Parte 2 - Esperança

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Embora a situação atual lhe parecesse terrível, lembrava-se de que o mundo nunca fora um mar de rosas.

Talvez fosse seguro para Yoongi afirmar que desde o princípio as coisas estivessem tomando um rumo sem retorno, seguindo por esse caminho que não lhes daria outro resultado se não aquele tão desastroso, e tudo que o ser humano precisava era apenas de um pontapé inicial para que se sentissem livres para serem​ e fazerem o que quisessem – provavelmente por isso essa história de livre-arbítrio não houvesse sido uma ideia magnífica, pois se o homem tem a possibilidade de escolher, nove de dez escolherão o errado por puro hedonismo.

O homem sempre tivera uma inclinação para o pecado desde o início dos tempos, um desejo irresistível pela ideia não apenas de domínio dos mais fracos como também de isenção de seus erros, então Yoongi acreditava que não deveria ter se surpreendido quando o tal fruto proibido, agora sob o pseudônimo de "Revolução Libertária", fora oferecido a humanidade moderna, a decisão de prová-lo havia sido quase unânime. A tentação estava uma vez mais fazendo com que aqueles que se julgavam criaturas tão púdicas e bondosas caíssem com o lufar de um simples leque de possibilidades, de uma rebeldia e um poder que nunca havia sido estendido em todas as suas enfadonhas vidas, e eles agarraram a oportunidade sem ao menos pensar nas consequências, sem se preocupar com o que as suas escolhas fariam com a vida alheia ou mesmo com o mundo.

Afinal, era a chance única de serem egoístas pela primeira vez.

Lembrava-se bem da época em que ainda podia julgar comum em sua pré-adolescência, quando o movimento em prol da própria miséria havia se iniciado e a mídia tachava os apoiadores como "baderneiros" – e isso havia sido logo após mostrarem como a grandiosa crise que enfrentavam havia afetado não apenas a economia mundial, como também a vida das pessoas, focando suas câmeras em cidadãos desafortunados que haviam morrido congelados na calçada graças a aquela recessão causada pelas catástrofes naturais que os impediram de manter suas​ antigas​ moradias​; nas crianças moribundas que imploravam por um pouco de comida e os pais que recorriam à medidas drásticas para impedir que seus filhos tivessem um fim semelhante...

Ninguém havia conseguido escapar daquele profundo desfalque econômico, nem mesmo a família Min, que havia perdido grande parte de sua fortuna com o último furacão que simplesmente arrasara com a fonte de sustento deles, obrigando seus pais a transferi-lo para uma escola pública em um bairro vizinho para poderem​ manter uma vida estável até que conseguissem refazer seus negócios. No fim, eles nunca tiveram a oportunidade.

Yoongi sempre caminhava calmamente pela calçada de concreto próxima a avenida principal, por onde os carros passavam zunindo com seus sons ligados ou apenas uma conversa entre amigos e/ou familiares que ajudavam a criar aquela cacofonia urbana comum; o baixinho estava sempre de cabeça baixa e as mãos escondidas nos​ bolsos​ de um moletom ao que seus fones soavam uma música punk rock em um volume que poderia ser julgado prejudicial por uma infinidade de médicos, passando entre inúmeras pessoas que pareciam sempre ter pressa, alheias ao curso irremediável que o mundo tomava e ao jovem de passos lentos.

Provavelmente houvera uma época em que os crimes eram tratados como se deviam; como atos hediondos que mereciam a penitência adequada – assassinatos deviam horrorizar a sociedade, nessa época, roubos em algum dia foram vistos​ com maus olhos e deixaram​ toda uma massa indignada a clamar por justiça. Entretanto, recordava-se perfeitamente que naquela década em que vivia não era mais assim, que crimes desde os mais insignificantes até os mais repulsivos haviam se tornado nada além de algo rotineiro, atos comuns do dia-a-dia e tratados como nada além de trivialidade do cotidiano.

Talvez houvesse sido nesse ponto que Yoongi devesse ter percebido qual seria o próximo passo, que a linha da civilidade humana era demasiadamente tênue e facilmente rompível quando as necessidades do "eu" eram colocados em questão, quando seus próprios anseios eram pesados em comparativo ao de outros. Tudo, por todos esses anos, não passara de mera convenção social que era apenas repetida para que se mantivesse um padrão aceitável em prol da permanência daquela dinâmica sociável.

Lone Wolf - YoonKookOnde histórias criam vida. Descubra agora