Suficiente.

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O dia em que eu vi Anya e Kate saírem por aquela porta, foi um dia que eu amei e odiei a minha profissão. Meu ofício me fez capaz de trazer uma vida ao mundo, mas eu também sou tão boa nisso que elas estão saudáveis e podem voltar às vidas delas.


Eu também fiquei feliz e mais relaxada do que já estive por um longo tempo. Elas duas estão saudáveis, fortes e perfeitas.



Isso é pelo que eu trabalho.


Kate disse que queria ser vista por mim.



Eu estava eufórica também com o pensamento de que agora seria conveniente me deixar relaxar com Kate, mas eu também estou triste porque eu sei por um fato que é cedo demais pra qualquer coisa entre nós... não é justo... não enquanto eu tenho todo esse medo em mim. Kate era tão... ela parecia tão certa quando nos despedimos. Eu queria abraçá-la, confortá-la e dar-lhe a garantia que tudo ficaria bem para nós, mas eu tinha certeza que tudo seria diferente agora. Ela está passando por mudanças importantes e em casa tudo muda.


Quanto à minha pequena Anya, bem, vamos apenas dizer que eu não estava tão ansiosa para começar a trabalhar horas no meu turno depois que ela foi embora. Ela era uma chamada para que eu estivesse atenta. Eu me mantive no relógio dela por todos esses dias.



Hoje seria um dia comum, eu me manterei ativa através de tudo para não sofrer.



Eu verifiquei todos os prontuários destinados a mim. Nenhum parto mas muitos bebês nasceram nos últimos dias pelas mãos de outros médicos, muitas mães precisando ser cuidadas antes dos seus partos. Um dia comum.


Eu entrei no berçário para verificar o bebê que ainda está em observação, eu descobri o nome dele... John, finalmente eu me senti à vontade para verificar isso... Esse era mais um erro meu nos últimos anos... Eu estava tão imersa na minha dor que me impedia de fazer isso... Ele ainda tem mais uns dias enquanto a mãe se recupera, e por isso todos nós do hospital estávamos dando atenção extra a ele... Eu suspirei me sentindo triste porque nenhum outro familiar além da mãe estava aqui... mais uma vez me lembrei de Anya, minha garotinha da sorte... sim, eu agora posso dar esse passo importante, eu posso me dar ao luxo de ser mais próxima dele também depois de anos evitando todos os bebês, minha menina me libertou.



Anya... minha menina... um dia eu vou contar a ela tudo sobre como ela mudou a minha vida...



O jeito que ela tinha capturado meu coração tão completamente era assustador. Não deveria ter acontecido. Deixá-la ir foi como se estivesse rasgando minhas entranhas. Eu estou tão apegada, tão ligada a ela... Eu tenho certeza que estou apaixonada por aquela menininha quase zangada com o mundo mas perfeitamente doce comigo... e que reage a mim em tudo.


Eu me senti trêmula ao terminar de verificar o menininho no berçário e fugi dali para me trancar no banheiro e lavar meu rosto. Tudo naquele menininho me lembrava do menininho que eu perdi. Não. Eu não posso pensar nele. Ele não é meu. Eu tenho que voltar à minha rotina.

MY GIRLOnde histórias criam vida. Descubra agora