Desprezível

67 5 0
                                    


Mais um dia desprezível começou.

Sou um rapaz simples, eu diria,  sou esbelto, tenho pele clara, cintura muito bem desenhada e cabelos escuros. Tudo seria simples e perfeito como em qualquer outra família em Arnhil. Tudo. Se não fosse pelo título de Príncipe.

O sol invadiu as janelas do meu quarto logo cedo e eu me praguejei por ter esquecido de fechar as cortinas antes de dormir. Passei alguns minutos encarando o teto e enrolando antes de finalmente levantar da cama. Mais um dia inciando com a mesma vontade de sempre: continuar deitado até o meu corpo e o colchão se fundirem e tornarem um só.

Dei uma rápida arrumada na bagunça do meu quarto e respirei fundo antes de descer as escadas. Não tenho sequer coragem de obrigar as empregadas do castelo a arrumarem a bagunça que eu mesmo fiz, me recuso a fazer isso.

Não aguento mais essa rotina repetitiva, minha única vontade é ir dormir vivo e não acordar mais. Certo, essa frase parece um tanto mórbida e exagerada, mas, como diz aquele velho ditado: não julgue um livro pela capa. Esperem até descobrir pelo que eu passo pra me julgarem e me chamarem de egoista.

Mas infelizmente hoje eu acordei e preciso fazer minhas obrigações. A primeira coisa: tomar café da manhã. Não sinto fome há anos, apenas me acostumei a comer pra não ficar fraco o resto do dia. Tenho treino mais tarde e algumas aulas, não posso me sentir mal ou vou ouvir boas palavras por isso.

Vou direto pro salão de banquetes. A mesa está posta com inúmeras comidas, chega a ser exagerado. Os guardas estão pelos redores, cada um está mais equipado que o outro. Suas roupas de couro, suas armaduras de metal e suas enormes espadas afiadas deixam o clima esquisito, nunca vou me acostumar com isso e com o sentimento frio que eles transmitem. Os guardas reais são treinados desde cedo a nunca demonstrarem seus sentimentos ou criarem vínculo com os membros da família real. Eu odeio isso.

Meu pai não está no salão, o que significa que eu não sou obrigado a comer aqui. Pego um pãozinho e uma xícara com café e vou pra minha salinha reservada. É um dos únicos espaços em que tenho privacidade, a partir do almoço, estou com o meu tempo todo reservado pros afazeres reais.

É uma salinha simples com prateleiras de carvalho cheias de livros e um candelabro pra iluminar. Há três sacos de penas confortáveis  jogados em um enorme tapete de algodão florido que cobre todo o chão, também tem duas cadeiras almofadadas no canto.

Entro na sala e vou até aquelas prateleiras de carvalho refinado. Pego um livro que comecei a ler há pouco tempo e me sento no tapete, afundando o meu corpo naqueles sacos de penas confortáveis. Livros, conforto e paz: as únicas coisas pelo qual vale a pena continuar vivo.

Passei algumas horas lendo em silêncio, só parei quando a foi aberta de supetão. Meu pai apareceu na porta com os dois cães de guarda dele, nenhum deles estava com uma boa cara.

—Pai? — deixo o livro no canto e suspiro. O que ele quer agora?

–Você  vai ficar aqui o dia todo? — sua voz grossa e rude continua a mesma de sempre. —Como pretende conquistar a coroa? Você continua com as mesmas atitudes ridículas de sempre, Taehyung.

O meu pai, o Rei Arthur, é um homem tão amargo que se recusa a passar o reinado pra frente, ele acredita que eu nunca vou ser capaz de virar o rei de Arnhil e governar do jeito certo. Além disso, ele é ambicioso e se recusa a perder o poder. Quando a minha mãe morreu na última guerra que o reino enfrentou, ele se fechou ainda mais. Não que algum dia tenha tido empatia, mas as coisas pioraram desde então.

LuminaOnde histórias criam vida. Descubra agora