01:43 a.m. - Casa de Igor Constino.
Igor derramou café dentro do copo plástico que soltava leves fumaças de sua temperatura, além da cor forte denunciando a alta quantidade de pó utilizado no preparo. Ao mesmo tempo, o homem tirou seu cigarro da boca fazendo com que as cinzas da nicotina queimada caíssem no chão. Então, colocou-o de volta entre os lábios e soltou uma longa nuvem do vício enquanto caminhava pela casa.
Ele encarou seu celular carregando no sofá e amaldiçoou a péssima condição de bateria que o aparelho portava. Tal qual um objeto de segunda mão, comprado em feiras de trocas, não poderia garantir eficiência por muito tempo de uso. E, claramente, descarregava muito rápido. Mas também, naquela noite cheia de coisas para fazer, Igor Constino queria avisar à Ayla sobre sua ausência em ir buscá-la, desculpando-se pelo ocorrido. Se bem que isto não era algo que a garota fazia questão, mas deixá-la andar sozinha tarde da noite não parecia muito conveniente no ponto de vista do seu namorado.
Além dos bêbados que importunavam vindos de botecos ou bares de esquina, ainda saltava na mente de Igor o "playboyzinho" da família Almeida. Aos olhos do homem, Cássio era o tipo de rapaz insuportavelmente querido pelas pessoas ao seu redor. Sempre recebendo elogios, sempre sendo paparicado e admirado por seu esforço, mesmo tão jovem.
Deitando-se na cama, Igor recordou de quando trabalhava no restaurante do Val e observava Cássio andar de uma lado para outro junto com as cozinheiras. Como faltava um funcionário no atendimento, o garoto agia mais prestativo que o normal e certa vez, até se ofereceu para ajudar Igor a desossar as carnes. Claro, o empregado vestido de branco, todo ensanguentado, recusou. Mesmo nessa hora, Igor passou o olhar de cima a baixo no corpo à sua frente notando que Cássio já tinha traços firmes no físico, embora Valdo fosse um baixinho detestável, seu filho era alto e de bom porte. Ainda sim, jovem o suficiente para ser jogado de lado com um tapa na orelha.
"Inseto nojento", Igor julgou na época, fazendo uma expressão de repulsa, ao tempo em que Cássio caminhou parando perto das empregadas e ajudou-lhes com as panelas ferventes no fogão industrial. Analisando tudo isso, estava o açougueiro nos fundos do restaurante, um lugar reservado para fazer seu trabalho "sujo", com pingos de sangue espalhados nas paredes de azulejo branco, bem como as poças formadas no chão do mesmo revestimento. Um animal pendurado no teto já tinha sido desmembrado parcialmente com sua carcaça girando conforme um objeto de luxo exibido em lojas de grife.
Naquele dia, Igor Constino desejou ardentemente um cigarro, mas era proibido fumar durante o horário de trabalho.
Irritado, ele sentou num banquinho de madeira perto da parede e encarou mais duas costelas bovinas que faltava finalizar. Fora os suínos que vinham separados no final de semana quando as cozinheiras preparavam alguma receita que necessitasse de um corte mais apropriado. E, foi nesses minutos, que Igor refletiu se havia sido uma boa ideia ter aprendido aquele tipo de serviço quando morava no campo com a família. Se bem que não teve muita escolha para negar, já que Ramiro Constino, seu pai, buscava levar todos os filho para conhecer os esforços da vida desde cedo na idade.
Seus pais nada mais eram do que agricultores que viviam a base de tudo que produziam nas terras onde moravam. Fossem animais, plantas, frutas, verduras e qualquer coisa que pudessem aproveitar desses recursos. Seu Ramiro e Dona Vânia vendiam para vizinhos, compradores nas feiras locais ou até mesmo viajavam para outro lugar mais próximo oferecendo suas mercadorias por um valor considerado, garantindo a qualidade...
" - Olha isso, Donalto! - Ramiro ergueu um pedaço gordo de lombo suíno aos olhos de um cliente. - Fresquinho, fresquinho! Igor quem cortou logo cedo.
O ouvinte olhou para o menino magro e carrancudo escorado na ripa que sustentava a barraca onde estavam. Naquele tempo, Igor exibia uma feição completamente diferente da qual portava nos dias atuais. Sem nenhuma pista de barba no rosto, o cabelo sempre cortado baixo a pedido de sua mãe toda vez que iam no cabelereiro, roupas reutilizadas por dez primos até chegar em suas mãos, além das botas velhas dadas por seu pai. No entanto, seu orgulho consistia num chapéu de couro legítimo, presente de um amigo artesão da cidade. Profissional hoje já falecido.
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Caixa de Pandora
Ficción GeneralNOTA DA AUTORA: " ATENÇÃO: ESSA OBRA POSSUI DESCRIÇÃO DETALHADA DE TEMAS COMO DROGAS, USO DE ARMAS, AGRESSÃO, ABUSO SEXUAL E PSICOLÓGICO, CÁRCERE PRIVADO, ENTRE OUTROS ASSUNTOS SEMELHANTES. SE VOCÊ FOR SENSÍVEL À ESSE TIPO DE CONTEÚDO, NÃO LEIA!." ...