Parte 4 - Alicerce

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Sentimentos eram uma coisa engraçada.

Embora fossem mais uma dessas coisas descartáveis no tipo de mundo em que habitavam, talvez Yoongi pudesse afirmar que estes eram de fato mais uma incontrolável e irreprimível força da natureza – embora humana – da qual não existia uma forma de contenção específica ou muito menos alguma escapatória definida que pudesse impedir sua invasão e evolução. Poderia até mesmo afirmar que uma tentativa de fuga seria como trilhar um labirinto confuso e interminável que provavelmente lhe guiaria para ainda mais fundo naquilo que preferia evitar; afinal era uma escolha sensata e deveras cautelosa quando se tinha em mente o circo de horrores que vivia e presenciava todos os dias, um lugar que não teria piedade em massacrá-lo no primeiro indício de fraqueza – e sendo assim, coisas como sentimentos já não tinham mais o seu espaço por serem vistos como um "calcanhar de Aquiles" em potencial, a temida falha na armadura que faria até o maior dos guerreiros sucumbir; e o baixinho poderia sem sombra de dúvidas apontá-los como o maior dos assassinos durante o início daqueles tempos sombrios, grande causador da exponencial queda da população – quiçá até mais do que terremotos, tornados, furacões e quaisquer fenômenos naturais que já tocaram aquele mundo abandonado por todos os deuses que a humanidade já acreditou.

O próprio Yoongi tivera a sua parcela de perdas.

Porém, mesmo com todos os golpes que a vida pudesse atirar contra um ser humano, ou independente do quanto tentasse se moldar até um padrão que lhe impedisse de fraquejar perante quaisquer eventualidades que apelassem para o seu lado humanitário, que treinasse a si mesmo para não sentir e talvez até buscar extirpar a fonte de tamanho mal; esses dariam um jeito de se infiltrarem de volta para dentro de si antes que pudesse ter consciência, sem qualquer comiseração por sua situação delicada ou as consequências que poderiam lhe acarretar.

Yoongi poderia apontar todos os motivos pelos quais deveria ser impossível para si desenvolver qualquer tipo de afeição, amabilidade e derivados que pudesse caracterizar como positivo e que tivessem como alvo um outrem – sob a perspectiva de bom e ruim que existia antes – e até então o garoto mal se considerava humano. Possuía memórias frágeis de um mundo que costumava ser verde e nuvens que já foram brancas, e se pudesse ser extremamente sincero consigo mesmo poderia afirmar que se lembrava pouco de como era antes de tudo. O mais novo mal se lembrava de como era se sentir vivo, a maior parte do tempo sentia-se como aquele sopro de vento que lhe cingia em um abraço familiar todas as noites, ambos sozinhos e existindo como a ausência de qualquer outra coisa.

A única existência da qual se lembrava até então era aquela que lhe fora dada sem qualquer consentimento, um eco do que costumava ser. Passara dias desejando estar morto e noites se perguntando se já havia morrido, pois mal sabia qual era a diferença.

Agora passava seus minutos com a preocupação lhe corroendo por dentro, questionando-se se poderia se considerar ridículo por comparar a forma com que o mais velho fizera surgir emoções indesejadas em si com o avanço de uma maré, mas não podia deixar de afirmar que era a melhor analogia para explicar sua trágica situação de impotência perante o lento e implacável crescimento de sua afeição com relação a Jeongguk. Iniciou-se com suaves ondas que beijavam a areia da praia com movimentos graciosos, estas que inesperadamente foram aumentando de tamanho sem que tivesse consciência, até que fosse tarde demais e aquele terrível imprevisto já houvesse inundado cada fibra de seu ser o bastante para até mesmo influenciá-lo em suas decisões e considerações.

Antes que pudesse estar consciente do que estava acontecendo, Jeongguk já havia se tornado alguém de grande estima para si.

As semanas se passaram mais rapidamente do que Yoongi pudera perceber, os minutos desmoronando como os grãos de areia pertencentes à ampulheta trincada que detinha o tempo daquela terra fúnebre por onde o baixinho tropeçava com seus pés incertos. Ele já não podia quantificar com perfeição quanto tempo estavam juntos em uma parceria que impressionantemente funcionava, mesmo que o Min ainda não falasse o suficiente para manter uma conversa com pouco mais que dez frases, mas o moreno mais velho não parecia se importar desde que o seu dongsaeng continuasse a interagir consigo sem hesitação, como o fazia atualmente.

Lone Wolf - YoonKookOnde histórias criam vida. Descubra agora