Capítulo 1

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Pérola 🤎

                                                               Rocinha, Rj.

Minha relação com os meus pais sempre foi muito boa, na verdade, com a minha família inteira por parte de mãe era desse jeito. Meu pai era o meu super herói, e o do Breno também. Minha mãe era a minha inspiração, pensa numa mulher forte, era ela. Ambos eram guerreiros, nunca deixaram nada faltar pra mim e pro meu irmão. Morávamos lá em Salvador, e puta que pariu, que saudade desse tempo. Samba de viola em família, churrasco, cerveja, piscina e muita gente bêbada resenhando. Isso quando não juntava eu e minha prima Celine pra dar perdido na minha mãe quando a gente queria ir num paredão, quando ela ia passar as férias lá em casa. Nossa família era a denominada tradicional, mas infelizmente isso teve um fim cruel. Meu tio e o meu pai brigavam muito em todos os churrascos, mas nesse dia isso tomou um rumo que ninguém esperava. Breno estava sentado no sofá, jogando free fire, enquanto eu estava encolhida nele com as mãos tapando os meus ouvidos. Era assim que a gente tentava cuidar da sanidade mental um do outro, ficando lado a lado. Até parecia que a gente sabia que no final tudo que nós iríamos ter, era a nós mesmos. Nós ficamos assustados quando ouvimos um barulho de garrafa sendo quebrado, e havia sido o meu pai, ele quebrou uma garrafa de cerveja na cabeça do nosso tio. E se eu não me engano, tudo isso era por conta do casamento dos nossos pais, pois o meu tio nunca foi a favor deles dois juntos, e ninguém sabe o por que. A única reação que eu tive, foi agarrar o Breno com força e esconder meu rosto no peito dele, enquanto as minhas lágrimas desciam. Meu tio estava caído no chão, meu pai estava parado, incrédulo. Minha mãe estava desesperada, gritando com o meu pai, que não respondia nada, e todos os outros familiares xingavam e tentavam ligar pra ambulância.

Breno estava me abraçando com força, tentando me acalmar, enquanto analisava todo aquele caos. Ele tremia, ele também estava desesperado, mas não queria demonstrar fraqueza. Depois de ter gritado e dado uma sequência de socos no peito do meu pai, minha mãe respirou fundo e o puxou para irmos embora. Confesso que não entendi, ele da uma garrafada no meu tio e sai assim? Ileso? Eu entendo perfeitamente ele, pois meu tio enchia o saco desde que eles começaram a namorar, isso a décadas atrás. Mas eu esperava que a minha mãe fosse surtar, sabe? Não que ela não tenha surtado, mas eu esperava mais. E o pior foi que ninguém tentou impedi-lo de ir embora ou algo do tipo, eu fiquei apavorada por que esse caso é um caso de delegacia, gente, meu pai poderia ser preso.

Entramos no carro, e com receio, coloquei o cinto de seguranças. Encostei a cabeça na janela do carro, e senti a mão do Breno tocar a minha, no intuito de ainda me manter calma. Ele é o melhor irmão que eu poderia ter. Seguimos o caminho para casa tranquilamente, por incrível que pareça. As vezes eu olhava pro Breno e ele me olhava de volta, mas de forma apreensiva, como se estivesse com medo. E o olhar dele fez jus ao que aconteceu...
A pista estava vazia, totalmente limpa. Mas quando menos esperamos, nosso pai teve um surto, ele começou a chorar, se bater, bater no volante e gritar dentro do carro. Ficamos desesperados, meu irmão gritava pra ele parar com aquilo, e a minha mãe chorava desesperadamente. Eu tapei meus ouvidos e me encolhi no banco, chorando muito. Nosso desespero só aumentou quando um carro veio em cheio e se chocou com o nosso, fazendo ambos capotarem.

Acordei com o Breno gritando dentro do carro, estávamos de cabeça pra baixo e o fedor da gasolina estava forte. Quando me viu abrir os olhos ele agradeceu aos deuses, e tentou me puxar pro lado de fora. Tudo estava girando, meus olhos pesavam e minha cabeça doía e sangrava. "Essa porra vai explodir" foi o que eu ouvi o meu irmão gritar. Tentei ser o mais ágil possível, e numa tentativa falha de acordar nossos pais, nós dois começamos a chorar desesperados. O carro iria explodir, iria explodir com os nossos pais dentro. Eu falei que não queria sair, eu queria morrer, queria queimar. Eu preferia isso do que viver sem os meus pais. O Breno me sacudiu, e disse que era pra eu sair do carro. Lágrimas caíam dos meus olhos desesperadamente, eu não podia perder ele agora, já basta os nossos pais. Ele disse que era pra eu sair primeiro, que iria ver se os nossos pais ainda estavam vivos. Com muita dificuldade, aceitei e pulei a janela do carro, mas fraquejei minhas pernas e pisei em falso. Fui engatinhando para longe do carro, sentindo tudo ficar turvo em minha visão. Quando passei a mão por dentro dos meus cachos, pude ver o sangue na minha mão, estava realmente sangrando, e muito. Minha coxa estava com um corte que também sangrava muito, mas fora isso nada em mim estava machucado, só muito dolorido, provavelmente iriam aparecer alguns hematomas.

Breno estava se aproximando de mim, com uma feição nada agradável. Com a voz falha, me disse "eles se foram" e me abraçou forte. E lá estávamos nós, sentados na pista, ensanguentados, chorando abraçados, perto de ver o carro onde os nossos pais estavam explodir. E assim aconteceu, dentro de minutos uma chama de fogo imensa tomou todo o carro, e logo depois uma explosão horrorosa aconteceu. Eu gritava, eu gritava muito. E o Breno estava abraçado comigo, mas dessa vez, ele não tentou disfarçar, ele realmente demonstrou fraqueza, e desabou junto comigo. E foi assim, que o dia 13 de outubro de 2021, se tornou o pior dia da minha vida.

[...]

E a nossa vida tomou um rumo totalmente diferente, tivemos que nos mudar pra o Rio de Janeiro, para morarmos com uns irmãos do meu pai, já que a família da nossa mãe literalmente nos culpou pela morte deles dois, nos chamando de inúteis, por não ter tirado eles do carro, sendo que mais alguns minutos que nós ficássemos lá, nós teríamos queimado também. Falei com a nossa prima Celine, e ela disse que seria de boa gente ir morar com ela e com os pais dela. A gente não sabia quem eram os pais dela, já que ela sempre ia lá pra casa sozinha. E inclusive, eu preferia ficar sem conhecer...

Eles moram na rocinha, bem lá no morro. Confesso não ser acostumada, já que nós morávamos num bairro super aconchegante. Não era de rico, mas nós também não vivíamos nas situações das favelas, por exemplo. E bom, agora nós vivemos.

Hoje em dia o Breno só quer ser chamado de Bn, e antes que se perguntem, sim, ele entrou pro mundo de crime. Mas como todo criminoso, ele não entrou por que quis. Ele entrou por que nossos tios são irresponsáveis, nossa tia deve a todo mundo da favela, inclusive aos traficantes, e o nosso tio...eu tenho o maior nojo dele, ele já me assediou diversas vezes, eu me sinto podre graças a ele. Eu sinceramente não sei como a Celine aguenta, e ela não aguenta, na verdade, ela diz que se sente envergonhada pra família que tem, e que quando meus pais eram vivos, o sonho dela era ir morar com a gente. Eu a entendo perfeitamente.

Hoje tenho 19 anos, finalizei meus estudos aqui, e to juntando dinheiro pra minha faculdade. Quero muito ser professora de história. Mas por enquanto eu faço uns bicos de nail designer, é um dom que eu tenho. O Breno insiste em dizer que quer me bancar, pagar minha faculdade e blablabla, mas eu não vou deixar, não mesmo. A Celine tá lutando pra abrir o estúdio dela, de unha, sobrancelha e tudo mais, ela ama isso de estética, sabe? Mas todo dinheiro que ela junta, a mãe dela rouba pra pagar as dívidas, direto eu vejo ela chorando pelo dinheiro sumido.

Breno não quis finalizar os estudos, inclusive, ele é braço direito do dono do morro, e esse cara eu nunca vi. Eu mal saio de casa aqui, não me sinto bem, me sinto suja, não sei dizer. Celine as vezes tenta me arrastar pra algum baile, mas eu não tenho nenhum ânimo pra isso. Mas todas falam que esse cara é um gato, pique galã de novela. Mas eu duvido muito.



Celine, 22 anos

//Primeiro cap com a história da nossa querida Pérola saiu!!🥳

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