Existem algumas coisas que Missy poderia citar sobre si mesma, que a faria perder as únicas pessoas que ainda restavam em sua vida. Não era difícil pensar nelas. Diariamente sua consciência era atormentada pela culpa. Culpa de estragar tudo o que ela colocava as mãos. Culpa por seus fracassos. Culpa por seu estado atual. Culpas e mais culpas, infindáveis culpas...
A verdade, para ela, arruinava seu coração. A verdade sobre si mesma.
Às vezes ela gostava de se consolar. Dizia a si mesma que todos tinham segredos. Seus pais eram claramente pessoas que tinham muitos segredos, e quando ela os descobriu, ela os julgou. Agora ela também tinha os próprios, agora ela mesmo se julgava.
Era muito fácil se perder em sua dor diariamente. Era fácil se concentrar em suas mãos frias, nos batimentos descompassados em seu peito, às vezes, ela jurava que seu coração falhava. Era fácil desistir do dia, quando a dor de cabeça estava tão aguda a ponto de fazê-la fechar os olhos para que a claridade não os incomodasse mais. Na verdade, era fácil desistir de qualquer coisa, quando ela via que não tinha ânimo o suficiente para prosseguir com qualquer empreitada que começasse.
Ela sabia que não era normal. A vida de mentiras que ela vinha mantendo para si mesma e para os outros.
Isso também era fácil. As mentiras. Elas fluíam tão naturalmente, com tanta facilidade, como se fossem fatos. As pessoas confiavam nela e ela abusava disso. Se aproveitava disso. Era mais fácil ainda quando estava pela internet. Mentir através de textos sempre foi mais fácil para ela.
A imaginação de Missy, sempre fora sua maior arma, seu principal refúgio e inquestionavelmente uma grande armadilha para si própria, mas ela fazia questão de mantê-la consigo, afinal, era a única coisa que ainda a mantinha aqui.
Fingir que era uma garota que tinha câncer e com um relacionamento acabado, era quase natural, se ela não fosse assombrada pela grande verdade: ela era uma fraude. Tudo isso era mentira.
Tudo por atenção.
Ela não tinha isso de ninguém.
Mais solitária do que tudo, Missy costumava passar os dias em seu quarto trancada, passando seu tempo se divertindo em jogos onlines com amigos desconhecidos. Ela, de certo modo, preferia assim, era mais fácil manter a mentira de pessoas que não a conhecia pessoalmente.
Era mais fácil fazer com que se apaixonassem por ela dessa forma. Quando não conheciam seu verdadeiro eu. A garota fracassada que era.
Ela sentia que havia fracassado em tudo. Amizades. Família. Relacionamentos. Carreira. Absolutamente tudo.
Atualmente, ela apenas existia. Embora já tivesse tentado desistir de sua existência algumas vezes, e pensado na ideia mais vezes do que se pode contar.
Missy não era de longe a pessoa que parecia ser e ao mesmo tempo... era.
Apesar de rodear sua vida de mentiras, era sincera quando dizia se preocupar com outras pessoas. Quando se colocava no lugar delas. Era sincera quando via o sofrimento de indefesos e queria tomar alguma atitude para ajudar. Era sincera quando tentava ajudar uma amiga que estava sendo manipulada por outros, assim como ela costumava manipular. De algum jeito, ela achava que podia se redimir por tudo o que fazia. Afinal, ela tentava ser boa de um jeito, que ela não via ninguém mais sendo.
Mas ela sabia a verdade. Ela estava se enganando. Vivendo uma mentira principalmente para si própria.
O fundo do poço era real. Ela estava bem ali, presa. Sem se mexer. Fora engolida por uma escuridão tão sombria que não fazia ideia de como sair dela, embora soubesse que a direção para qual deveria seguir, estava logo acima. Apesar da obviedade dos fatos, não era tão simples escalar tantos metros. Lutar contra todos obstáculos seria tão desafiador quanto se manter naquele local frio e sem vida.
Mas ela precisava tentar.
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A Trágica Verdade Sobre Ela
De TodoPalavras estranhas de uma solitária. *Aviso de gatilhos*