Liga o fogo e ferve a água
O pó marrom e colocado no coador.
Lá fora chove e eu me enrolo mais no meu moletom. Sinto falta dos braços em volta de mim.
Pego a caneca de corujas no armário, sorrio lembrando do dia que comprei, esse tempo frio me deixa nostálgica.
As bolhas espirram na superfície do fogão, despejo o líquido quente e inalo o odor característico que me traz paz.
Eu costumava fazer café para nós dois antes de irmos trabalhar e nas tardes de domingo enquanto conversávamos na sala.
Observo o líquido cair no bule, de forma quase hipnotizada. Meu pensamento está agora nos relatórios atrasados.
Despejo o líquido na caneca, três colheres de açúcar porque de amargo já me basta a vida.
Gosto da sensação do vapor quente em minha face, e de como minhas mãos perdem a rigidez do frio. Talvez o café seja para mim o que o sangue costuma ser para um vampiro.
Me sento no parapeito da janela, sorvo o café como se minha vida dependesse disso, abro o livro na página marcada e aproveito meu momento de paz.
A chuva fica mais forte e eu penso que a essa altura o centro da cidade está alagado e agradeço mentalmente poder ficar em casa.
Na televisão vejo as notícias sobre o clima, o café começa a esfriar, talvez eu só me sinta sozinha demais quando você não está. Talvez eu só precise me distrair com mais trabalho.
Às vezes eu queria deixar de respirar. Então tomo café e sinto o meu sangue circulando e as ideias ruins me deixando.
Observo a várias canecas sobre a estante e penso que ultimamente tenho consumido mais café que o indicado menos que o desejado.
Não sei ao certo o que estou buscando, um infarto provavelmente.
Fico mais pensativa em dias frios e chuvosos e talvez o café seja a âncora que mantém presa realidade.
Observo que o líquido acabou e parto para cozinha em busca de mais, mais uma dose de vida ou do veneno que me matará algum dia.