo nojento... sua mãe amava Felipe, não era apenas mais um casamento arranjado ela realmente amava ele..

— Eu sei, e é uma pena que meu pai tenha traído esse amor. Mas você não tem nada haver com isso.

— Claro que tenho, eu sou o fruto disto. Minha existência é uma vergonha Flora e você também se envergonha disso.

— Eu não me envergonho de você, Adeline você foi como uma segunda mãe para mim. Me ajudou em tudo que foi possível, esteve ali por mim o tempo todo eu jamais teria vergonha de você.

Ela estava tão sensível que me dava pena, não consigo imaginar como deve ter sido para ela a vida toda olhando para mim e se comparando. Ela foi tratada como um animal mesmo sabendo que não deveria ser assim, ela nunca reclamou comigo, nunca disse o que estava sentindo...

Ela foi tão forte...

— Eu sinto muito por tudo que você passou, juro que se eu soubesse jamais teria permitido.

— Ele me tratava bem porque se sentia culpado por eu ser a criada.... minha mãe disse que ele a amava e que ela também o amava mas ele era o rei e estava casado com sua mãe por obrigação ao reino.

Meu pai era apaixonado por Madalena mãe de Adeline, ele teve que se casar obrigado com minha mãe e por isso ele não gostava de mim. Era visível a preferência que ele tinha por Adeline mesmo ela sendo apenas uma "criada". Meu pai me odiava por ser o motivo da separação entre ele e a mãe dela mas eu não tive nenhuma culpa disto.

— Minha mãe me contava as histórias deles antes dele se casar e ser o rei... parecia que ela estava falando sobre outro homem, ele era amargurado demais para ser o príncipe que ela descrevia.

— Adeline, a culpa não foi sua e muito menos minha... tudo isso foi uma fatalidade, a sua mãe e a minha se apaixonaram pelo mesmo homem mas não tiveram sorte..

— Você teve... não me entenda mal Flora mas apesar das surras e do mal gênio do nosso pai com você, precisa admitir que você foi quem se saiu melhor nessa situação.

— Diz isso pela posição social que tenho?

— Não, digo isso porque todo mundo ama você... agradeça por não saber o que é implorar para ter o amor de alguém.

— Eu implorei pelo amor do meu pai.

— Ele te amava Flora, ele só odiava ter que admitir que amava o fruto de uma mulher que ele não queria..

Adeline sabia muito mais do que estava dizendo, meu pai me amava? Como ela soube disso? E porque mesmo sabendo disso ela me deixou pensar o contrário? Ela me deixou matá-lo.

— Me diga o que sabe.

—...ele falava com minha mãe e quando ela morreu ele começou a desabafar comigo... ele não deixava você ser livre porque tinha medo da história se repetir.. tinha medo de que você se apaixonasse e que no fim das contas se casasse com alguém que não ama.

— ele estava me protegendo...

— Estava, ele não sabia como Flora... ele perdeu o controle quando viu você e o Nicolas na floresta, você estava destinada a Erick e ele pensou que tudo estava acontecendo outra vez... não foi intenção dele querer te matar mas ele ia.

— Porque?... porque mesmo me amando ele me mataria?

— Pra que você não sofresse como ele estava sofrendo..

Lembro do que ele me disse antes de me espancar "É para o seu bem", nunca fez sentido na minha cabeça mas agora eu entendo o que ele quis dizer.

— Me dá raiva a forma como você age Flora, teve o amor de todos a vida toda e mesmo assim quando alguém demonstra não gostar de você o mínimo possível você simplesmente surta querendo que eles gostem de você de qualquer jeito.

— Não é verdade.

— Não é? Porque fez aquilo no bar? Porque abriu a festa de casamento aos plebeus? Porque quase chorou ao ouvir as ofensas na porta da igreja? Está tão acostumada a ser amada que não percebe os privilégios que sempre teve.

Não posso culpá-la pela raiva que está sentindo de mim, Adeline saiu do quarto e eu fiquei ainda mais pensativa sobre isso, eu tenho sido extremamente egoísta. Ela sofreu a vida toda e embora não tenha sido por minha culpa se eu observasse um pouco mais a minha volta teria notado que algo estava estranho.

Mas eu estava presa demais na minha própria bolha.

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