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Fruto do amor entre dois Deuses poderosos, porém solitários nasceu uma estrela, uma pequena esfera luminosa, estática, sem vida.

A pequena esfera foi deixada perto das irmãs, pendurada no manto flutuante em constante expansão. Elas iluminavam a escura galáxia, testemunhas do amor incondicional e incansável dos progenitores amantes pelo tempo infinito da sua grandeza.

Eles eram responsáveis por criar e cuidar de todos os mundinhos, esferas maiores de origem divina mais elevada. Por sua vez, outros Deuses inferiores eram encarregues de organizar, limpar e dar a vida a formas minúsculas dentro desses mundinhos aquecidos pelas esferas flutuantes.

Um erro nas classes inferiores levou a um tremor estranho que assolou o universo e as dimensões existentes sofreram uma distorção moldando-se e modificando-se daquilo que eram anteriormente. A estrela escorregou de onde estava e caiu numa espiral sem fim que se contorcia sobre ela mesma e desaparecia num vazio absoluto. A esfera desceu a toda a velocidade. Por alguma razão saiu da rota afastando-se da espiral e caiu em queda livre na direção da terra, uma massa gigante criada durante o terremoto espacial, fruto da junção de vários mundinhos, formando uma grande cratera no solo pobre e granuloso daquela aberração.

A sua casca exterior derreteu devido à pressão. A camada posterior desfez-se e assim sucessivamente até sobrar uma única grossa parede que separava o interior do exterior.

Naquele mesmo lugar, sobe a luz refletida por uma massa rochosa mais pequena, instalou-se uma esfera envolta em pedra que acabou coberta por uma grossa camada de gelo graças ao inverno rigoroso. Este último, fruto da distância imensa entre a Terra e os seus pais que acabaram por esquecê-la, demasiado preocupados em reorganizar as outras esferas mais bonitas e menos "problemáticas", e todo o espaço-tempo a anos-luz de distância.

Nas terras abandonadas pelos Deuses, permaneceu envolvida na água sólida até que a primavera desfizesse o que o inverno havia feito. Agora a cratera era uma lagoa límpida que pouco a pouco foi invadida por pequenos répteis e animais aquáticos ao longo dos milénios enquanto a evolução ia acontecendo naturalmente e sem a supervisão daqueles que deveriam originalmente fazê-lo.

Conforme o tempo foi passando, a pequena pedra acabou ganhando uma coloração mais esverdeada voltando à sua forma original. Uma esfera luminosa, estática, sem vida.

Dentro da barriga de uma tartaruga foi levada por uma longa jornada até o outro lado do mundo. O animal morreu, mas a esfera continuou a vagar de lugar em lugar através de mares, terras, arrastada e empurrada para lá e para cá como o objeto inanimado que era. Mostrava grande desgaste e algumas falhas que a transformavam quase numa elipse.

A sua jornada chegou ao fim quando parou em frente aos olhos de uma criança gordinha de olhos grandes e puxados, nariz de botão e boca rechonchuda.

—O que é isso?- questionou-se abanando a joia e ouvindo o som de algo dentro chocando contra as paredes ovais. Com a mãozinha no queixo e um semblante pensativo, a criança mordeu a pedra choramingando pela dor nos dentes fraquinhos.

—Já sei que não é de comer!- concluiu abanando novamente o objeto para ouvir o som parecido com um brinquedo numa caixa grande. —Interessante...

—Jisung, Felix, hora do almoço!- o garotinho abriu um sorriso de orelha a orelha e deixou a joia sobre um banquinho de madeira enquanto corria pelo pomar em direção à entrada do castelo.

Apenas uma pequena brisa foi suficiente para que a pedra rolasse lentamente em direção ao chão e se quebrasse como um frágil ovo agora que a sua casca estava frágil e desgastada. Começou a crescer já rachada e rebentou soltando respingos de tinta sobre um menino magrinho de pele dourada e olhos luminosos.
Os seus cabelos eram roxos, lisos e compridos abaixo dos ombros, penteados lindamente para trás em uma trança diferente.

O Legado dos DeusesOnde histórias criam vida. Descubra agora