Prólogo | Garotos rudes fazem melhor

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Sim Jaeyun — ou como preferia, Jake Sim — havia se mudado da Austrália para a Coreia do Sul há cerca de um mês. Ainda estava lutando para se adaptar àquele novo ambiente, novo lar, nova cultura, e a temperatura mais baixa que a de seu país. Considerava-se mais estiloso no outono e no inverno, mas mal podia se movimentar confortavelmente, vestindo tantas camadas de roupas as vezes.

Apesar de querer permanecer no conforto de sua residência, que possuía uma lareira para ajudá-lo a se manter aquecido, precisava buscar por inspiração para seu livro nas ruas, já que sua cabeça não estava conseguindo produzir nada sozinha, nada além de um grande e silencioso vazio, tornando as madrugadas um pouco mais assustadoras.

Era mais ambicioso do que gostaria de admitir, pois queria escrever algo que cativasse as pessoas, palavras que mudariam uma vida ou apenas a percepção que tinham dela. Se quisesse isso, precisava se arriscar e ser ousado, já que, em 1998, qualquer coisa fora do padrão viraria uma grande polêmica. As vezes, imaginava como seria ter seu nome metido entre um escândalo, e se perguntava se isso lhe traria mais reconhecimento.

Sua mãe não confiava em seu sonho e sempre deixou isso nítido. Dizia que escrever não é para qualquer um, e talvez ele não conseguisse realizar o desejo de conquistar o coração de alguém através de palavras ou fazê-las morar em sua mente, repetindo-as como um mantra ou como uma lição de vida. Entretanto, ele queria provar que ela estava errada, e faria qualquer coisa para isso. Queria poder enviar a ela um livro com seu nome na capa e sua biografia na última página. Até porque ele não era "qualquer um", era seu filho.

Foi pensando nisso que ele criou determinação para jogar um casaco por cima da blusa preta de gola alta, que também cobria boa parte de sua calça cinza, e sair de casa em busca de detalhes irrelevantes para transformá-los em ideias grandiosas. Enfiou as mãos nos bolsos para protegê-las do frio, e caminhou pelas ruas escuras sem saber para onde ir, esperando que algum milagre divino lhe guiasse para o caminho certo e o impedisse de se perder.

Nada. Nada nas ruas. Nada além de uma escuridão gélida e silenciosa, onde não vagava nenhuma alma. Odiava não encontrar o que procurava, mesmo que não precisasse se desesperar tanto por isso, afinal, tinha apenas vinte anos, o que significava que tinha tempo suficiente para escrever seu livro. Talvez essa sensação partisse da vontade de mostrar à sua mãe que ele era capaz de ser um bom escritor.

Após andar mais um pouco, encontrou um bar aberto, um tal de Full Moon, e não hesitou em adentrá-lo, embora o local parecesse um pouco insalubre, deixando-o curioso para saber que tipo de pessoa o frequentava. O forte odor de álcool, cigarro e outras coisas que ele preferia não descobrir o que eram, invadiu suas narinas, fazendo-o torcer o nariz em uma incontrolável expressão de nojo.

Queria se sentar longe dos velhos bêbados, não apenas porque eles lhe assustavam, mas porque queria ter uma visão mais ampla do local e dos rostos presentes nele. Qualquer coisa que pudesse anotar em seu bloco serviria, mesmo quando precisasse forçar a vista na tentativa de enxergar o que estava rascunhando com a caneta, já que a iluminação dali não era uma das melhores.

Queria afogar sua frustração em um copo de vodca, mas não percebeu quando ingeriu muito mais do que apenas um. Ele eliminou o líquido da garrafa inteira enquanto colocava seus neurônios para funcionar, mas quanto mais pensava, menos ideias surgiam. Jake Sim era um paradoxo. Um paradoxo ganancioso.

Involuntariamente, sua perna balançava junto dos acordes da guitarra, que agora começavam a tocar Ava Adore de The Smashing Pumpkins, antes de uma voz masculina soar no microfone em cima do palco. Jake começou a analisar o guitarrista de cima a baixo, sem deixar de apreciar o belo som que ele produzia com perfeição.

Cabelos vermelhos, uma camiseta preta que dizia "Rude boys do it better", uma calça jeans preta rasgada nos joelhos e levemente desbotada, talvez porque o garoto a utilizasse com frequência, e um par de All Stars vermelhos sujos. Um lápis preto contornava seus olhos redondos, mas não era o único traço chamativo em seu rosto, pois seu nariz parecia ter sido esculpido por anjos com mãos tão habilidosas quanto as suas, deslizando os dedos pelas cordas do instrumento.

cartas e acordes • heejakeOnde histórias criam vida. Descubra agora