LIVRO I
Minho
Chamas.
Isso era tudo que eu conseguia lembrar do breve sonho que tive, e a imagem daquele incêndio incessante havia se tornado fixa em minha mente, quase como se fosse um quadro vivo que eu visitava noite após noite, já que era o tema mais frequente em meus devaneios oníricos, toda vez que eu pegava no sono. Eu não sabia o que significava, mas, pelo visto, aquele tópico me perseguia onde quer que eu fosse, não adiantara nem mesmo me mudar de cidade pela segunda vez ao ano, pois sempre que eu deitava a minha cabeça, sentia o calor daquele fogo que crepitava ininterrupto em meio a ruídos confusos e indistinguíveis, que não me deixavam descansar direito.
Apesar de ter ido morar em outro distrito havia menos de seis meses, esta segunda mudança que fazia junto de meus pais, desta vez, retornava nossas malas à nossa cidade natal, porém, sem grandes recepções, até porque eu nunca tinha sido uma pessoa de muitos contatos enquanto havia morado nela. A essa altura, eu já não lembrava mais os motivos daquele vai e vem que fazíamos, carregando nossas poucas tralhas de um lado a outro, mas eu tampouco perguntaria à minha mãe e ao meu pai a respeito disso, pois, mesmo eles, já não pareciam estar abertos a conversas, e talvez partisse daí a minha incapacidade para me comunicar mais a fundo com as pessoas ou criar vínculos, levando em consideração que dentro da minha própria família era muito difícil manter um diálogo constante.
Fiquei meio desorientado após abrir os olhos, percebendo finalmente que todo o desconforto que estava sentindo em minhas costas, era por ter apagado em cima de uma esteira de palha fina sobre o deck de madeira da área de minha casa.
- Por que você não veio hoje? - perguntou uma voz grave masculina, roubando minha atenção.
Ao ouvir aquilo, ergui o tronco de meu corpo do chão e me sentei de imediato, entendendo que não estava mais sozinho ali, já que um garoto de cabelos loiros, vestido em uniforme colegial, estava sentado ao meu lado.
- Que... quem? - questionei desnorteado, ainda sem processar direito sua identidade.
- Eu quis dizer você, por que você não veio hoje?
Lee Yongbok era uma das poucas pessoas naquela cidade com quem eu ainda podia contar com a amizade, embora não fizesse tanto tempo desde que havíamos saído de lá. Ele fizera questão de me acolher de volta, sem fazer perguntas ou estranhar o quão mais recluso eu havia me tornado, apenas me estendendo a mão e fazendo companhia, indiferente às peculiaridades da minha personalidade.
Eu confiava nele mais do que normalmente confiaria em alguém, até porque, Yongbok era uma amizade tão sólida, que até mesmo havia trocado de colégio para poder me acompanhar e ajudar a me integrar com novos colegas, e isso não era algo que qualquer um faria por um amigo. Por me dar apoio sempre que eu precisava, ele era o único com quem eu havia compartilhado a respeito dos meus sonhos repetidos, pois eu sentia que poderia falar com Bokie sobre tudo, não havia julgamentos em nossa relação e era isso que nos aproximara logo de cara.
- O professor de arte disse que a aula de hoje poderia ter sido melhor com você - disse a mim. - Ele queria que a gente desenhasse boas expressões faciais, mas você não apareceu. Eu desenhei o rosto do... quem era mesmo...? Jinyoung.
Quando finalmente olhei com mais atenção para o garoto, ele estava tomando um ice tube, que, pela cor, parecia ser de sabor abacaxi ou banana, e me estendeu um daquele sorvete igual ao seu, aceitei em silêncio e direto o levei à boca, enfim desmistificando que o sabor não era nenhum dos dois que eu havia imaginado, pois se tratava de milho, e sentindo um leve incômodo quando o canto esquerdo dos meus lábios encostou na superfície gelada do plástico, como se cutucasse uma ferida ainda aberta.
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SKZFlix
FanfictionSem saber ao certo o motivo pelo qual estava voltando à sua cidade natal, Minho decide tentar algo diferente em sua nova escola e, com o apoio de seu amigo Yongbok, acaba se unindo ao projeto audiovisual de seus colegas, sem ter ideia de que tão pou...