Capítulo 2 - Sem audição

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Minho

Ingressar no clube de teatro era a minha mais nova fixação, eu estava obstinado a conseguir isso, apoiado na ideia de poder escapar um pouco da minha rotina entediante, ao interpretar personagens distantes de tudo que eu era. 

Matei algumas aulas da semana seguinte, para poder focar em ensaiar. De vez em quando eu ia sozinho e em outras oportunidades, contava com o auxílio de Yongbok. Nos encontrávamos no beco sem saída que ficava atrás do último prédio da escola, já que durante o período de classe, geralmente ninguém passava por ali. 

No entanto, de nada me valeu todo aquele esforço e todas as faltas que levaria para o meu boletim, porque quando finalmente pisei no palco, ao ter chegado a vez da minha audição, recebi o aviso de que a equipe encarregada das artes cênicas do colégio tinha gostado da maioria dos atores que passaram por ali antes de mim e, com isso, decidiram encerrar a competição pelas vagas, oferecendo elas para aquela primeira leva de participantes.

- Eu não sabia que esse clube era tão disputado assim - comentou Yongbok, ao me encontrar no espaço livre do auditório, na interseção entre a plateia e o corredor de entrada, que era o único lado que pegava sol naquele horário.

Eu estava sentado no chão, refletindo melancolicamente o que faria a partir de agora que não tinha mais uma ambição a perseguir. O garoto loiro se sentou ao meu lado e eu resolvi aproveitar aquela deixa e me dar o luxo de deitar a minha cabeça sobre o seu colo, estendendo meu corpo ao chão e relaxando brevemente a tensão dos meus ombros.

Só de ter pisado no palco, o meu coração já tinha acelerado exponencialmente, eu possuía o texto na ponta da língua, porém, mesmo assim, um nervosismo percorrera todas as minhas veias e artérias, pois aquela era uma exposição totalmente diferente dos meus ensaios particulares, dirigidos por Yongbok. Descobrir que toda a minha dedicação jamais seria assistida, foi um balde de água fria muito forte e gelou meu corpo de forma muito pior do que o frio em meu estômago fizera antes, porque me levou a um desencantamento enorme - um desencantamento com o rumo que eu daria para o resto daquele ano.

- Você estava assistindo? - perguntei, olhando para o rosto de Bokie de baixo.

- Aham.

- Senti mais vergonha por não ter performado, do que eu sentiria se tivesse feito o meu monólogo. Imaginava que pelo menos me dariam a oportunidade de me apresentar.

- Se você fosse popular no colégio, talvez isso tivesse acontecido.

- O que você quer dizer com isso?

- Quero dizer que se a sua presença no clube de teatro, ajudasse a vender ingressos, os veteranos teriam aberto uma exceção. Na verdade, você nem teria precisado de uma audição.

- Você fala isso com muita propriedade...

- É porque eu sei do que estou falando, o garoto da minha aula de arte comentou no outro dia, quando contei que você estava querendo ser ator. Me disse que haviam convidado ele, só porque é conhecido na escola.

- Que droga - praguejei, desanimado ao saber daquilo.

Ficamos em silêncio por um tempo, enquanto eu ainda processava aquela informação. Fechei os olhos por uns minuto, inspirando calmamente e prestando atenção em como a minha visão parecia alaranjada por dentro das minhas pálpebras, por conta da incidência do sol do meio-dia sobre nós dois.

As pernas de Yongbok estavam quentes sob o meu cabelo e eu senti que até mesmo seria capaz de tirar um cochilo ali, não fosse pelo pequeno susto que ele me deu na sequência, fazendo com que eu me despertasse de vez.

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