(6) ....a tua lerdice;

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Eu enunciei tanto aspeto da tua personalidade, mas acho que não abordei muito bem este. A teimosia, o perfeccionismo, a carência… Inúmeros detalhes da sua personalidade, não é mesmo? É.

Adicionem a sua lerdice.

Já vos disse que ele não entende a minha ironia, aí é tudo aceitável, já que eu próprio me enrolo nas palavras e sou sério, não dando a transparecer se estou a brincar ou não. O pior é que, mesmo quando eu sou claro, ele não percebe, e isso em tempos já me irritou.

Foram tantos os exemplos… E a maior parte de quando eu tento fazer piada, quando eu tento lhe aconselhar ou estamos a falar de algo aleatório.

Nas mensagens, quando estamos ocupados e na faculdade, é algo normal, mas quando estamos juntos, o loiro olha para mim, abre a boca e fecha, sem emitir qualquer som. Ele pensa, olha para cima, para baixo e eu sinto-me tentado a beijá-lo…

Desculpem, ele é muito lindo, especialmente quando tenta raciocinar.

“Haitham… Como assim? Eu não entendi”, diz ele com aquele olhar confuso. Lá vai o Alhaitham com toda a paciência explicar o que quis dizer para o mocinho que não entendeu.

Quando estamos a ver algum filme juntos e aparece um termo em inglês, fácil de associar com a cena, o Haitham explica, pois só um olhar já é suficiente.

Quando alguém do grupo de amigos diz algo que eu entendi e ele não, ele cutuca o meu braço e faz um sinal com os olhos, pedindo explicações.

Quando os amigos dele têm atitudes estranhas com ele, ou até os professores, ele vem para casa muito agoniado, explicar-me a situação e acaba com um “eu não entendi o que eles quiseram dizer. O que achas?”

... E seriam inúmeras as situações.

O verdadeiro problema é quando ele não entende os projetos ou os artigos que tem de fazer para a faculdade e vem ter comigo — começo a achar que sou a Minerva, deusa da sabedoria, porque sou eu que lhe explico tudo.

“Alhaitham, aqui diz que eu só posso usar o programa da disciplina, mas o tema é sobre o urbanismo moderno… Como é que eu vou fazer esse projeto se não diz nada no programa de urbanismo?” Era uma questão de interpretação e lógica, mas nesse caso em específico eu nem lhe julgo, ele tinha ficado acordado até tarde para entregar uma maquete. A resposta era óbvia: havia o tópico de modernismo, só não o urbanismo moderno, ele teria de se especificar.

Outras vezes, ele vinha com dúvidas a respeito da matéria em si, como se fosse eu o sábio das artes! Ele é que passa por uma prédio: “aquilo é do estilo neoclássico, uma fusão de…”, desculpem, eu não me lembro das definições.

Esse é o papel do Kaveh saber, não meu.

Nessas situações de dúvidas a respeito da matéria, eu dou o meu melhor de pesquisar e explicar-lhe… Mas não corre muito bem e ele fica irritado comigo e insulta-me em quinze idiomas por não saber explicar.

Eu sei que a lerdice do loirinho não é proposital, acaba por ser mais uma consequência do seu esforço árduo todos dias na faculdade, já que ele é perfeccionista e tem de ter as coisas do jeitinho dele.

Apesar de ele não aceitar bem esse facto (o facto de que ele se entrega demais e procura a perfeição em coisas que já estão bem conseguidas) a verdade é que este esgota-o e fá-lo acabar com o seu lado racional.

Não dúvido também que a carência toda seja por esgotamento, já que eu próprio quando estou mais cansado, só quero ficar num abraço duradouro com ele para repor energias.

Mas toda esta conversa de chacha para dizer que eu queria que me estivesses a olhar com essas orbes avermelhadas, com uma sobrancelha erguida e a coçar a cabeça, perguntando-me como se pronuncia corretamente “architecture” e “buttress” para o seu projeto de arquitetura gótica.

Queria sorrir agora e explicar, pronunciar as síla… E não é que pronunciei mesmo?

Pergunto-me se estás a ter dúvidas algures aí nesse projeto, evento... Não sei, mas mesmo que tenhas e perguntes a alguém, aposto que ninguém vai te saber ensinar como eu — assim eu espero… Não é, Kaveh…?

(Por que eu falo como se tu fosses ler isso? Começo a achar que eu é que sou o lerdo da relação.)

10 razões porque te odeio || HaikavehOnde histórias criam vida. Descubra agora