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Não pude ver com clareza sua face, só enchergava seus olhos pretos marcantes e o longo vestido marsala com um casaco enorme que a cobria por inteiro.

-Está aqui para o emprego?

-Sim, senhora. -Digo me reverenciando.

-Ótimo, pegue o envelope que está na mesa a sua esquerda, dentro tem a quantia do quanto você ganhará por semana se trabalhar aqui. Dependendo do seu esforço esse dinheiro pode aumentar.

-Entendi, eu agradeço.

-Traga suas coisas amanhã cedo, se vai trabalhar aqui, precisa morar e ficar disposta o tempo todo, nunca se sabe quando precisarei dos seus serviços.

Aceno com a cabeça e saio de lá. Volto o mais depressa possível pra casa, pois já estava escurecendo, ansiosa mal pude abrir o envelope, estava muito animada pra contar tudo aos meus pais.

Assim que abri a porteira vi meu pai colhendo as verduras pra fazer o jantar.

-Paiiiii!

-Oi fia!

-O sinhô não vai acreditar, consegui um emprego!

-Não brinca! Que maravilha. Na onde?

-Na casa da Senhora do casarão. Ela me deu essa quantia pra cada semana que eu trabalhar. -Entrego o envelope.

Assim que ele abre, seus olhos se arregalam, ele treme e diz pra recusar o emprego e devolver o dinheiro.

-Que? Por que pai, não posso fazer isso.

-Por esse dinheiro vai saber que trabalho ela vai te dá minha fia, tenho medo de alguma coisa acontecer com tigo.

Abro o envelope e vejo 1200 mangos, a quantia perfeita pra poder chamar um médico e comprar os remédios.

-Pai agora vai dar pra cuidar da mamãe!

-Pois é minha flor...

-Não vou largar o emprego, mesmo que o trabalho seja difícil eu preciso dele. Vai da tudo certo pai.

-Mas é muito longe.

-Eu vou morar lá, ela disse pra levar minhas coisas, e quando der eu venho ver vocês dois. -Sorrio pra conforta lo.

-Deus te ouça fia.

Entro dentro de casa e conto para minha Mãe, que fica assustada e feliz ao mesmo tempo.

Entrego e dinheiro a eles e tomo um bom banho, logo em seguida me deito pra poder encarar o longo dia.

De manhã cedinho, antes de clarear, me despeço dos meus pais e vou para o trabalho.

O mesmo se repete, o portão se abre pra mim. Dessa vez quando entro na casa a senhora não está nas escadas e sim na sala de estar, sentada numa poltrona tal qual a posição só me permitia ver os pés e o topo da cabeça.

-Pode começar o dia plantando as flores que está no jardim dos fundos, só siga reto e abra a porta francesa. Quando terminar venha aqui que lhe darei mais uma ordem.

Aceno a cabeça em concordância e sigo para o jardim. Fico deslumbrada com tamanha beleza, cheio de rosas brancas por todo o local, as flores constratavam com as grande árvores altas e escuras que estavam além do muro, deixando o ar num tom de melancolia e vazio, aconchegante de certo modo.

Planto as mudas e volto pra sala.

-Quero que faça uma jarra de café e um bolo de massa branca, mas antes de ir pra cozinha quero que me ouça com atenção, pois só vou lhe dizer esta única vez. Entendido?

-Sim, senhora.

-Mesmo que tenha espalhado por aí que a vaga seria de doméstica, você não fará só tarefas relacionadas a isso, só irá limpar o que eu pedir e nada mais.

-Certo.

-Tudo que ver ou ouvir não pode sair daqui, ficará quieta com a cabeça baixa e manterá sigilo extremo ao que acontece. Não me desobedeça ou reaja de maneira idiota.

-De acordo senhora.

-Ótimo, depois me traga o que pedi e coloque seu uniforme, está no terceiro quarto ao lado das escadas, dormirá nele.

Faço o café e enquanto o bolo assa vou para o quarto, é bem bonito pra falar a verdade, simples comparado ao resto da casa, mas muito aconchegante.

Com uma cama de solteiro e uma mesa de canto abaixo da Janela, em frente um guarda roupa de duas portas e bem trabalhado com detalhes na madeira. O banheiro fica ao lado, pequeno, mas aconchegante, acredito ser até maior e melhor que o meu quarto. Não vou ter problemas pra dormir a noite.

Coloco o uniforme, que consiste num manto grande e branco, como um kimono cru.

Assim que o bolo assa, vou até a sala para servir o café. Preparo tudo com muito zelo, lembrei do que minha mãe me ensinou quando ela trabalhava em casa de nobres.

A campainha toca sem cessar, com o tilintar dos sinos ecoando pelo vento, parecia que eles iriam ser arrancados pela força que a pessoa balancava a corda. Mal abro a porta e um homem desesperado entra.

-Senhora! Eu suplico, por favor não faça isso, eu vou cumprir minha promessa, cometi um erro, foi um grande acidente! -Ajoelha aos pés dela.

-Repugnante... isso é o que você é.

-Eu? Sim! minha senhora, perdão!

-Não... você me dá asco! Idiota! -Vejo de relance sua perna se movimentar acertando a orelha do homem, que sangra por todo o chão.

Fico extremamente assustada e não consigo parar de olhar o pedaço da orelha que voou aos meus pés.

Pelo que percebo ela rasgou metade, Ela puxa pela orelha que sangrava e o leva ao jardim, onde mostra a ele as mudas que platei anteriormente.

-Já sabe o que significa não é!

-NÃO! SENHORAAA!

-Criada, vá limpar a sala e volte ao seu quarto, fique lá até que eu vá falar com você.

Limpo o mais depressa possível, minhas lágrimas escorrem pelo medo e pela realidade que ficou exposta em minha frente, podia ouvir claramente os gritos de dor e pavor do homem. Termino de limpar e vou para o quarto em choque.

Sentada na cama penso e repenso várias vezes sobre o acontecido, meu estômago revira só de imaginar o que estava acontecendo.

Lembrei-me de meu pai dizendo para recusar o emprego, mas logo me cortava o pensamento de minha mãe doente a beira da morte.

Adormeci depois que toda a cena de horror acabou, pelo menos eu espero que tenha acabado.

                           『••❈••』

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